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Vai ficar tudo igual… na família e na escola…

Temos de retirar tudo o que de positivo nos trouxe este covid-19 e admitir que existem grandes alterações de paradigma e que um deles está intimamente ligado a uma educação que tem vindo a ser debatida diariamente nas últimas duas décadas e que por fatores de grande resistência tem tido alterações de pouca significância, continuando com uma estrutura ultrapassada.
17 Abril 2020, 07h15

Tanto socialmente, como ao nível da educação, vão existir mudanças estruturais e nada vai ser igual como antes, porque todos nós estamos a passar por uma metamorfose que está a demonstrar que muito do que estava a acontecer na natureza, na sociedade e na educação, não poderiam continuar porque nos estava a levar para o abismo.

Temos de retirar tudo o que de positivo nos trouxe este covid-19 e admitir que existem grandes alterações de paradigma e que um deles está intimamente ligado a uma educação que tem vindo a ser debatida diariamente nas últimas duas décadas e que por fatores de grande resistência tem tido alterações de pouca significância, continuando com uma estrutura ultrapassada.

No meu artigo do mês de janeiro do Económico Madeira demonstrava esperança quando exprimi que sentia “que esta nova década tenha transformações sociais poderosas e que os pais aproveitem melhor o seu tempo com os filhos” de facto, e por “culpa” de um vírus que não pediu licença para entrar nas nossas vidas, já estamos a sofrer alterações sociais e os pais estão confinados em casa num período inigualável de contacto com os filhos. Muitos pais encontram-se sem saber o que fazer e outros, tal como eu, estão a aproveitar todos os minutos de convivência com os seus filhos, porque de facto está a ser uma oportunidade única e está a ser transformador, na relação, nos valores, nas competências que adquirimos, na criatividade das brincadeiras, dos jogos, das partidas e tarefas que temos executado em conjunto.

Tudo de bom que estamos a passar neste período não irá voltar para trás porque estou convicto que todos nós com tempo para descansar e pensar, fizemos um exercício de valor acrescentado nas nossas vidas que podemos chamar de reflexão pessoal ou meditação, para nos conhecermos melhor, vermos o que está a correr bem e menos bem e podermos resignificar a nossa existência, os nossos objetivos e as nossas experiências.

Acreditamos que Pais e Professores estejam mais abertos a mudanças na educação e no ensino, mudanças estas que já vêm com muito tempo de atraso, mas que são determinantes para evitarmos um flagelo social nas próximas gerações.

A família certamente que está a repensar a vida dos filhos, porque apesar de não ter uma tradução matemática do seu dia-a-dia, facilmente pode chegar a números que não deixam ninguém insensível “em média uma mãe e um pai passam 37 minutos por dia com o seu filho, uma criança até aos dez anos passa diariamente 8 horas na escola. Um recluso passa mais tempo ao ar livre do que uma criança em idade escolar. Uma criança ou adolescente passa mais de 2h30 por dia diante de um ecrã” [1].

Defendemos a existência de uma oportunidade única no que diz respeito à forma como os pais vão educar os seus filhos, dado que este vírus abriu espaço para uma maior relação familiar, uma valorização da presença e da comunicação dos que nos são próximos, um sentimento de uma vida mais repousada e refletida, uma sensação de apego aos bens humanos e não aos bens materiais e isso permite que todo o sentido da nossa existência seja, hoje, visto de uma forma bastante distinta. Estamos em querer que com uma mudança de mentalidade e uma valorização da família e com muitas pessoas a começarem a trabalhar em regime de teletrabalho este vírus acabou por ser o maior aliado das crianças e o melhor presente que poderiam receber, porque daqui para a frente tudo vai ser diferente, e o tempo que sempre pediram aos pais já é uma realidade.

No que respeita ao ensino acreditamos que já se estão a romper com as amarras em que se encontra envolvido à décadas, porque existe uma demonstração inequívoca da existência de novas metodologias e da capacidade dos alunos criarem de forma mais autónoma, criativa e responsável. Acredito que vamos finalmente ter uma escola inclusiva que vai respeitar as diferenças dos alunos e que aceita a permanência de alunos que não preenchem as espectativas académicas clássicas, centradas na instrução e na reprodução de conteúdos curriculares. Vamos assistir ao desenvolvimento de metodologias que vão estar de encontro com as novas tendências sociais e enquadradas com necessidades de uma sociedade de século XXI que vai estar cada vez mais voltada para as tecnologias e para movimentos naturistas.

Defendemos uma escola orientada, sintonizada, adaptada e estruturada com o meio físico, social, cultural e composta por currículos extremamente flexíveis, inclusivos em sincronia com as necessidades de formação e desenvolvimento local.

Defendemos que a sociedade pede pessoas e profissionais competentes, sustentados no conhecimento, habilidades e atitudes, sendo necessário que a escola deixe de se centrar na memorização e na nota do teste e se comece a centrar numa atitude de compreensão aberta e critica que irá promover a pesquisa não centrada somente no livro adotado, mas sim privilegiando diferentes técnicas de estudo e sistemas pedagógicos que promovam o desenvolvimento de competências, criatividade e empreendedorismo.

Não falamos só de crianças, mas sim na generalidade da educação, porque se trata de uma situação transversal no ensino que atinge todas as idades, por isso acreditamos na alteração do paradigma instalado, onde são necessários atores capazes de crescer e transformar-se com a educação, não meramente instrumentos passivos da educação. Os professores, os pais e outros agentes principais serão claros facilitadores do processo e devem assumir o seu trabalho em sinergia para obter o melhor dos nossos jovens. Com a educação não se deve brincar porque é ela que pauta o crescimento de uma sociedade, assim é necessário alterar o conceito de aprendizagem e gestão de conhecimento, e para isso necessitamos mais do que nunca de compreender que tudo não é só uma questão de estrutura, mas de mentalidade e paradigma socioeducativo.

[1] Strechet, Pedro (2018). Pais sem Pressa. Lisboa: Contraponto

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