Independentemente de quem vença a apertada eleição presidencial norte-americana, mais de metade dos milionários da maior economia do mundo admite estar a equacionar investir em países que lhes garantam uma segunda nacionalidade ou autorização de residência permanente, dados os receios, por um lado, de aumento da violência e insegurança nos EUA, mas também, por outro, de mais impostos. Portugal está na linha da frente desta tendência, dando continuidade ao aumento do interesse norte-americano pela vida no nosso país, a par de outros países como Malta, Grécia, Itália, Espanha e Antígua.
A consultora financeira canadiana Arton Capital reporta que 53% dos quase mil milionários norte-americanos inquiridos recentemente considera adquirir uma segunda nacionalidade ou autorização de residência num país onde tal seja possível mediante um investimento, à semelhança do que acontece em Portugal (apesar do fim anunciado dos vistos gold). Esta tendência, explica a consultora citada pela CNBC, cadeia de televisão norte-americana com foco nos negócios, é independente do vencedor da eleição desta terça-feira.
Por um lado, no caso de uma vitória de Trump, parte da população teme um aumento da violência, tanto associada às ultraliberais leis de porte e uso de armas, como ligada à tensão política, social e até etno-religiosa que se espera; por outro, uma vitória de Kamala Harris trará uma subida considerável dos impostos para os norte-americanos com mais rendimentos, com a candidata democrata a pretender que quem tenha património líquido de mais de 100 milhões de dólares pague uma taxa de imposto efetiva mínima de 25%.
No detalhe do inquérito da consultora financeira canadiana, 40% dos inquiridos considera que teria uma melhor vida fora do país se Harris vencer, enquanto 35% tem igual opinião caso Trump vença. Como tal, 42% da amostra mostra-se interessada em usufruir de regimes de vistos gold quando estes estiverem disponíveis – uma percentagem que sobe para 62% quando considerados apenas os inquiridos mais jovens, entre os 20 e os 29 anos.
A amostra é constituída por 90% de indivíduos com um património líquido entre um e cinco milhões de dólares, com os restantes 10% acima deste nível.
Advogados de imigração e consultores patrimoniais dizem nunca ter visto uma procura como a que estão a ver agora, dando conta de que os ultra-ricos norte-americanos também veem cada vez mais a cidadania num país como um risco pessoal e financeiro concentrado. E sinalizam que, ao mesmo tempo que diversificam os seus investimentos, estão agora a criar “carteiras passaporte” para cobrir o risco do país.
Especialistas citados pela CNBC concluem que as eleições e o clima político aceleraram e contribuíram para a pressão dos americanos ricos para considerarem um Plano B no estrangeiro, depois de décadas em que os seus clientes americanos estiveram interessados principalmente em mudar-se para o estrangeiro por razões fiscais. Agora, é a política e o medo da violência.
Malta continua a ser o segundo passaporte preferido dos ricos americanos. Embora caro, com um custo total de cerca de um milhão a 1,2 milhões de dólares [mais de 900 mil euros], o programa de cidadania de investimento de Malta oferece cidadania e viagens e residência irrestritas em Malta e, por extensão, na União Europeia, de acordo com advogados de imigração citados pela CNBC, dando conta de que a UE tem contestado o programa de Malta em tribunal.
Segurança e qualidade de vida em Portugal atraem americanos
À boleia dos Vistos Gold ou através do RNH, chegaram a Portugal para desfrutar da reforma, ou para trabalhar em modo remoto, atraídos pela segurança e qualidade de vida, alguns dos ingredientes que explicam os números: no final de 2023, residiam em Portugal quase dez mil norte-americanos – aproximadamente 1% do total de imigrantes no país.
“Portugal continua a revelar-se como um país atrativo para estrangeiros que pretendem trabalhar e fixar a sua residência no nosso país, desde logo pelas condições de segurança e clima de estabilidade social, qualidade de vida, fiabilidade e cobertura das infraestruturas de transportes, telecomunicações, energia, e também disponibilidade e qualificações da mão de obra”, começa por salientar ao JE Anabela Silva, Partner/People Advisory Services da EY.
Em matéria fiscal, realça a fiscalista, “o fim dos residentes não habituais introduziu alguma incerteza e preocupação, dado que este regime era bastante divulgado e competitivo a nível internacional; contudo, Portugal continua a dispor de outros instrumentos fiscais que podem ser interessantes, como o novo incentivo fiscal à investigação científica e inovação, em vigor desde 1 de janeiro de 2024”.
A este propósito, Anabela Silva realça a importância de que este novo incentivo seja regulamentado com celeridade, dado que algumas das atividades elegíveis dependem de portaria que ainda se encontra pendente de publicação desde o início do ano e que pode ainda mais potenciar a abrangência e aplicação do incentivo.
Recorde-se que o regime fiscal dos RNH prevê que os rendimentos líquidos do trabalho dependente e independente, obtidos em Portugal e decorrentes de atividade de elevado valor acrescentado, com carácter científico, artístico ou técnico, sejam tributados à taxa especial de 20%, sem qualquer limite máximo de rendimento.
