Comecemos pelas boas notícias. A aposta na redução do IRS para os escalões mais baixos é notória. Poderá sempre dizer-se que tal já constava no Programa do Governo e que a comunicação social havia já vinculado um investimento em receita cessante de €200 milhões. No entanto, pelas simulações realizadas, suspeitamos que o montante é bem superior a esse, aproximando-se o valor correto ao dobro dessa quantia.
Essa “devolução” é efetuada de forma seletiva. Uma arquitetura articulada:
► de escalões (dois novos);
► de taxas (com o desdobramento do 2.º e 3.º escalões, com taxas de 23% e 35%, respetivamente, quando as anteriores eram de 28,5% e 37%);
► de atualização de mínimo de existência (que passa de €8.500,00 para €8.847,72), origina uma natural redução de tributação centrada nos agregados familiares com rendimentos brutos situados entre €10.000,00 e €40.000,00.
Uma outra novidade relevante a este respeito: existe uma tendência de aproximação de tratamento fiscal dos titulares de rendimentos da categoria B com o regime aplicável à categoria A. Sendo um movimento meramente aproximativo neste momento, esta tendência deverá acentuar-se nos próximos anos.
Verificamos, igualmente, uma modificação estrutural ao nível dos cheques-educação, que passam a ser tributados na sua totalidade em sede de IRS. A medida é compensada pela previsão de uma nova dedução à coleta, para efeitos de despesa de educação e formação, a qual tem o limite de € 200,00 anuais (mas sempre sujeito ao limite global de € 900,00) relativamente às despesas com o arrendamento de imóvel ou parte de imóvel, no caso de estudantes até 25 anos que se encontrem deslocados da residência permanente do agregado familiar, desde que dos recibos conste a menção de que o arrendamento se destina a um estudante deslocado.
Todas estas medidas, conjugadas com o aumento das pensões, demonstram claramente a opção do governo na eleição do IRS e da devolução do rendimento às famílias como a opção basilar desta PL OE 2018.
Boa notícia é a inexistência de qualquer alteração ao nível da derrama estadual. O agravamento da mesma significaria a rotura com um modelo de estabilidade que vigorava até agora. Esse agravamento seria despropositado e desnecessário. Despropositado porque daria um sinal errado ao futuro. Desnecessário, porque a receita recebida seria pouco significativa, ou seja, manifestamente desproporcional perante o efeito reputacional negativo originado.
Uma coisa é dar prioridade no benefício a um imposto em detrimento de um outro. Algo bem mais grave resultaria de um agravamento arbitrário em sede de IRC. Mais corretas afiguram-senos modificações como a que prevê que a venda de ações numa sociedade não residente deverá passar a ser tributada em Portugal, ainda que seja realizada por uma entidade não residente, quando a maioria do património seja constituído por imóveis em Portugal não afetos a uma atividade empresarial. Apesar de acentuar a tendência de centralização da tributação nos imóveis – que não podem fugir para outras jurisdições – em contraste com outras realidades, consiste numa opção justificável em sede de política fiscal geral.
Positiva é igualmente o reforço dos incentivos fiscais à reabilitação urbana. Por sua vez, a vertente das más notícias é comparativamente reduzida em comparação com o volume de boas notícias. Porém, isso será normal uma vez que o orçamento tem claramente um objetivo de “devolução de rendimentos” às famílias.
Neste aspeto, salienta-se a atualização das taxas dos IEC, como o IABA, ao valor da inflação. Ora, no caso das bebidas alcoólicas, é já evidente a tendência de redução da receita à medida que as taxas do imposto aumentam. Neste quadro, seria conveniente que Portugal, à semelhança do Reino Unido e da Dinamarca, optasse por aplicar um congelamento de taxas por um ano de forma a verificar-se o comportamento da receita. De facto, a comprovar-se que a um aumento de taxa corresponde uma redução da receita estar-se-á a violar o princípio de legitimação desses impostos: precisamente a angariação de receita.
Em síntese, a PL OE 2018 aparenta-se positiva, em termos de saldo líquido, procedendo a uma efetiva devolução de rendimentos na ordem dos €400 milhões para os contribuintes mais desfavorecidos.
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