A Associação Portuguesa de Famílias Numerosas (APFN) manifestou em comunicado “a sua total discordância com a generalidade das medidas apresentadas no Orçamento do Estado 2023, por serem claramente insuficientes para suprir o aumento de encargos que incide de forma desproporcional nas famílias com três ou mais filhos, tornando-as no alvo mais vulnerável à pobreza, segundo os dados apresentados ainda a semana passada pela Rede Europeia Anti-Pobreza”.
A APFN considera absolutamente prioritário como medida de justiça social a diminuição do IVA dos bens e serviços essenciais.
A segunda medida defendida é o aumento da dedução por filho, em sede de IRS, pelo menos num valor equivalente ao da inflação.
A associação que defende os agregados familiares numerosos quer que o Orçamento de Estado do próximo ano contemple uma alteração do método de cálculo do IRS para uma dedução antes da aplicação da taxa, bem como a atribuição a cada dependente de uma dedução equivalente à das despesas gerais e familiares.
“Este Orçamento do Estado surge num contexto de elevada incerteza e de uma degradação da condição económica das famílias, motivada pela inflação que incide fortemente em sectores de bens e serviços essenciais, mas também da subida das taxas de juro e aumento das prestações associadas ao crédito bancário, e é sobre as famílias com filhos que o impacto se torna mais significativo”, alerta a APFN.
No entanto, lembra a associação, “o aumento de rendimento líquido previsto no Orçamento do Estado é exatamente o mesmo, independentemente da existência ou não de filhos e do seu número. As famílias com filhos têm, para um mesmo rendimento, um nível de encargos com despesas essenciais substancialmente mais elevado, com uma evidente e comprovada exposição à pobreza”.
“Infelizmente o Orçamento do Estado não prevê uma única medida de aplicação universal a estas famílias. As medidas apresentadas ou se destinam apenas a franjas muito limitadas da população, ou são gerais sem ter em conta a situação particular das famílias com filhos”, aponta a associação.
A APFN analisaram algumas das medidas previstas e constatam “que não só não corrigem, como aumentam a discriminação existente”, e citam o caso do IVA eletricidade que é previsto passar a 6% para potências contratadas até 6,9 KVA e para consumos até 100 KW ou 150 KW se família numerosa. “Uma pessoa sozinha tem direito a 100 KW com IVA a 6%, mas numa família de quatro pessoas, cada uma destas pessoas tem apenas 25 KW de IVA reduzido”.
“Acresce que a limitação desta medida à potência contratada de até 6,9 KVA inviabiliza o acesso ao IVA reduzido a muitas famílias numerosas que necessitam maior potência e às famílias que, por preocupações ambientais, fizeram uma aposta na eletricidade”, alerta a entidade.
Sobre o mínimo de existência que é previsto aumentar para 10.640 euros e reformular a regra de cálculo, a associação diz que foi criado para garantir que o rendimento líquido disponível após o pagamento do imposto é suficiente para garantir a subsistência do agregado familiar. Ora, “como o valor é global e não por pessoa, o Estado entende que 10.640 euros são suficientes, quer o agregado seja de uma, duas ou três pessoas. Existe uma majoração pouco significativa para famílias numerosas que, ao não estar indexada, se mantém inalterada há alguns anos”.
Assim, apela a associação, “é imperioso que, ao contrário do que agora acontece e que não está previsto ser alterado, o mínimo de existência seja estabelecido com um valor per capita em que todas as pessoas que vivem do rendimento que irá ser sujeito a tributação contem individualmente e que esse valor seja de atualização automática”.
No que se refere ao aumento para 900 euros da dedução no IRS para os segundos filhos ou seguintes que tenham até 6 anos – atualmente a dedução para um filho no IRS é de 726 euros. Mas “caso existam mais filhos é de 600 euros para maiores de três anos e de 900 euros para menores de três anos. Com esta alteração, os filhos que têm entre três e seis anos passam a ter acesso à dedução de 900 euros”, constata a APFN que acrescenta que “não se compreende que em contexto de inflação, este valor não seja sujeito a uma atualização”.
Por outro lado, refere a APFN, “todos os dados disponíveis indicam que os encargos com os filhos aumentam com a sua idade e não diminuem”.
“Torna-se assim incompreensível que se mantenha a prática de atribuição de valores diferentes na dedução em função da idade”, acrescenta.
A APFN reconhece como positivo o alargamento para os 6 anos da dedução mais elevada.
Já no que se refere ao abono de família para crianças com mais de 6 anos este aumenta de 41 para 50 euros. O abono de família neste momento pode variar entre os 19,46 euros e os 303,44 euros. O valor depende do escalão de rendimentos da família, de características do agregado familiar e da existência e idade dos irmãos. Aqui a APFN entende que “esta prestação deve ser universal com um mesmo valor idêntico a atribuir a cada criança”.
“Mais uma vez, não se compreende que as crianças mais velhas e que representam encargos mais significativos tenham um abono de família mais baixo”, refere a associação. “Neste sentido, saúda-se o aumento embora se considere que o abono deve ser igual em todas as idades”, acrescenta.
O comunicado não esquece o valor isento no âmbito do Imposto Municipal sobre as Transações (IMT) para as casas de primeira habitação que aumenta dos atuais 93.331 euros para 97.064 euros. “Mais uma vez o valor é definido de forma cega em relação ao número de pessoas que irão residir na habitação, esquecendo que para mais pessoas será necessária uma habitação maior e, naturalmente, mais onerosa”, aponta a associação.
Também a diminuição de 23% para 21% da taxa marginal do segundo escalão é alvo de comentário da APFN. “Trata-se de uma redução da carga fiscal para todos os titulares de imposto. Mas na medida em que a progressividade do imposto continua a não considerar a existência de filhos, o resultado efetivo é que o alívio fiscal seja o mesmo, pese embora quem tem filhos e em função do seu número esteja a sofrer um substancial aumento dos seus encargos essenciais”.
A APFN relembra o seu entendimento de que “cada filho, cada pessoa, deve contar como um cidadão, como sinal do seu valor social e do reconhecimento de idêntica dignidade, e que este princípio deve estar refletido nos vários âmbitos das políticas públicas”.
“Como nota positiva assinalamos o financiamento de lugares em creches privadas que permitirá que mais crianças possam ter acesso a creche gratuita”, elogia a associação que no entanto manifesta a preocupação com “a regra de priorização das creches do sector cooperativo, em especial, quando a consequência possa ser a colocação da criança numa creche distante de casa e/ou da escola dos irmãos que obrigue os pais a longas deslocações”. Neste contexto “é nosso entendimento que a escolha da creche, independentemente da sua natureza, deve ser dos pais e em função da sua organização quotidiana e dos apoios familiares de vizinhança”. A APFN diz que “caso não seja esse o entendimento, a priorização só deve ocorrer para igual distância, ou seja, caso exista lugar numa creche do sector cooperativo mais próximo da residência relativamente à opção alternativa do sector particular”.
A APFN diz-se disponível para trabalhar com o Governo e o Parlamento “no esclarecimento e na construção de modelos que não coloquem as famílias numerosas em maior risco de pobreza do que aquele em que já se encontram”.
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