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Condenação de Marine Le Pen: partido pede mobilização popular

Jordan Bardella, provável sucessor de Le Pen como candidato às presidenciais, apelou a manifestações pacíficas em favor da condenada. Diversos líderes da extrema-direita europeia ‘saíram à rua’ em sua defesa.
1 Abril 2025, 07h00

Apesar de faltarem ainda dois anos para as presidenciais francesas, todas as sondagens davam como certa a vitória de Marine Le Pen, dirigente do partido de extrema-direita Rassemblement National, que contaria, para além da popularidade própria de uma ‘repetente’, com o fato de o atual presidente, Emmanuel Macron, chegar ao fim da sua carreira no Eliseu. No entanto, os tribunais aceitaram como provado o uso indevido de fundos comunitários por parte da futura candidata, o que a retirou do grupo dos ‘presidenciáveis’ pelos próximos cinco anos.

Poucas horas depois de o veredito ser conhecido, Jordan Bardella, líder do partido e anterior candidato a primeiro-ministro, apelou à mobilização popular contra a decisão dos tribunais. A condenação “é um escândalo democrático”, denunciou o presidente do partido, que acredita que a sentença é um golpe para afastar Le Pen do caminho da presidência. Nesse contexto, apelou “à mobilização popular e pacífica” – a parte do ‘pacífica’ é algo que, em França, não tem muita tradição – e publicou uma petição de apoio no site do partido com o objetivo de “mostrar que a vontade do povo é mais forte”. “Não é apenas Marine Le Pen que está a ser injustamente condenada: é a democracia francesa que está a ser executada”, declara a petição.

Marine Le Pen foi condenada por peculato e proibida de exercer cargos públicos por cinco anos. O juiz também sentenciou a política francesa a quatro anos de prisão, dos quais dois anos suspensos e o restante cumprido em prisão domiciliária, além de uma multa de 100 mil euros – com o partido a ter de pagar outra de dois milhões. Le Pen, o seu partido e cerca de duas dezenas de figuras da sua estrutura foram acusados ​​pelos promotores de desviar mais de 4,1 milhões de euros de fundos do Parlamento Europeu para pagar funcionários que trabalham para o partido em França. Os réus disseram que o dinheiro foi usado legitimamente e que as alegações incorporavam uma definição muito restrita do que faz um assistente parlamentar.

O juiz Benedicte de Perthuis decidiu que Le Pen, juntamente com outros oito dos acusados, deputados ou ex-deputados no Parlamento Europeu, e 12 assistentes parlamentares, eram culpados de desvio de fundos da União. Os réus não foram acusados ​​de se apossarem dos fundos, mas sim de os usarem em benefício do partido. Os promotores públicos pediram aos juízes que impusessem uma proibição imediata de cinco anos a Le Pen, independentemente de qualquer apelo, por meio de uma medida denominada ‘execução provisória’. Quando os juízes aplicam essa execução – como fizeram agora – a sentença transita imediatamente. Le Pen, que irá recorrer, mantém-se na Assembleia Nacional francesa até que o seu mandato termine.

Reações externas

Célere, a extrema-direita europeia – o partido de André Ventura incluído – tratou de ‘sair à rua’ em defesa da francesa, alegando que a decisão do tribunal tem motivações políticas. O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orban, um dos maiores aliados de Le Pen, foi um dos primeiros a reagir, dizendo qualquer coisa próxima do ‘somos todos Marine’ – indo buscar uma frase que a França celebrizou (Je suis Charlie). De Roma, o líder da Liga e vice-primeiro-ministro Matteo Salvini – cujas relações com Marine Le Pen estão longe de serem calorosas – disse em comunicado que “não nos deixemos intimidar, não paremos: a toda velocidade”. Segundo o italiano, a condenação foi inspirada pela União Europeia, sendo por isso “uma declaração de guerra de Bruxelas”. Os tribunais, diz, querem excluir Le Pen da vida política. “É um filme mau que também vemos em outros países, como na Roménia” – uma alusão a Calin Georgescu, o candidato de extrema-direita que venceu a primeira volta das presidenciais e que, por isso, acabaram anuladas.

Nos Países Baixos, o líder da extrema-direita Geert Wilders, que ganhou as últimas eleições mas não conseguiu formar governo, disse-se “chocado” por um julgamento “incrivelmente severo”. “Apoio-a a 100% e estou convencido de que ela irá ganhar o recurso e que se tornará presidente de França”, escreveu nas redes sociais.

Milorad Dodik, líder político da República Srpska (parte da federação da Bósnia Herzegovina), escreveu que “os tribunais tornaram-se instrumentos daqueles que temem a democracia”. Ele próprio objeto de um mandado de detenção por ataque à ordem constitucional, assinou também a sua mensagem com a frase “Je suis Marine”.

O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, disse que, “na verdade, cada vez mais capitais europeias estão a enveredar pela via do atropelamento das normas democráticas. Claro que não queremos interferir nos assuntos internos da França, nunca o fizemos. Mas, em geral, as nossas observações do que está a acontecer nas capitais europeias mostram que não há qualquer hesitação em ir além do quadro da democracia no processo político”.

A decisão indignou também o ex-presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, que arrisca 40 anos de prisão por golpe de Estado e que denunciou a sentença como “ativismo judicial de esquerda”, traçando paralelos com o seu próprio caso.

Elon Musk acusou a “esquerda radical” e antecipou uma “retaliação”. “Quando a esquerda radical não consegue vencer por meio do voto democrático, abusa do sistema judiciário para deter os seus opositores. É o seu modo de operar no mundo inteiro”, escreveu.

Reações internas

Para além do que disse Jordan Bardella, destaque para a resposta do Partido Socialista, pela voz do ex-presidente François Hollande. “A Justiça expressou-se na lei, não foi moralista e expressou-se com total independência”, declarou. Mas admitiu “uma sentença pesada, mas por factos graves”. “A única reação que podemos ter é respeitar a independência da Justiça”, insistiu. “Não é aceitável atacar juízes”.

Segundo o jornal ‘Le Monde’, o primeiro-ministro François Bayrou ficou, segundo o seu gabinete, “perturbado com a formulação do julgamento” contra Marine Le Pen.

Jordan Bardella, de 29 anos, que chegou a ser apontado pelo partido para formar governo – se se tivesse dado o caso de o presidente Macron escolher essa via depois das eleições legislativas antecipadas do ano passado – deverá ser, se tudo se mantiver como até à data, o candidato do Rassemblement National às presidenciais de 2027.

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