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CEO do BPI: “A banca tem enorme supervisão sobre tudo o que faz. O futebol deve ter o mesmo escrutínio”

João Pedro Oliveira e Costa, CEO do banco que patrocina a FPF, critica o clima de toxicidade no futebol português e defende que o mesmo não pode ser supervisionado por entidades próprias. Este responsável estará no EurAfrican 2024, que começa esta segunda-feira em Lisboa (com o JE como media partner), e considera que a Europa precisa mais de África do que o contrário.
15 Julho 2024, 08h50

O CEO do BPI, João Pedro Oliveira e Costa, fala com orgulho da ligação do BPI ao futebol português, através do patrocínio à Federação Portuguesa de Futebol (renovada até 2030) e no apoio ao futebol feminino através do naming da liga e do apoio às jogadoras através das bolsas de estudo e ações de literacia financeira.

Este responsável enquadra o apoio anual de 50 milhões de euros (direcionado para o desporto mas também para a cultura, obra social e investigação) como uma forma do banco cumprir deveres que tem perante a sociedade. Quanto a um patrocínio mais alargado ao futebol português, João Pedro Oliveira e Costa recorda os critérios de “fit and proper” a que os bancos são sujeitos e que o futebol também devia ser.

O responsável máximo do BPI vai estar esta segunda-feira no painel “Sports – Fostering Integration and Sustainable Development” da edição 2024 do EuroAfrican que se realiza em Lisboa e que o JE é media partner: “Precisamos muito mais de África do que a África precisa da Europa”, considera.

Vai marcar presença no EuroAfrican 2024, onde vai levar a visão de futuro do BPI para o desenvolvimento sustentável e a promoção da integração através do desporto: como é que um banco pode fazer essa diferença?

Seja um banco ou outra entidade qualquer, temos todos o dever de ser naquilo que é a melhoria da sociedade. Pode parecer conversa fabricada ou politicamente correta mas parece-me que muitas vezes ficamos pelas palavras e menos pelas ações. Enquanto banco temos uma atuação muito abrangente na sociedade, até porque apesar das críticas, os bancos têm um papel fundamental por todos os motivos: da compra de uma casa ao financiamento às empresas. Não conhecemos nenhuma fintech que financie uma empresa, que faça depósitos aos clientes, etc. À parte disso, o banco entendeu (até porque tem uma fundação por cima) que temos outros deveres na sociedade. Temos um orçamento de 50 milhões euros anuais para a obra social, apoio à cultura, desporto e investigação. É um número muito significativo, não há nada paralelo em Portugal. Dois terços dos colaboradores do banco estão em operações de voluntariado.

E é daí que nasce a vossa ligação com o futebol?

No caso do futebol e nesta ligação com a Federação Portuguesa de Futebol não ficámos só pelo apoio e pela publicidade. Há todo um envolvimento e com ações concretas, independentemente da dimensão. A oferta de bolsas de estudo às jogadoras de futebol profissional da Liga BPI é um grande exemplo. Não há garantia nenhuma que aquelas jogadoras todas venham a ter algum tempo de desenvolvimento profissional no futebol mas é uma realidade diferente do futebol masculino. Quando temos a capacidade de contribuir para uma sociedade melhor, devemos fazê-lo. Vou dar um exemplo, também no desporto: eu sou do Sporting CP mas quando o SL Benfica foi campeão nacional e passou aqui o cortejo, pedi para iluminar o edifício de vermelho e branco porque temos essa possibilidade. Fomos insultados nas redes sociais como o banco nunca foi até hoje. E pergunta-me: deixou de fazer isso? Iluminámos no título do Sporting CP e na Taça de Portugal conquistada pelo FC Porto. Queremos uma sociedade mais tolerante, inclusiva e isso vai pelo exemplo que podemos dar aos outros e sobretudo aos mais novos enquanto estamos em posição de liderança. Quando me convidaram para estar no EuroAfrican este ano eu escolhi estar no desporto porque é um grande elo de ligação entre povos. É uma competição sem maldade, uma junção de pessoas, faz bem à saúde e tem uma envolvência transversal.

Que papel pode ter a Europa nesta ponte com África no sentido de ajudar este continente a consolidar o seu desenvolvimento?

Considero que África tem dado um grande exemplo no que diz respeito a esse exemplo de comunhão que é o desporto e também na competitividade em variadíssimas modalidades. Acredito que o desporto pode ser uma grande ponte. O que posso fazer enquanto CEO do BPI num fórum destes? Dar o exemplo e contar o meu testemunho e partilhar experiências. Acredito que precisamos muito mais de África do que a África precisa da Europa, até porque temos outros continentes que têm uma muito maior capacidade de influência do que a nossa. Mas a Europa tem uma ligação histórica com África. África tem um potencial gigante, tem recursos naturais fantásticos, têm uma população a crescer e muito jovem, com muitas capacidades. O Português é uma das línguas mais faladas e isso traz também essa ligação emocional e devemos explorar essa amizade que tem de ser recíproca e vista entre iguais.

O BPI e a FPF iniciaram a sua ligação em 2018 com um acordo alargado de patrocínio às Seleções Nacionais A de futebol masculina e feminina e da Seleção Nacional de Sub-21. Além disso, o Banco dá o naming à principal competição de futebol feminino, a Liga BPI, e mais recentemente patrocina a Taça da Liga feminina. O que representa esta aposta do desporto por parte do BPI?

