A Associação Portuguesa de Empresas de Congressos, Animação Turística e Eventos (APECATE) estima que as cerca de 25 mil empresas do setor estão completamente paradas desde março. “Com o disparo da epidemia em Itália, e depois do cancelamento da Feira de Eletrónica de Barcelona, todos os eventos começaram a ser cancelados”, explica ao Jornal Económico António Marques Vidal, o presidente da APECATE.
Os cancelamentos provocados pelas medidas de contenção destinadas a travar a pandemia de covid-19 prolongam-se até ao mês de setembro e a APECATE garante que haverá um impacto superior a 300 milhões de euros neste setor”. “Não há previsão de quando [poderemos voltar]. Fomos os primeiros a parar e seremos os últimos a poder arrancar, o que coloca uma enorme pressão na sobrevivência do setor”, defende.
“Não tivemos negócio no primeiro semestre e no segundo semestre ainda não é claro como será, porque não sabemos quais as medidas que irão ser tomadas para depois do confinamento e se os promotores irão adiar ou cancelar as iniciativas. Um exemplo disso é o Rock in Rio, que foi adiado para 2021. Haverá Rock in Rio dois anos seguidos em Lisboa, mas não sabemos se as empresas que colaboravam com esse e outros eventos vão conseguir chegar a maio de 2021”, alerta António Marques Vidal
Também a Associação de Promotores de Espetáculos, Festivais e Eventos (APEFE) revela preocupação com os profissionais da animação de eventos, que “apresentam uma quebra de 100% na sua faturação, no seu rendimento, e estão proibidos de exercer a atividade”. A APEFE, em conjunto com as principais empresas de bilheteira nacional – Ticketline, Blueticket e BOL – apurou que um total de 364 empresas tiveram 7.966 cancelamentos, 15.412 adiamentos e 1.537 suspensões.
Deste clima de incerteza e preocupação nasceu o Movimento Cancelado, criado em março, constituído por 162 empresas da área dos audiovisuais, que junta mais de 4.800 pessoas no Facebook. “É dificil dizer se vamos sair todos bem disto, mas penso que não. Há quem consiga passar minimamente bem, muitas destas empresas vivem do crédito, e mesmo com lay-off será complicado porque estaremos parados”, revela António Martins, criador do movimento.
O responsável pelo MovimentoCancelado assegura que a prioridade é salvar os 1.500 postos de trabalho “a todo o custo”, mas confessa que isso dependerá das ajudas provenientes do Estado que, por enquanto, não deixam satisfeitos os trabalhadores do setor audiovisual.
Numa carta enviada ao primeiro-ministro AntónioCosta, o Movimento Cancelado pediu a suspensão do “pagamento de todas as obrigações fiscais e contributivas sem penalização ou juros” e a criação de “linhas de apoio às nano, micro, pequenas e médias empresas”. Solicitou, de igual modo, a “redução dos valores das rendas dos armazéns e escritórios afetos às atividades, o congelamento, por período a determinar, do pagamento das prestações bancárias já contraídas pelas empresas, apoios para formação profissional comparticipada e planos de ação concretos e a disponibilização de apoios para restabelecer a confiança e incentivar a retoma do volume de faturação”. No ano passado, as 162 empresas tiveram “um volume de negócio de 120 milhões de euros”, revela António Martins.
Audiovisuais desmoronaram em março
“O último trabalho que tivemos foi no dia 7 de março, mas no dia 9 tudo desmoronou, começámos a receber telefonemas com tudo o que eram cancelamentos ou adiamentos. Abril foi totalmente cancelado, em maio tudo cancelado, temos apenas quatro ou cinco adiados com data prevista”, recorda António Martins que além de criador do Movimento Cancelado é também um dos três sócios-gestores da Aldeia da Luz, que fornece equipamento e iluminação.
A Aldeia da Luz trabalha em Portugal e no estrangeiro com artistas como Carminho, Kátia Guerreiro e Maria Emília, mas este ano, até maio, já teve 70 datas canceladas e estima perder cerca de 200 mil euros na possibilidade de só regressarem à normalidade em setembro.
Os valores avultados têm feito parte do dia a dia dos responsáveis das empresas de animação, que procuram soluções para a sobrevivência do negócio. “Precisamos de um balão de oxigénio, caso contrário vamos ficar debaixo de água”, adverte Isabel Raposo, coordenadora executiva da NCS, responsável pelos festivais Outjazz, em Lisboa, e Outfest, em Cascais.
A NCS prevê ter perdido 400 mil euros com os cancelamentos de eventos em abril, maio e junho, registando desde já uma quebra de 80% em relação ao ano anterior. Isabel Raposo receia “que não existam políticas de incentivo à retoma da cultura e do entretenimento” e relembra que, no passado, a banca foi ajudada e “neste momento são os contribuintes que precisam”.
Isabel Raposo espera que esta seja também uma fase de reflexão sobre a importância atribuída ao setor. “As disciplinas que na academia e do ponto de vista escolar têm menos horas letivas, como é o caso da música e da expressão dramática, são na quarentena as que nos ocupam o tempo”.
Quem tem contribuído para o entretenimento dos outros durante o período de isolamento social é Tiago Amado, DJ profissional cujos eventos foram cancelados por dois meses. “A ideia de trazer música às pessoas que gostam do meu trabalho sempre foi algo que pensei fazer, mas não com tanta frequência como agora. Nesta altura também temos de nos reinventar e senti necessidade de fazer aquilo de que mais gosto”, explicou ao Jornal Económico.
Durante o período em que estará impossibilitado de passar música, Tiago Amado conta perder 3.600 euros. Nesta posição estão muitos outros profissionais que trabalham na área da animação de eventos em regime freelancer.
O DJ considera ser “possível manter esta situação durante dois meses”, mas “a partir daí é insustentável”. No que toca às perspetivas de futuro a longo prazo, admite que será desafiante. “Com as restrições que nos vão impor, os eventos cancelados e os freelancers que não aguentaram esta fase e encerraram atividade, e se também contarmos com o medo que muitos terão de voltar aos aglomerados, nos primeiros tempos não será fácil”, reconhece.
Preocupações reforçadas pelas últimas indicações transmitidas pelos epidemiologistas aos responsáveis políticos, dando conta de que dificilmente haverá condições para a realização de eventos com elevada concentração de pessoas nos tempos mais próximos. O que poderá levar a ainda mais cancelamentos, com enorme impacto para os profissionais e empresas do setor.
Artigo publicado no Jornal Económico de 17-04-2020. Para ler a edição completa, aceda aqui ao JE Leitor
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