[weglot_switcher]

CGD: nova comissão de inquérito arranca hoje com audição a auditora EY

A auditora EY é a primeira entidade a ser ouvida na comissão parlamentar de inquérito (CPI) à gestão da CGD, após divulgação de relatório à gestão da Caixa entre 2000 e 2015, que concluiu por perdas de 1.647 milhões de euros. Presidente da nova CPI espera que Parlamento “vá mais longe” no apuramento de factos e apela a participação “ativa e efectiva” de todos os intervenientes que vão ser ouvidos nos próximos quatro meses.
  • Rafael Marchante/Reuters
26 Março 2019, 07h49

O presidente da II Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos (CGD) e à Gestão do Banco deseja que a nova comissão de inquérito “vá mais longe” no apuramento de factos do que a primeira com o mesmo objecto e que foi criada após a divulgação do relatório de auditoria da EY à gestão da Caixa entre 2000 e 2015, que concluiu por perdas de 1.647 milhões de euros em 186 operações de crédito que acabaram por se revelar ruinosas. É sobre estes resultados que a nova CPI vai ouvir nesta terça-feira, 26 de março, os três autores do relatório de auditoria da EY, a primeira entidade a ser ouvida no Parlamento.

“A nova CPI tem condições, do ponto de vista legal, para ir mais longe no apuramento de responsabilidades”, afirmou ao Jornal Económico LuÍs Leite Ramos. O presidente da nova CPI à Caixa recorda que o Parlamento aprovou uma lei sobre transparência da informação relativa à concessão de créditos de valor elevado e reforço do controlo parlamentar no acesso a informação bancária e de supervisão. O objetivo deste diploma é dar mais informação à Assembleia da República, no âmbito das investigações, bem como obrigar o Banco de Portugal a publicar informação de uma forma mais sistemática nos casos dos bancos que receberam ajuda pública.

“Como presidente da CPI estou, sobretudo, preocupado em garantir que os trabalhos se desenrolem da melhor forma possível: Ou seja, que os objectivos e o objecto desta comissão sejam cumpridos, desempenhando a nossa função de escrutínio e de apuramento de responsabilidades sobre o que aconteceu na CGD”, salientou Luís Leite Ramos.

O deputado do PSD deixa, porém, um alerta: ”dependerá da forma como os diferentes personalidades que vão ser ouvidos ajudem a cumprir o nosso trabalho”, salientando que se aguarda “de todos os intervenientes uma participação efectiva e activa”.

“Pretendemos dar resposta à pergunta que todos os portugueses fazem: o que aconteceu na CGD e como aconteceu?. O objetivo é que haja respostas efetivas que criem condições para que não volte a acontecer [créditos ruinosos]”, conclui Luís Leite Ramos.

Segundo a auditoria da EY no ‘Top 25’ dos créditos mais ruinosos, num total de 1.263 milhões de euros, foi entre 2000 e 2007 que se concentraram 78% destas operações: 871 milhões de euros de perdas registadas em 2015, referentes ao período em que a administração de Carlos Santos Ferreira (entre 2005 e 2008) é apontada com maior concentração de créditos ruinosos, como à Artlant, a Joe Berardo e ao empreendimento Vale do Lobo.

A segunda CPI arranca nesta terça-feira, 26 de março com a audição da auditora EY. Nos dois dias seguintes, 27 e 28, seguir-se-ão, respetivamente, as audições ao atual governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, e ao anterior, Vítor Constâncio.

Para além das audições à EY, a Carlos Costa e a Vítor Constâncio, foram já aprovadas outras ao anterior Revisor Oficial de Contas da Caixa, a Oliveira Rego & Associados, ao anterior responsável pelo departamento de auditoria da Caixa, Eduardo Paz Ferreira, ao anterior presidente do Conselho de Auditoria do Banco de Portugal, João da Costa Pinto, e ainda a João Dias Garcia, antigo secretário da mesa da assembleia geral da CGD.

A lista de nomes propostos pelo PS, PSD, CDS, BE e PCP, inclui reguladores, auditores, antigos presidentes, administradores e directores do banco, órgãos de fiscalização, políticos e grandes devedores como Manuel Fino da Investifino e Joe Berardo da Fundação Berardo.

Os partidos querem ainda ouvir antigos administradores entre os quais Carlos Santos Ferreira e Armando Vara (2005 a 2008), Celeste Cardona (2004 a 2008), Almerindo Marques (2000 a 2002) e Carlos Costa (2004 a 2006), que também será ouvido na qualidade de Governador do Banco de Portugal.

Presidente da AR espera que nova CPI “vá mais longe”
No final de fevereiro, o presidente da Assembleia da República desejou também que a nova comissão de inquérito sobre a recapitalização e gestão da CGD “vá mais longe” no apuramento de factos do que a primeira com o mesmo objeto. A nova CPI à Caixa foi criada depois da divulgação de novos documentos, nomeadamente a auditoria independente da EY, tendo os partidos entendido que se justificava a constituição de uma nova comissão, embora com um objeto mais amplo.

