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Uma voz divisiva

Será possível ver as taxas de juro de Portugal mais baixas do que as de Espanha? A história diz que não, mas nos dias que correm vê-se um pouco de tudo no mundo.
15 Fevereiro 2019, 08h17

O Vox é um partido espanhol, fundado no final de 2013, que recentemente produziu algumas surpresas dentro da política espanhola, entre elas o feito de ter ganho cerca de 10% das intenções de voto em pouco mais que três meses. Esta subida de popularidade do jovem partido deu confiança à direita espanhola para precipitar um ambiente político que leve a eleições antecipadas, visto que actualmente as sondagens apontam para que uma eventual coligação à direita consiga ter maioria no Parlamento espanhol.

A possibilidade de eleições antecipadas gera normalmente alguma volatilidade nos mercados de dívida do respectivo país, mas isso não tem acontecido com Espanha. Isto porque em parte este cenário já era esperado, dada a incapacidade governativa do actual governo, mas também porque os partidos da provável coligação à direita têm transmitido uma mensagem de relativa disciplina no que toca às finanças públicas, mesmo defendendo um corte generalizado de impostos. Uma das linhas do programa eleitoral do Vox diz inclusivamente: “Drástica reducción del gasto político”.

Neste contexto, as taxas de juro das obrigações soberanas de Espanha estão em mínimos de mais de dois anos, e o spread face à dívida alemã só tem aumentado porque as taxas de juro alemãs têm caído de forma macabra. Um claro “thumbs up” dos mercados aos partidos da direita espanhola.

Mas ainda que os programas económicos mereçam os sinais de aprovação, existem outras linhas do programa eleitoral do Vox que possivelmente estão a ser negligenciadas. Entre elas o primeiro artigo do programa eleitoral: Suspensión de la autonomía catalana hasta la derrota sin paliativos del golpismo y la depuración de responsabilidades civiles y penales”. E o segundo (novamente sem tentativa de tradução): “Ilegalización de los partidos, asociaciones u ONGs que persigan la destrucción de la unidad territorial de la Nación y de su soberanía”. Um discurso extremista que fomenta divisão não só contra os estrangeiros (como tem sido comum noutros países europeus e nos EUA), mas também contra os próprios espanhóis.

Se em Itália subiu ao poder um governo que, com todos os seus defeitos, encontra os pontos comuns entre os dois extremos do espectro político, e governa com base nisso, em Espanha, pode  subir ao poder uma coligação claramente à direita, que provavelmente irá crispar ainda mais divisões dentro do país. Mesmo que com os programas da direita as perspectivas económicas sejam positivas a curto prazo, estas divisões podem mais tarde ou mais cedo voltar para escurecer o ambiente político em Espanha.

Resta saber se o mercado irá incorporar essa possibilidade nas taxas de juro espanholas e, caso isso aconteça, o que irá acontecer às nossas. Será possível ver as taxas de juro de Portugal mais baixas do que as de Espanha? A história diz que não, mas nos dias que correm vê-se um pouco de tudo no mundo. Talvez ainda venhamos a agradecer o facto de sermos um país pequeno, onde só há espaço para divisões dentro do estádio de futebol.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.

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