Vivemos numa cultura que glorifica o topo da escada. No mundo corporativo, desde cedo, somos incentivados a crescer, liderar, mandar. A narrativa dominante diz que se és bom no que fazes, o próximo passo é liderar outros e formá-los para que se tornem igualmente bons. Se te destacares e fores excelente, poderás vir a ser CEO. Mas e se não quiseres? Se não for essa a tua expectativa?
Num mundo onde a ambição é muitas vezes medida pela proximidade ao topo da hierarquia, escolher não liderar é visto com estranheza, ou pior, como falta de ambição. No entanto, há cada vez mais profissionais a fazerem essa escolha, de modo ponderado, consciente e legítimo.
São várias as razões legítimas para não querer gerir pessoas, processos ou orçamentos milionários e nenhuma delas deve ser vista como sinal de fraqueza, mas antes como reveladores de um forte sentido de autoconhecimento. Diversos estudos revelam que liderar acarreta um desgaste significativo, consubstanciando, muitas vezes, experiências de solidão no exercício da função e uma performance subpotenciada.
A investigação revela ainda que muitas das promoções para cargos de gestão são atribuídas a profissionais com alto desempenho técnico, mas sem revelarem vocação ou desejo de liderar. Tal facto, resulta, muitas vezes, em líderes que não querem estar ali, equipas desmotivadas e organizações menos eficazes.
Há quem prefira aprofundar o seu conhecimento técnico, contribuir em silêncio, criar impacto sem precisar de liderar equipas. Há quem valorize o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, sem querer carregar o peso constante da responsabilidade laboral. E há quem recuse o jogo político que muitas vezes acompanha os cargos de topo.
Assumir uma liderança sem vontade genuína acarreta custos elevados, seja pelo aumento de quadros de burnout, seja pela quebra de motivação e produtividade do próprio e, eventualmente, das suas equipas.
A escolha de evoluir para um cargo de topo deve estar assente no quadro de valores e princípios de cada um. A aceitação de um cargo por pressão externa (ou medo de ser visto como pouco ambicioso), pode acabar por trair os seus próprios valores e o seu bem-estar. A longo prazo, isso custa mais do que qualquer oportunidade “perdida”.
Atualmente, é difícil escapar à ideia de que, para sermos considerados bem-sucedidos, temos de subir. Muitos profissionais sentem-se forçados a aceitar promoções para não estagnar, mesmo quando o novo cargo os afasta daquilo que mais gostam de fazer. O modelo linear de carreira ainda domina: subir ou sair.
No entanto, empresas mais progressistas já oferecem carreiras onde é possível crescer em responsabilidade e remuneração sem assumir funções de liderança, ou então, que valorizam tanto a especialização técnica como a capacidade de colaborar transversalmente, sem obrigar ninguém a tornar-se “chefe”.
Ser líder deve ser uma escolha, não um destino inevitável. E ser excelente no que se faz – seja técnico, criativo ou operativo – devia ser suficiente para se sentir realizado ou reconhecido.
Num mundo que começa lentamente a valorizar a autenticidade, a recusa consciente da liderança não é desistência, é coragem. É escolher impacto, com equilíbrio. É afirmar que “posso ser ótimo no que faço, sem precisar de um cargo para o provar”. Talvez o verdadeiro empoderamento profissional esteja não em chegar ao topo, mas em saber realmente onde se quer estar.



