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Alargamento dos BRICS: um tsunami em potência na ordem mundial

Uma moeda comum, mas principalmente uma estratégia comum a um conjunto de países que não quer manter-se fora dos grandes centros de decisão globais. Os Estados Unidos já deram mostras de estarem atentos, o que implica um claro desconforto com o assunto
epa10813792 South African President Cyril Ramaphosa speaks during the 15th BRICS Summit, in Johannesburg, South Africa, 22 August 2023. South Africa is hosting the 15th BRICS Summit, (Brazil, Russia, India, China and South Africa), as the group’s economies account for a quarter of global gross domestic product. Dozens of leaders of other countries in Africa, Asia and the Middle East are also attending the summit. EPA/KIM LUDBROOK
10 Setembro 2023, 19h00

Artigo originalmente publicado no caderno NOVO Economia de 2 de setembro, com a edição impressa do Semanário NOVO.

Os universos sobrepõem-se necessariamente, mas a estratégia de crescimento do conjunto de países conhecidos como BRICS está a ter um forte impacto naquilo que é a agenda estratégica tanto do G7 como do G20 – que observam o agregado dos países emergentes com evidente desconfiança. Formado pela China, Rússia, Índia, Brasil e África do Sul – aos quais se vão juntar Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egipto, Irão, Etiópia e Argentina – os BRICS têm uma nova agenda que agregará 29% do PIB mundial, 46% da população, 43% da produção de petróleo e 25% do comércio mundial.

“É um grupo que quer ser o outro lado da moeda relativamente ao G7”, explica o analista Francisco Seixas da Costa, que lhes reconhece diversas contradições que podem afetar as vantagens potenciais – principalmente num quadro de alargamento. Mas “são países que têm um ponto comum: contestarem a ordem internacional atual” – que é precisamente aqui- lo que temem os componentes do G7 e do G20.

“É um grupo que quer ser o outro lado da moeda relativamente ao G7”, diz Francisco Seixas da Costa, que lhe encontra diversas contradições

Essa contestação resulta, entre outras matérias, na vontade de criação de uma moeda própria que, por um lado, sirva de esteio ao desenvolvimento das relações económicas entre os onze e, por outro, promova aquilo a que se chama a ‘desdolarização’ da economia global. Uma vontade tão esperada (a desdolarização é um ‘sentimento’ antigo) como, no dizer de alguns, impossível.

Seixas da Costa explica os temores do G7: “a China procura utilizar os BRICS como uma extensão do seu poder” – o que coloca o agregado em confronto direto com a economia dos Estados Unidos (e seus parceiros ocidentais). Antes da cimeira da África do Sul, no mês passado, a administração Biden parece ter ‘acordado’ para o facto de o fosso entre Estados Unidos e China poder resultar em graves consequências para os primeiros – talvez bem mais que para os segundos. E tratou de estabelecer vias de comunicação entre os dois países, preocupando-se em dar um sinal diferente daquele que vinha dando até então. Do ponto de vista interno, é um risco: o ex-presidente Donald Trump conseguiu impor a China como o ‘inimigo’ a abater – e Joe Biden não quis ir contra essa disposição, que tem basta aceitação no interior das fronteiras dos Estados Unidos.

Outro alargamento

Mas, se os BRICS a onze já são uma preocupação para o lado ocidental do planeta, tudo tenderá a ser ainda mais difícil quando (e se) o processo de alarga- mento, já na calha, se vier a dar. Bielorrússia, Cazaquistão, Indonésia, Bangladesh, Laos, Vietname, Tailândia, Cambodja, Malásia, Argélia, Nigéria, República Democrática do Congo, Senegal, Cuba, Bolívia e Venezuela já apresentaram, mesmo que com alguma informalidade, as suas propostas de adesão.

Não vale muito a pena fazer para todos as contas que já estão feitas para os 11, mas serão com certeza mais impactantes que tudo aquilo que algures no tempo o jugoslavo Marechal Tito (‘autor’ do antigo grupo dos países não-alinhados) alguma vez imaginou possível.

Seixas da Costa chama ainda a atenção para um dado importante: estão no grupo já formalmente pertencente ao alargamento países que até agora eram considerados ‘amigos’ especiais dos Estados Unidos: Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita. E até mesmo o Egipto faz parte desse grupo. A grande incógnita é, portanto, como diz o embaixador, perceber-se quais serão as mudanças que ocorrerão em termos da ordem internacional. Porque, a ver pelas numerosas análises dadas à estampa nas últimas semanas, não há nenhuma hipótese de o alargamento dos BRICS deixar tudo na mesma. Um tsunami tão mais impactante quanto maior for o agregado.

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