A comissão integra sete parlamentares do PSD, sete do PS, um do BE, um do PCP e outro do CDS-PP. O PS indicou como primeiro vice-presidente Fernando Rocha Andrade e o CDS-PP João Almeida como segundo vice-presidente e que será também o relator da comissão.

Pelo PSD, além do presidente, o coordenador será o deputado Duarte Pacheco, e os restantes elementos serão Duarte Marques, Conceição Ruão, Inês Domingos, Carlos Silva, Virgílio Macedo.

Pelo PS, o coordenador da equipa será o deputado João Paulo Correia, que contará com mais três ‘vices’ da bancada socialista: Fernando Rocha Andrade, João Marques e Carlos Pereira.

Já o CDS-PP, partido que propôs a comissão, terá além do deputado efetivo João Almeida (porta-voz do partido e que participará pela terceira vez nos inquéritos parlamentares sobre o banco público), a ‘vice’ da bancada e do partido Cecília Meireles e Ana Rita Bessa como suplentes.

Pela parte do BE, a dirigente Mariana Mortágua integrará esta comissão de inquérito como coordenadora, tendo como suplentes Jorge Costa e Ernesto Ferraz.

Pelo PCP, Paulo Sá será o deputado efectivo e coordenador deste grupo parlamentar, contando ainda com Duarte Alves e o líder parlamentar, João Oliveira, como suplentes.

Concessão de crédito sem controlo custou 903 milhões
No relatório da EY são reveladas 15 operações sem qualquer parecer individual da análise de risco, que resultaram em 86 milhões de perdas entre os 25 maiores créditos. E descobriram 13 operações em que o parecer de risco foi mesmo desfavorável, com 48 milhões de perdas nas operações de maior dimensão. No total, esta concessão de crédito sem controlo custou 903 milhões.

O relatório revela volumosas perdas nos créditos de risco da CGD. Até final de 2015, o banco tinha perdido 1.198 milhões de euros em apenas 46 grandes créditos.

A EY diz ainda que, nas 186 operações verificou “uma maior concentração no período 2000-2007 e 2008-2011″, com um peso perto dos 90% do total, onde simultaneamente se verificam também maiores percentagens de perdas”.

Segundo o relatório, entre 2000 e 2007 foram realizadas 127 operações, com perdas acumuladas de 1.120 milhões; 47 operações entre 2008 e 2010 (477 milhões de perdas); oito entre 2011 e 2013 (40 milhões de perdas); e, quatro entre 2014 e 2015 (10 milhões).

Milhares de páginas chegaram ao Parlamento
A informação proveniente do Banco de Portugal, que chegou à nova CPI junta-se às 19 mil páginas em análise por parte da comissão, sobretudo provenientes da CGD. O volume de documentos recebidos acabou por ditar o adiamento do começo das audiências.

Para além desta documentação pedida à CGD e ao BdP, foi pedida informação à EY, bem como ao Conselho de Administração do Banco de Portugal.

Na lista de documentos reclamados ao BdP, juntam-se, entre outros, as auditorias e ações inspetivas realizadas à CGD entre 2000 e 2015, incluindo a sucursal em Espanha e o Banco Caixa Geral (Espanha). Já ao Ministérios das Finanças foram pedidas informações da Inspeção Geral de Finanças sobre os relatórios da Comissão de Auditoria da CGD, incluindo despachos dos membros do governo sobre cada informação. Neste caso, estarão em causa alerta sobre imparidades no banco público, decorrentes de empréstimos problemáticos concedidos.

Foi também solicitado ao Tribunal de Contas, o relatório completo da auditoria ao controlo do setor empresarial do Estado pelo Ministério das Finanças entre 2013 e 2015 – onde sinalizou que sinalizou “falta de controlo” na CGD por parte das Finanças.

Estes são alguns dos documentos que alguns partidos como o PS querem ter acesso, além dos reclamados junto da CGD como a versão original e completa do relatório da auditoria independente realizada pela EY aos atos de gestão da CGD entre 2000 e 2015. E ainda relatórios e atas da Comissão de Auditoria entre 2000 e 2015, atas do Conselho de Administração e Comissão Executiva entre 2000 e 2015, bem como os pareceres da Direção de Gestão de Risco objeto de análise no âmbito da auditoria independente realizada pela EY.

Na sequência da polémica em torno de uma auditoria sobre a concessão de crédito da CGD entre 2000 e 2015, o CDS-PP avançou inicialmente sozinho com a iniciativa, mas depois consensualizou com PSD, PS e Bloco o texto do projeto de resolução que foi aprovado. O PCP considerou desnecessária uma nova comissão de inquérito ao banco público, mas assegurou que não iria criar nenhum obstáculo à sua constituição, abstendo-se, sem apresentar propostas de alteração ao objeto dos trabalhos.

O texto consensualizado entre CDS-PP, PSD, PS e BE estabelece que esta comissão deverá funcionar pelo prazo máximo de 120 dias, tendo entre os seus objetivos apurar as práticas de gestão da CGD no domínio da concessão de crédito desde o ano 2000, apreciar a atuação dos órgãos de administração, fiscalização e auditoria do banco, dos auditores externos, governos e supervisores financeiros

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.