A propósito das novas regras para os passageiros de transportes públicos, que entraram em vigor a 3 de maio passado, o Jornal Económico foi ouvir os responsáveis das empresas mais representativas do setor para tentar perceber como estão a implementar essas medidas, quais as alterações que vão introduzir nos seus serviços e quais os impactos que esta nova realidade terá na estrutura de custos da empresa.
Conheça as respostas a estas questões dadas nesta fase de desconfinamento por fonte oficial da Transdev, uma multinacional francesa do setor que controla no nosso país mais de uma dezena de transportadoras rodoviárias de passageiros, com especial incidência na região norte e centro de Portugal.
De que forma é que a empresa vai implementar as novas orientações impostas pelo Governo durante o Estado de Calamidade, atualmente em vigor, nomeadamente em termos de desdobramento de horários?
Tal como previsto no Dec-Lei 14-C/2020, a empresa operadora vai articular com cada uma das Autoridades de Transporte (AT), sendo que caberá a estas entidades a definição da oferta a implementar em cada momento. Logicamente, as empresas do Grupo Transdev estão a ser proativas e apresentam as suas propostas de rede de transportes às autoridades. No entanto, a decisão da oferta a implementar cabe unicamente à Autoridade de Transporte local.
De salientar que, associada a cada oferta, composta por obrigações de serviço público, a AT terá de garantir a sustentabilidade da operação, ou seja, caso a exploração destas obrigações sejam responsáveis pela produção de um déficit de exploração, terão de ser garantidas as devidas compensações financeiras.
Face à imposição de disponibilizar apenas dois terços dos lugares para passageiros no atual Estado de Calamidade em vigor, está a empresa a ponderar reforçar a frequência de circulação dos respetivos meios de transportes?
Neste momento, e face aos diversos constrangimentos à normal mobilidade , os operadores atualmente dispõem de meios de reserva em quantidade suficiente para fazer face a um aumento da oferta decidido pelas AT.
No entanto, num momento de oferta normal de período escolar, os operadores não terão os meios necessários para aumentar de forma significativa o numero de serviços associados às limitações dos dois terços dos lugares, nem fará sentido reforçar meios humanos e materiais para fazer face somente a um pico de procura. Haverá, seguramente, outras formas de poder assegurar uma oferta mais densa, desde logo, com recurso ao achatamento dos períodos de ponta através do desfasamento horário de abertura das várias atividades, nomeadamente as atividades escolares, dado que as restantes atividades têm hoje pouco peso na composição da procura dos serviços interurbanos.
A empresa está a ponderar a distribuição de máscaras aos passageiros?
A Transdev está a oferecer máscaras aos seus clientes, no momento da compra do passe mensal. São laváveis e reutilizáveis e a oferta faz parte da campanha ‘Connosco, é seguro viajar’, que está em vigor em todos os percursos ainda ativos, no cumprimento dos serviços mínimos de mobilidade. Sendo a segurança uma prioridade absoluta, a proteção do motorista será feita com viseira, máscara e luvas.
A Transdev recorda que, no seguimento das recomendações da DGS – Direção Geral de Saúde, foram reforçadas as medidas de higienização das viaturas, nomeadamente através da utilização de um produto – ZOONO Z-71 – que cria uma camada protetora em todas as superfícies até 30 dias.
De que forma é que será assegurada a fiscalização das orientações?
A fiscalização das orientações caberá às autoridades. As empresas operadoras somente poderão efetuar tudo ao seu alcance para implementar de forma efetiva as orientações definidas para o sector, não cabendo aos nossos colaboradores a devida fiscalização, mas sim somente a interação com as autoridades que forem definidas para o efeito na regulamentação que vier a ser publicada.
De que forma é que as medidas em vigor vão sobrecarregar os custos das empresas?
Desde logo, as empresas têm maiores custos com o reforço da limpeza, desinfeção e higienização de veículos, instalações e equipamentos utilizados pelos passageiros. Por outro lado, a limitação a dois terços implicará alocação de mais meios humanos e materiais para transportar os mesmos passageiros, apesar da tendência para uma evolução progressiva e lenta da procura. Apesar dos operadores estarem a promover formas alternativas de aquisição de títulos, temos também de acomodar o impacto da continuidade do impedimento de cobrança a bordo, pelo que a quebra de receitas será também significativa. Acresce que com o desfasamento de horários poderão os operadores ter de realizar mais serviços, logo mais quilómetros, com o subsequente acréscimo de custos variáveis.
Não esquecer que muitos dos serviços interurbanos já se vinham a demonstrar deficitários, resultantes dos reiterados aumentos tarifários insuficientes para fazer face aos acréscimos de custos, tendo sido estes agravados significativamente recentemente pelo aumento dos salários da categorias de motorista.
Por outro lado e apesar da quebra do preço do ‘brent’, os preços dos combustíveis mantêm-se elevados, quer devido à demora das gasolineiras de fazerem repercutir as reduções do ‘brent’ no preço de bomba, bem como pela elevada carga fiscal que recai sobre estas matérias.
Assim é premente que as Autoridades de Transportes sejam sensíveis à situação dramática que o setor atravessa e utilizem as verbas cabimentadas nos seus orçamentos para o transporte, nomeadamente o transporte escolar, para ajudar os operadores a sobreviver nesta fase. De resto, é isso que preconiza o dec lei 14-C/2020, promovendo a sustentabilidade das empresas transportadoras, sem as quais o transporte público ficará claramente em causa.
Importa sublinhar que, em outros mercados, foram criadas medidas financeiras para permitir a implementação de serviços mínimos e essa seria uma boa prática a adotar também em Portugal. Por outro lado, há países em que as autoridades assumiram todos os custos relativos às medidas extra que visam garantir a segurança sanitária dos passageiros, para que esse não seja mais um custo a cair sobre as empresas.
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