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Bancos centrais querem mais certezas antes de descer juros

A tendência de alívio da inflação parece ser para continuar, embora com muitos pontos de interrogação no horizonte, tanto fruto das tensões bélicas, possibilidade de novas barreiras ao comércio ou situações políticas internas, reconheceram os vários oradores no Fórum do BCE realizado em Sintra.
3 Julho 2024, 07h30

Apesar dos sinais positivos, os líderes dos bancos centrais europeu e norte-americano querem ver mais sinais de que a inflação está a percorrer o caminho desejado, mantendo a prudência quanto a possíveis cortes até ao final do ano. A estratégia é também influenciada pelas tensões geopolíticas mundiais e a elevada incerteza que se continua a verificar, que tendem a agravar pressões inflacionistas e causar perdas de bem-estar, apontaram vários especialistas no Fórum organizado pelo Banco Central Europeu (BCE) em Sintra.

No painel de terça-feira que reuniu os responsáveis pelo BCE, Reserva Federal e Banco do Brasil, Christine Lagarde e Jerome Powell reforçaram a tendência animadora que a inflação tem mostrado em leituras recentes, mas confessam precisar de mais dados para poderem avançar com novos cortes de juros.

“Uma leitura mais baixa do que a anterior é bom”, começou por afirmar, embora com algumas ressalvas, sobretudo do lado dos serviços, projetando um “caminho acidentado” até à normalização da política monetária. Os comentários foram feitos no mesmo dia em que se soube que a inflação na zona euro em junho recuou marginalmente de 2,6% para 2,5%, embora os serviços se tenham mantido em 4,1% pelo segundo mês seguido.

Perante esta evolução, Lagarde quer perceber o que se está a passar estruturalmente, sublinhando novamente a importância de monitorizar a situação e os dados que forem sendo conhecidos. Em específico, a componente laboral parece ser determinante, dada a heterogeneidade nas leis de negociações coletivas entre Estados-membros e um “efeito de catching up” para trabalhadores cujo salário real caiu significativamente nos últimos tempos.

“Tipicamente, a inflação nos serviços é mais sticky do que do lado dos bens”, contrapôs Jerome Powell, embora admitindo que quer ver mais sinais de que “o que estamos a ver é o que realmente se está a passar na inflação subjacente”.

Na leitura mais recente, de maio, a inflação nos EUA medida pelo índice de preços no consumidor abrandou para 3,3%, o valor mais baixo em três meses. Já o indicador core está em 3,4%, um mínimo de três anos fruto de mais de doze meses seguidos de recuos.

Choques geopolíticos preocupam

No anterior painel, vários especialistas haviam destacado as formas como tensões geopolíticas, sejam na forma de guerra militar, seja com tarifas e restrições ao comércio livre, afetam a inflação global. Esta é uma realidade particularmente preocupante na Europa, onde os conflitos militares voltaram e a transição energética, altamente dependente de matérias-primas não disponíveis no espaço europeu, é uma prioridade.

“Uma maior proliferação de tensões geopolíticas pode não ser compatível com a transição climática. Cria o risco de os países europeus se verem cortados do que é necessário”, alertou Beata Javorcik, economista-chefe do Banco Europeu para a Reconstrução e Desenvolvimento. Por outro lado, “as restrições [ao comércio] podem ser introduzidas muito rapidamente; abrir uma mina demora, no mínimo, dez anos”.

Outro choque negativo à economia global que corre sério risco de se materializar é o reacender da guerra comercial entre EUA e China, sobretudo caso se concretizem as ameaças de Trump de instaurar tarifas de 10% generalizadas a qualquer importação. Jan Hatzius, economista-chefe da Goldman Sachs, considera provável que tal cenário levasse a uma resposta na mesma medida, o que “provavelmente prejudicaria mais a zona euro do que os EUA”

O efeito nos preços, contudo, seria consideravelmente mais forte nos EUA, com cerca de 1,1% a juntar à inflação face a apenas 0,1% na zona euro. Já o PIB recuaria cerca de 1% na UE contra apenas 0,5% nos EUA.

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