Já em junho deste ano, o Governo de Montenegro anunciou a criação de um novo visto gold “solidário” para apoiar imigrantes, que visa dar autorização de residência em troca de 250 mil euros, que serão investidos em equipamentos e infraestruturas de apoio a imigrantes em dificuldades.
Este novo visto gold “solidário” trata-se de uma Autorização de Residência para Investimento Social, que será integrada no âmbito da já existente Autorização de Residência para apoio à produção artística. Uma extensão dos ARI que acresce àquela prevista no ‘Construir Portugal’ para o investimento em habitação a custos controlados ou renda acessível.
Regras dos vistos gold estão a mudar na Europa. Portugal não é exceção
A cadeia de televisão norte-americana dá ainda conta de que as regras e os custos dos golden visas estão a mudar rapidamente, realçando que, embora a imigração em massa se tenha tornado uma questão política polémica em todo o mundo, alguns políticos na Europa começaram a reagir contra os vistos gold que conferem aos ricos cidadania ou residência puramente baseada em investimentos.
A CNBC dá aqui o exemplo de Itália, que duplicou este verão o seu imposto fixo sobre os rendimentos estrangeiros de estrangeiros ricos que transferem a sua residência fiscal para Itália, para 200.000 euros (217.000 dólares). Uma mudança, diz, que se assistiu após uma onda de novos migrantes ricos que aderiram ao programa italiano de vistos gold e fez subir os preços dos imóveis em Milão.
Esta tendência de subida de preços do imobiliário também se registou no caso português, assinala o artigo: “Portugal, por exemplo, enfrentou uma reação negativa depois de uma avalanche de estrangeiros ter invadido o Algarve e comprado propriedades de praia como parte do programa de vistos gold”, dando conta que “com os preços dos imóveis a subir 15%, o governo alterou as regras, aumentando os limites mínimos de investimento e eliminando os imóveis residenciais como categoria de investimento”. Uma referência ao encerramento do programa de vistos a estrangeiros, que, em 2023, deixou de contemplar a aquisição de imóveis em Portugal, que era a medida mais procurada pelos investidores estrangeiros.
Com o objetivo expresso de combater a especulação imobiliária, o Governo de António Costa limitou as regras para obtenção de Autorização de Residência para Investimento (ARI), habitualmente designada Visto Gold. Desde 7 de outubro do ano passado, o critério de aquisição de imóveis, em qualquer zona do país, deixou, pois, de ser elegível para obter o documento dourado, numa ação que visou estancar a subida exponencial dos preços das habitações.
Mas não colocou um ponto final no regime lançado em 2012. Com o pacote Mais Habitação do governo socialista, entraram em vigor novas regras dos Vistos, com critérios mais apertados: os cidadãos estrangeiros só podem requerer um Golden Visa através de investimentos em fundos não imobiliários, em investigação, em produção artística e património cultural, na constituição de empresas e na criação de, pelo menos, 10 postos de trabalho.
A obtenção de uma ARI ficou limitada à transferência de capitais no montante igual ou superior a 500 mil euros, que sejam aplicados em atividades de investigação desenvolvidas por instituições integradas no sistema científico e tecnológico nacional e à aplicação de uma verba igual ou superior a 250 mil euros para investimento ou apoio à produção artística, recuperação ou manutenção do património.
Com as novas regras, também são elegíveis transferências de capitais no montante igual ou superior a 500 mil euros, desde que aplicados na aquisição de partes de organismos de investimento coletivo não imobiliários (fundos de investimento), cuja maturidade seja no mínimo de cinco anos e, pelo menos, 60% do valor dos investimentos seja concretizado em sociedades comerciais sediadas em território nacional.
Como funciona o programa português que se tornou popular entre investidores
O programa de autorizações de residência para investimento (também designado por ARI ou Golden Visa) foi lançado em 2012 em Portugal e destina-se a atrair cidadãos nacionais de países terceiros (não pertencentes à União Europeia), oferecendo uma autorização de residência temporária em troca de atividades de investimento em Portugal. Este programa tornou-se popular entre investidores, pois proporciona um caminho para residir em Portugal e, eventualmente, a possibilidade de obter a cidadania portuguesa.
Os beneficiários do Golden Visa têm direito a: viver e trabalhar em Portugal; circular livremente na Área Schengen sem necessidade de obtenção de visto; reagrupamento familiar; submeter o pedido de autorização de residência permanente em Portugal, após 5 anos de residência inicial; ou direito de submeter o pedido de nacionalidade junto das Autoridades Portuguesas, por naturalização, após 5 anos de residência, desde que os restantes requisitos legais se encontrem cumpridos.
Por outro lado, são obrigados a manter o investimento por um período mínimo de 5 anos e permanecer em Portugal por um período mínimo de 7 dias no primeiro ano de residência e por um período mínimo de 14 dias nos anos subsequentes.
Tagus Park – Edifício Tecnologia 4.1
Avenida Professor Doutor Cavaco Silva, nº 71 a 74
2740-122 – Porto Salvo, Portugal
online@medianove.com