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Pobreza energética afeta 1,8 milhões em Portugal. País é o 4º pior classificado da UE

Portugal tem a quarta maior taxa da União Europeia (17,5%) de pessoas que não conseguem aquecer devidamente as casas, com a média da UE a ficar-se no 9,3%. País está apenas atrás da Bulgária, Chipre e Grécia. Associação Zero pede a rápida aprovação da Estratégia Nacional de Combate à Pobreza Energética.
23 Setembro 2023, 08h00

Artigo originalmente publicado no caderno NOVO Economia de 16 de setembro, com a edição impressa do Semanário NOVO.

Portugal voltou a subir no ranking e desta vez não são boas notícias. O nível de pobreza energética aumentou e há mais famílias vulneráveis que não conseguem aquecer a casa no tempo frio e refrescar a casa no período de verão.

Os novos dados, referentes a 2022, foram revelados esta semana pelo órgão estatístico europeu, o Eurostat, e não agoiram um futuro positivo. Os dados indicam que 17,5% das famílias portugueses não consegue manter a habitação devidamente aquecida no inverno, significando que tem a quarta maior taxa da União Europeia (UE), a par da Lituânia.

Isto significa que 1,75 milhões de portugueses apresentaram sérias dificuldades para ter a casa aquecida e algum conforto, recorrendo várias vezes a cobertores extra e mesmo a pequenos momentos com o aquecedor ligado. Mas o mais preocupante é o aumento verificado em relação a 2021, quando a taxa era de 16,4%, a quinta mais elevada da UE.

Esta nova taxa terminou com o passo certeiro de três descidas consecutivas, que estavam a ajudar a concretizar o plano definido pelo governo na Estratégia Nacional de Combate à Pobreza Energética. A taxa mostra ainda que Portugal se encontra muito acima da média europeia de 9%, que também apresentou uma subida de 2%.

Estratégia do governo
O governo pretende diminuir a percentagem de população portuguesa que se encontra na chamada zona de pobreza energética, até esta se aproximar do zero. Para isso, a Estratégia Nacional, aprovada em 2021, aponta que Portugal deverá chegar a 2030 com uma taxa de 10% de população que consiga manter a casa quente, diminuindo para 5% em 2040 e ficar abaixo de 1% em 2050.

O mesmo acontece para a população que não consegue manter a casa fresca no verão: 20% em 2030, 10% em 2040 e menos de 5% em 2050. O plano de longo prazo, entre 2022 e 2050, tem quatro princípios orientadores, visando “aumentar o desempenho energético e ambiental das habitações, reforçar as condições de acesso a serviços energéticos essenciais e reduzir os encargos com o consumo de energia e robustecer o conhecimento e o acesso à informação”. O mesmo documento governamental estima que “em Portugal estejam em situação de pobreza energética entre 1,8 e três milhões de pessoas” cujo salário não consegue competir com as pesadas
despesas energéticas, ou seja, em que a energia representa mais de 10% do total de rendimentos.

Inclusive, e de forma a melhorar os dados existentes, a secretária de Estado da Energia e Clima anunciou, em abril, a criação do
Observatório da Pobreza Energética, com o objetivo de melhorar as métricas conhecidas. Este organismo irá recolher anualmente informação junto das famílias já identificadas no âmbito da pobreza energética. No entanto, desde abril que pouco se sabe do desenho deste observatório. Nas palavras de Ana Fontoura Gouveia, o observatório nasce ainda ao abrigo do REPowerEU o PRR.

Falta literacia energética
Depois de um “longo período de silêncio”, o Associação Zero pede a rápida aprovação da Estratégia, cuja consulta pública terminou em março, que ainda está à espera de avançar e contou com o seu contributo. Islene Façanha, da Associação Zero, nota a urgência em aprovar o documento numa altura em que se verifica um “momento de revisão” na UE e “alteração do discurso de Estados-membros”. “Não queremos que passe deste ano. Esperamos que a estratégia seja publicada ainda este ano”.

A especialista em edifícios sustentáveis nota ao NOVO Economia que a estratégia é, por si só, um “bom primeiro passo”, mas que é preciso implementá-la para não “ficar aquém” das expectativas criadas e dos resultados pretendidos.

Sobre os programas já existentes, Islene Façanha elogia-os como medidas de apoio à população vulnerável, mas o “programa falhou muito pela comunicação”, não chegando às pessoas necessitadas. “As pessoas acham a linguagem muito técnica. Não têm conhecimento e literacia energética suficiente para aceder a esses programas”, conta a ambientalista.

A Zero diz ainda que o valor do programa é “insuficiente”. “As pessoas trocam uma janela. Isso não resolve o problema da pobreza energética e do conforto térmico dentro das casas”. Questionada sobre as questões dos apoios, Islene refere que o processo é quase redutor, uma vez que as famílias têm de avançar primeiro com o dinheiro e só posteriormente o recuperam.

Como os mais vulneráveis não têm milhares de euros para dar, a Zero recomendou a existência de algum tipo de apoio extra, de
forma a que mais pessoas consigam aceder às ajudas.

Além dos apoios, na opinião de Islene Façanha, o governo deve apostar na monitorização da situação nacional, que deverá acontecer com o observatório, mas também com a comunicação destes apoios à população e promoção da literacia. “São pilares transversais a todas as medidas porque são dirigidos aos cidadãos. A população também tem de ter conhecimento destes programas, o que fazer
nas suas casas e devem ainda ter o apoio técnico, que é algo que ainda falta”.

Questionada sobre se a pobreza energética algum dia vai terminar, a especialista em edifícios sustentáveis da Associação
Zero assegura que a instituição “está a lutar por isso”.

“Esperamos que sim. Esperamos que seja o mais rápido possível, porque as pessoas merecem. Este é também um problema de saúde pública e não apenas de eficiência energética ou de habitação”, diz. “Este é um problema que atinge toda a população e deveria ser parte da estratégia, uma das prioridades do governo”, remata.

 

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