Os reitores das universidades de Lisboa, Porto, Coimbra, Minho e Iscte contestam o modelo de organização do sistema previsto na proposta de revisão do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES) apresentada na semana passada pelo ministro da Educação, Ciência e Inovação.
Em resposta, vão entregar ao Governo e aos partidos na Assembleia da República um “Retrato do Ensino Superior em Portugal” no qual fazem propostas para que o sistema binário – universitário e politécnico – possa evoluir de forma saudável respeitando a diversidade de tipos de instituições existentes em Portugal e as suas diferentes missões.
“A proposta de revisão enviada pelo ministro para discussão nesta semana mantém todos os aspetos negativos das versões anteriores”, afirma António de Sousa Pereira, reitor da Universidade do Porto.
“É chocante a ideia de todas, mesmo todas, as instituições de ensino superior (IES) passarem a ser universidades, as públicas e as privadas: recorde-se que das 97 IES existentes, 19 têm menos de mil alunos; e 24 têm menos de 500 alunos”, contrapõe Maria de Lurdes Rodrigues, reitora do Iscte. “A mais pequena tem menos de 100 alunos, a maior tem mais de 50 mil: A pergunta é se todas estas mais de noventa instituições devem ter a designação de universidade? Todas têm o número de áreas científicas que permita classificá-las como universidades?”
Segundo o documento com que os cinco reitores analisam a situação existente do ensino superior do país, a conclusão é que o sistema binário necessita de “mais diversidade” e de “mais especialização”, bem como da “definição de requisitos exigentes do ponto de vista da qualidade”: propõem que se mantenham os três tipos de instituições de ensino superior (IES) que estão em vigor para o subsistema universitário – “universidades”, “institutos universitários” e “escolas superiores” – e que se estabeleçam outros três tipos equivalentes para o subsistema politécnico – “universidades politécnicas”, “institutos politécnicos” e “escolas politécnicas”.
“Há uma diversidade própria do sistema que não está a ser considerada como devia ser: os tipos de instituições que este documento de cinco reitores propõe ajudam a responder aos desafios do ensino superior e a criar condições para fazer evoluir positivamente a realidade que é a nossa”, afirma Rui Vieira de Castro, reitor da Universidade do Minho.
Segundo o reitor da Universidade de Lisboa, Luís Ferreira, aquilo que se exige não é matar a diversidade das instituições atribuindo artificialmente a todas o mesmo estatuto: “A abordagem deve ser a de evolução incremental, permitindo a todas as IES definirem a sua missão, objetivos e estratégias de melhoria da qualidade de forma autónoma e independente”.
De acordo com o reitor da Universidade de Coimbra, “o sistema binário e os tipos de instituições dentro de cada subsistema devem permitir a cada IES um caminho de afirmação da sua especificidade e identidade, em torno, por exemplo, da especialização em subconjuntos de áreas científicas próprias ou de determinados graus de ensino”, detalha Amílcar Falcão. “O facto de uma IES ser uma ‘escola’ ou um ‘instituto’, universitário ou politécnico, ou de ter um número pouco expressivo de alunos, não diminui necessariamente a sua relevância académica”.
Amílcar Falcão dá como exemplo instituições internacionais com poucos milhares de estudantes que, apesar de serem escolas ou institutos muito especializados – e de não se chamarem universidades precisamente por serem especializadas – gozam de enorme prestígio internacional: London School of Economics and Political Science (11.500 alunos); Massachusetts Institute of Technology – MIT (11.920); Karolinska Institutet (8.600); ou Paris Institute of Political Studies – Science PO (14 000).
“Atribuir o nome universidade a todas as instituições de ensino superior atualmente existentes é criar uma ‘cortina de fumo’, uma ilusão, uma opacidade no sistema de ensino superior que não permite distinguir o que é distinto e perceber as diferenças que caracterizam as instituições”, afirma Maria de Lurdes Rodrigues. “É confundir o país, os estudantes e as famílias”.
A proposta
Segundo a tabela do documento dedicada ao subsistema universitário, o estatuto de “universidade” deve ser atribuído às IES mais abrangentes, com um número mínimo de licenciaturas, de mestrados e de doutoramentos em pelo menos cinco áreas de especialização. Devem dispor também de mais do que uma unidade de investigação com classificação de Muito Bom ou Excelente.
A classificação de “institutos universitários” deve caber a IES qualificadas num número reduzido de áreas, pelo menos três, mas com um número menor de licenciaturas, de mestrados e de doutoramentos. Aos institutos universitários bastará disporem de uma unidade de investigação com classificação de Muito Bom ou Excelente.
As “escolas superiores” serão IES muito especializadas num número limitado de áreas científicas, bastando-lhes terem uma licenciatura e um mestrado e disporem de uma unidade de investigação.
Passando ao subsistema politécnico, as “universidades politécnicas” deverão ter diversidade de cursos técnicos superiores profissionais (CTeSP) e um número abrangente de licenciaturas, de mestrados e de doutoramentos em pelo menos cinco áreas de especialização. Devem dispor de uma unidade de investigação com classificação de Muito Bom ou Excelente.
O estatuto de “institutos politécnicos” implica a qualificação científica num número reduzido de áreas, pelo menos duas, com CTeSP, licenciaturas e mestrados adequados às suas áreas. Deverão dispor de uma unidade de investigação. Às “escolas politécnicas” bastará terem em funcionamento um CTeSP e uma licenciatura.
Com esta proposta, os reitores das cinco universidades sublinham a relevância de estabelecer critérios objetivos para a classificação das instituições, respeitando a diversidade atualmente existente e apontando critérios para uma evolução incremental, mais exigente em termos de qualidade. “A classificação das instituições não pode ser determinada de forma discricionária pelos governos, sujeitando-os a pressões locais e regionais de todo o tipo: deverá ser o posicionamento das instituições face a estes critérios a determinar o seu estatuto, não a decisão de um ministro ou do Conselho de Ministros”, conclui Maria de Lurdes Rodrigues.
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