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BES concentra mais de metade dos dez mil milhões para offshores

O BES é o responsável pela fatia de leão das transferências que escaparam ao controlo do fisco. São mais de cinco mil milhões em três declarações referentes a 2012, 2013 e 2014.
Rafael Marchante/Reuters
3 Março 2017, 08h22

Mais de metade dos 10 mil milhões de euros de transferências para paraísos fiscais que não apareciam nas estatísticas entre 2011 e 2014 foram declarados pelo Banco Espírito Santo (BES). Em causa estão montantes que clientes do banco, na esmagadora maioria empresas, enviaram para offshores nos dois anos antes da resolução do banco.

As transferências de 2014 deram origem a duas declarações, nomeadamente uma do BES (antes da resolução a 3 de agosto) e outra do Novo Banco com as transferências após essa data. Os valores ascendem a mais de cinco mil milhões de euros e estão relacionados com três das 20 declarações apresentadas pelas instituições financeiras que não foram objecto de qualquer tratamento pela Autoridade Tributária (AT).

A revelação foi feita ao Jornal Económico por fonte da administração fiscal, que garante que o peso de BES “é enorme” na omissão das transferências no sistema informático da AT, cujo montante acabou por escapar ao controlo do fisco. O BCP surge em segundo lugar no que respeita aos montantes transferidos para offshores e que escaparam ao radar da máquina fiscal.
Sobre a fatia de leão que foi declarada pelo BES, são avançadas explicações como o facto de os negócios de private banking do antigo BES poderem serem “mais desenvolvidos”, gerando maiores montantes que foram depois declarados pelos clientes, onde se incluem algumas das empresas do GES.

Questionada sobre o peso do BES no total dos 10 mil milhões de euros, referentes a 14.484 operações de transferências, fonte oficial do Ministério das Finanças escusou-se a comentar. “Não nos podemos pronunciar sobre as entidades financeiras envolvidas. O Banco de Portugal não autoriza a divulgação, conforme referido ontem [na quarta-feira, 1 de março] pelo Secretário de Estado na COFMA [Comissão de Orçamento e Finanças e Modernização Administrativa].
No Parlamento, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Fernando Rocha Andrade, tinha já alegado “sigilo bancário”, defendendo que o supervisor o aconselhou a não revelar “publicamente informação que permitisse a identificação das entidades bancárias na origem” das transferências. A indicação surgiu em resposta ao deputado socialista Eurico Brilhante Dias, que questionou o governante se há uma concentração dessas 14 mil transferências em instituições financeiras específicas.

20 declarações omitidas
A omissão de cerca de 10 mil milhões de euros de transferências  realizadas para offshores, entre 2011 e 2014, foi detetada entre dois momentos de divulgação destas estatísticas pelo fisco, segundo revelou o Público. Em abril de 2016, já com o Executivo de António Costa, foram publicadas estatísticas dando conta de que tinham sido enviados 7.162 milhões de euros para offshores naquele período. Já num segundo momento, no final de 2016, os novos dados divulgados não coincidiam com os primeiros ficheiros: o montante afinal era de 16.964 milhões de euros.

Já esta semana, Rocha Andrade revelou que se, no primeiro momento, se pensava que tinham havido 32.113 operações para offshores, num segundo momento foram apuradas outras 14.484 transferências omissas, correspondentes a 9.800 milhões de euros.

O governante explicou aos deputados que o Governo recebeu as estatísticas das transferências de 2015 no final do Verão de 2016, altura em que notou uma grande diferença entre os valores então conhecidos relativamente a 2014: 374 milhões de euros, contra 8.885 milhões de euros referentes aos dados de 2015.

“Perante tamanha divergência, naturalmente o Governo questionou a AT”, disse Rocha Andrade, acrescentando que a administração fiscal percebeu que os dados de 2014 “não estavam correctos” quando voltou a extrair os dados referentes às declarações que os bancos têm de entregar anualmente com informações como o valor das transferências (acima dos 12.500 euros), o NIF da empresa ou pessoa singular que ordenou a operação e o código do país para onde foi enviado o dinheiro. Estas comunicações abrangem ainda operações comerciais relacionadas com empresas na venda ou transferência de bens e serviços, a empresa a ela relacionada e situada nos centros offshores.

Perda de receita não é afastada
No Parlamento, o secretário de Estado não excluiu a hipótese de haver implicações para os cofres públicos: “Não posso garantir que esta falha não tivesse provocado perda de receita”, assumiu, explicando que “os dados das transferências para offshores não são apenas usados para o controlo inspectivo dessas operações, mas também para um conjunto de outros factos tributários dos contribuintes – que não estão directamente conexos com as transferências”.

[Notícia atualizada às 10h30]

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