No início quisemos uma ligação que representasse a paixão por Portugal para a promoção da nossa marca e para estabelecer uma ligação emocional. Mas isso foi o início. A partir daí, fomos conhecendo o trabalho da FPF e a FPF foi conhecendo o trabalho do BPI. A ligação entre estas duas entidades é um bocado mais transcendente. A FPF, por ação de Fernando Gomes, transformou a Federação numa entidade com meios financeiros significativos, fez uma aposta na qualidade com a ambição de ganhar e de apostar onde ninguém estava a apostar: no futebol feminino. Esse era o grande eixo e felizmente isso aconteceu. A FPF tem o mesmo ADN do BPI no que diz respeito à inclusão, igualdade, não deixar ninguém para trás e isso foi o que nos atraiu mais nesta ligação. Já não é tanto um patrocínio mas sim uma parceria entre duas entidades que gostam muito uma da outra, e isso vê-se até na forma como comunicamos. Já não estamos só nos momentos mais felizes ou apenas para apoiar a Seleção A, estamos para apoiar as outras seleções e até com recurso a jogadores e jogadores menos mediáticos, e esse tem sido o nosso eixo. Temos aqui um bom exemplo do que é que uma empresa grande pode fazer pela promoção do desporto. Ao princípio ninguém queria a seleção feminina, agora começámos a ganhar e a situação já é diferente. As jogadoras da seleção têm histórias fantásticas, nem todas elas são maravilhosas. Por isso é importante dar ferramentas, conhecimentos e saídas profissionais. Felizmente, já se começam a ver frutos do desenvolvimento do futebol feminino.

O futebol feminino pode fazer com que a modalidade faça com que o futebol, e o desporto de uma forma geral, possa tornar-se menos tóxico do que aquilo que assistimos tantas vezes em Portugal?

Quero acreditar que sim. Como sociedade não podemos permitir que haja atores, agentes, que fomentem essa toxicidade e temos de ser muito condenatórios e muito firmes na não aceitação. Se isso não for feito, vai contaminar o futebol feminino porque há muito dinheiro e promoção pessoal em jogo. Uma das formas que define a minha forma de gerir o banco foi porque joguei râguebi durante uma série de anos: aqui não há estrelas, ninguém ganha sozinho.

Esta é uma ligação que se estende até 2030, ano em que Portugal vai coorganizar o Mundial. Considera que este é um patrocínio para reforçar no futuro?

É preciso recordar que o contrato acabava em 2026 e quisemos prolongar: porque estamos muito satisfeitos com a ligação (vai muito além da promoção da marca), entendemos que era importante celebrar esta conexão ainda na presidência de Fernando Gomes e porque Portugal vai ter um evento de grande dimensão e queremos estar ligados a isso e garantir que seríamos nós que iriamos lá estar. Além disso, temos um acionista espanhol e o Mundial será coorganizado com Espanha.

Esta aposta no desporto, e no futebol concretamente, é também uma aposta na sociedade? O BPI e a FPF têm vindo a desenvolver iniciativas de apoio social e até o lançamento das Bolsas de estudo para jogadoras da Liga BPI.

Atribuímos 19 bolsas de estudo às jogadoras profissionais e essas bolsas permite-lhes estudar e treinar. É um incentivo para que se empenhem. Depois desenvolvemos um conjunto de iniciativas de literacia financeira, obras sociais, promoção da imagem… ora aqui está um bom exemplo: a Kika Nazareth apareceu em cartazes do BPI no país inteiro. Tenho a certeza que outras marcas vão pegar noutras jogadoras e dar-lhes essa projeção e valorizá-las. E onde é que se posiciona marca? A perceção da marca tem que ser subtil, temos de saber esperar, elas é que são as protagonistas, nós somos a segunda linha. Isto exige maior investimento e com o tempo vamos estar incutidos na cabeça dos jovens. Queremos construir essa imagem. Descobrimos este gancho do futebol feminino.

O futebol português está em transformação, até pela centralização dos direitos televisivos que terá de acontecer até ao final da década. Com a necessária transformação do produto, poderá haver uma aproximação do BPI?

Quero acreditar que sim. Temos visto que há uma alteração pela positiva nos últimos tempos. No futebol profissional circula muito dinheiro e tem um impacto de massas muito significativo, daí que eu acho que tenha que ser levado muito a sério. Não é por acaso que hoje em dia os bancos têm uma supervisão e o BPI e os outros têm que fazer um “fit and proper”, existindo uma supervisão enorme sobre tudo o que fazemos. No futebol tem que haver a mesma coisa. Não podemos dizer que existem umas entidades próprias do futebol que supervisionam o futebol. A sociedade civil tem de supervisionar o futebol e tem de existir um enorme escrutínio nesta atividade. O futebol português é um fenómeno porque temos centenas de treinadores e jogadores pelo mundo. Construímos uma capacidade de exportação de jogadores e know-how num desporto de dimensão mundial. Tem sido muito importante o papel da FPF em todas as dimensões: das ligas inferiores às seleções. Se conseguirmos projetar o nome de Portugal por alguma via, porque não? Antigamente tínhamos a Amália e o Eusébio, agora temos Cristiano Ronaldo mas esperamos que possamos ter muitos mais no futuro que possam alimentar esse orgulho que não nos vai largar. Sabe que estive muitos anos ligado à diáspora e conheci bem essa realidade. Cheguei a chorar com eles e com a paixão que têm pelo país. Se lhes pudermos dar um ídolo, uma referência, qual é o problema que seja do futebol?

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