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Custo da transição sustentável na indústria é “encarado como um investimento estratégico”

“A sustentabilidade está a abrir novas cadeias de valor, desde a produção de energia renovável e materiais de baixo impacto carbónico até soluções digitais para monitorização e otimização de processos”, refere Nuno Guimarães, presidente do conselho de administração do PIEP.
20 Junho 2025, 17h09

A sustentabilidade é cada vez mais um foco das empresas, principalmente da indústria, uma vez que contribui para a redução do impacto ambiental, para a melhoria da reputação da empresa, para a redução de custos operacionais e para a promoção da inovação.

O Pólo de Inovação em Engenharia de Polímeros (PIEP) tem como missão ser uma entidade de referência na inovação em engenharia de polímeros, ao mesmo tempo que contribuiu para o desenvolvimento da indústria nacional do setor dos plásticos e afins, tem se dedicado à promoção de uma indústria sustentável, apregoando que esta é “vista como uma oportunidade de reposicionamento competitivo”. Ao Jornal Económico Nuno Guimarães, presidente do conselho de administração do PIEP, refere os apoios que a indústria tem recebido neste âmbito e como este setor olha para a transição.

Como é que a indústria olha para a transição para o sustentável?

A transição para a sustentabilidade deixou de ser uma tendência e tornou-se uma transformação estrutural e estratégica para a indústria. Longe de ser apenas uma exigência regulatória ou ambiental, é hoje vista como uma oportunidade de reposicionamento competitivo, inovação tecnológica e compromisso com um futuro mais resiliente. A indústria percebe que continuar a operar nos moldes do passado é incompatível com os desafios climáticos, geopolíticos e sociais do presente. Adotar práticas sustentáveis é uma questão de sobrevivência, mas também de liderança, e cada vez mais, um fator de reputação e atração de talento e investimento.

Qual o progresso que já tem sido feito?

O progresso já é visível, e em muitos casos, com resultados muito promissores. Assistimos a uma aceleração nos investimentos em tecnologias limpas, processos de produção mais eficientes, digitalização e automação inteligente. A economia circular está a deixar de ser exceção para se tornar uma realidade em vários setores, como a da indústria transformadora dos plásticos, com reutilização de materiais, valorização de resíduos e ecodesign. Políticas como o Pacto Ecológico Europeu, e mais recentemente, o Clean Industrial Deal, têm sido decisivas para orientar esta mudança, criando mecanismos financeiros, regulatórios e estratégicos que permitem à indústria descarbonizar sem perder competitividade. Portugal, por exemplo, tem vindo a reforçar a sua estratégia industrial para a neutralidade carbónica, com projetos relevantes nas áreas do hidrogénio verde, eficiência energética, materiais sustentáveis e reindustrialização baseada em inovação.

Quais os desafios que esta enfrenta?

Sem dúvida que os desafios são ainda muito significativos. Um conjunto alargado de setores enfrentam dificuldades em atrair investimento suficiente para reconverter as suas infraestruturas produtivas. A escassez de mão-de-obra qualificada, particularmente em áreas tecnológicas, constitui um obstáculo real. As PMEs, que representam uma parte significativa do tecido industrial português e europeu, enfrentam constrangimentos adicionais: desde a complexidade dos regulamentos à dificuldade em aceder a incentivos e apoios. A transição precisa também de ser justa e inclusiva, garantindo que regiões e setores mais expostos à mudança não são deixados para trás. A confiança dos trabalhadores, o diálogo social e a adaptação de competências serão tão importantes como a inovação tecnológica.

Quais as oportunidades que se abrem?

Apesar dos desafios, as oportunidades são muitas. A sustentabilidade está a abrir novas cadeias de valor, desde a produção de energia renovável e materiais de baixo impacto carbónico até soluções digitais para monitorização e otimização de processos. A aposta numa indústria mais verde e digital também contribui para a autonomia estratégica de Portugal e da Europa, reduzindo a dependência de matérias-primas e componentes críticos importados. Em paralelo, surgem novas formas de colaboração entre empresas, centros de I&D, universidades e startups, criando ecossistemas de inovação orientados para o desenvolvimento de produtos e soluções de maior valor acrescentado e com impacto positivo na sociedade. A indústria está, assim, não apenas a adaptar-se, mas a tornar-se um dos principais motores da transformação.

Qual o maior auxílio da indústria para atingir esta transição?

Neste processo, o maior contributo que a indústria pode dar é a sua capacidade única de transformar inovações tecnológicas em soluções escaláveis e de grande impacto sistémico. Para além de simplesmente desenvolver tecnologias avançadas, a indústria é capaz de integrar essas inovações em cadeias produtivas complexas, garantindo que os benefícios se multiplicam ao longo de toda a economia. A vasta rede de relações empresariais, o conhecimento técnico acumulado e uma cultura de melhoria contínua são elementos essenciais para concretizar esta transição de forma eficaz e sustentável. Para além do papel operacional, a indústria também desempenha uma função educativa, demonstrando que é perfeitamente viável alinhar a eficiência económica com a ambição ambiental e a responsabilidade social, promovendo assim um modelo de desenvolvimento equilibrado e duradouro.

Qual o custo monetário desta transformação para a indústria?

O custo monetário desta transformação é elevado e exige planeamento a longo prazo. Mas deve ser encarado como um investimento estratégico, e não como despesa. O custo de não agir, em termos de perda de competitividade, penalizações regulatórias, riscos climáticos ou reputacionais, é francamente superior. A médio prazo, os ganhos operacionais, a previsibilidade energética e o acesso a novos mercados sustentáveis compensarão largamente o esforço inicial. Para tal, é essencial o apoio de instrumentos europeus robustos, como o Fundo de Inovação, o Mecanismo de Transição Justa e os incentivos previstos no Clean Industrial Deal, que devem ser acessíveis e eficazes.

Está a ser criada uma nova era da indústria, a Indústria 6.0, como é que se olha para ela e o que é que esta poderá trazer de novo, em desafios e oportunidades?

Num horizonte mais de longo prazo, começa a desenhar-se o que muitos designam como Indústria 6.0, uma nova era marcada pela convergência entre inteligência artificial, redes autónomas, personalização extrema e uma ética industrial renovada. Esta nova fase ultrapassa a digitalização da Indústria 4.0 e a visão mais humanista da Indústria 5.0, incorporando sustentabilidade, resiliência, circularidade e centralidade humana como valores estruturais. A Indústria 6.0 é, potencialmente, um ecossistema interconectado onde fábricas, recursos, dados e pessoas colaboram em tempo real, com mínima pegada ambiental e máxima criação de valor. Os desafios são complexos, desde a cibersegurança até à governação dos dados, mas o potencial de transformação social e económica é imenso. Não se trata apenas de uma nova revolução tecnológica, mas de uma redefinição profunda do papel da indústria na sociedade.

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