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Xanana Gusmão admite dissolução do partido que lidera

“O partido tem de fazer uma forte reflexão. Quadros e militantes têm de analisar a ética política, sobre as várias manobras, as propagandas que surgem, para compreender melhor as pessoas que gerem a nação, e as suas visões e comportamento políticos”, disse, numa mensagem ao partido.
29 Abril 2019, 07h56

Xanana Gusmão pediu aos militantes do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT), maior força política da coligação do Governo timorense, uma reflexão sobre o futuro do partido, que lidera, admitindo, até, a sua possível dissolução.

“O partido tem de fazer uma forte reflexão. Quadros e militantes têm de analisar a ética política, sobre as várias manobras, as propagandas que surgem, para compreender melhor as pessoas que gerem a nação, e as suas visões e comportamento políticos”, disse, numa mensagem ao partido, durante o fim de semana.

“O que tem acontecido no partido tem de ser mesmo analisado como uma lição para o partido”, disse, numa mensagem em vídeo gravada por ocasião dos 12 anos do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT).

Para Xanana Gusmão, as mudanças verificadas em Timor-Leste entre 2007 e 2017 – com mais investimento privado e uma economia mais robusta – “não são valorizadas” com o partido a continuar a ser acusado de ser “um partido corrupto, que roubou milhões de dólares ao Estado, e que tudo o que o CNRT fez foi errado”.

Em 2017, quando o CNRT perdeu as legislativas, “o povo demonstrou que não confia no CNRT”, mas “a lição” não foi totalmente compreendida pelo partido, disse.

“Por isso, companheiros, o partido tem de aprender através destas lições, a não confiar arbitrariamente noutras organizações, cada pessoa tem de os seus próprios interesses”, apontou.

“O partido tem de considerar discutir ainda mais profundamente o seu futuro. Se o CNRT só promove a corrupção, se só as pessoas e qualquer pessoa do CNRT é que são corruptas, se é necessário salvar a nação, então o melhor é mesmo fechar, dissolver o partido”, afirmou.

Xanana Gusmão pede, por isso, que os membros do partido se foquem nos problemas internos, deixando de “trocar acusações, trocar invejas e pensar somente nos interesses pessoais”, como, afirma, já está a ocorrer.

“Alguns já sentem presunção… como veteranos e veteranas do partido. Alguns outros companheiros esquecem-se de defender os direitos do partido e esqueceram que o partido é que lhes deu e dá abrigo”, disse.

“Se queremos consolidar o partido temos que começar a ter uma autocrítica honesta e franca dentro do partido. Se não pensarmos bem no futuro do partido, na próxima eleição vamos perder novamente, e vamos ter que nos esforçar nos anos seguintes a pagar as dívidas da campanha. Temos que pensar bem no futuro do partido, porque este tem que aguentar tudo isto”, sublinhou.

A mensagem de Xanana Gusmão foi gravada na semana passada e foi distribuída pela liderança e pelos militantes do CNRT durante o fim de semana, em que se comemoram os 12 anos de criação do partido.

Fonte do CNRT explicou à Lusa que o objetivo é divulgar a mensagem a nível nacional antes de uma eventual conferência nacional cuja data, para já, ainda não está definida.

Ao longo de quase 26 minutos de vídeo, Xanana Gusmão referiu que o CNRT apareceu em 2007 “para resolver uma grande crise na qual os timorenses se separaram, se vingaram, fizeram mal uns aos outros, havendo até mortes”.

Uma referência à crise que assolou Timor-Leste entre 2006 e 2008 e aos anos seguintes em que, garante, o Governo da Aliança de Maioria Parlamentar (AMP) trabalhou para melhorar as instituições do Estado e para “estabelecer um sistema financeiro bom e moderno” no país.

“Procurou apoiar as empresas locais a desenvolverem-se para desenvolver o setor privado nacional, procurou despertar a despartidarização e o funcionalismo público; procurou dar uma visão abrangente a todos sobre como desenvolver a nossa nação”, disse.

A eletrificação do país, um esforço para “melhorar o comportamento das empresas nacionais na implementação de projetos e obras” e na correção das “ineficiências nas instituições do Estado, especialmente no Governo”.

Uma lista de conquistas, explica, que incluíram, entre outros, correções na gestão do apoio dos parceiros internacionais de Timor-Leste e a criação do G7+ (uma organização intergovernamental que reúne países que enfrentam conflitos ativos ou que têm experiência recente de conflito e fragilidade).

“O CNRT não quer dizer que fez tudo; o CNRT não quer chamar a atenção a todo o povo para avaliar as mudanças desde 2007 até 2017. Caso não existam diferenças, então o CNRT assume esse fracasso”, disse.

Caso haja diferenças, “mesmo que pequenas”, Xanana Gusmão diz que o CNRT “não fez tudo sozinho” e por isso recorda os partidos que estiveram nas coligações do IV e V Governo e a própria Fretilin.

“Um partido, que aceitou apoiar o VI Governo de modo a podermos unir esforços, com um propósito único, e assim alcançar uma grande vitória sobre a Austrália, com respeito às fronteiras marítimas, para assim, sermos soberanos das nossas riquezas”, disse.

“Obrigado à Fretilin por aliar-se ao CNRT na defesa do interesse nacional acima dos interesses de cada partido”, afirmou.

No discurso, Xanana Gusmão retoma a ideia de que o CNRT deve aprender com as lições do processo de construção do Estado, olhando para o que ocorreu com sinceridade, honestidade e abertura para “reconhecer as fraquezas” internas.

“Isto é fundamental para o partido, porque se não analisamos estes aspetos, não teremos consciência para melhorar partido, não sentimos a necessidade de melhorar o nosso próprio comportamento, como membro dos quadros ou como militante”, disse.

“Quando não se faz introspeção, quando a nossa tendência é só trocar acusações, quando só exigimos os nossos direitos e esquecemos que dentro dos quadros do nosso partido também temos deveres para com a nação”, afirmou.

Timor-Leste, disse, vive ainda uma “situação política confusas”, depois de duas eleições, em 2017 e 2018 que mostraram a fragilidade do Estado e das suas instituições, “desde o Presidente da República até ao Parlamento, desde o Governo até aos Tribunais e todos os setores da Justiça”.

No capítulo da justiça, Xanana Gusmão disse, ironizando, que todos os membros do partido, incluindo ele próprio, “devem começar a receber “acusações dos tribunais”, de uma justiça “já aprisionou muitas pessoas do CNRT” e que “procuram sempre pessoas do CNRT, quer sejam ou não culpadas”.

 

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