A Associação Portuguesa de Centros Comerciais (APCC) alerta que qualquer restrição de horários ou dias de funcionamento no setor do comércio, como propõe a iniciativa que vai ser discutida esta quinta-feira no Parlamento, e as propostas do Bloco de Esquerda e do PCP, traria “consequências extremamente negativas” e provocaria “um impacto drástico na economia do país”, com efeitos “nefastos” a vários níveis.
Questionada pelo Jornal Económico (JE) sobre o encerramento do comércio aos domingos e feriados e redução do horário para as 22 horas, a APCC avisa que “a redução da atividade de milhares de pequenos, médios e grandes comerciantes e retalhistas poderá representar a destruição de cerca de 40 mil postos de trabalho, mais de 18 mil nos centros comerciais e número idêntico em outras áreas do retalho e distribuição”.
Outra das consequências apontadas por Carla Pinto, diretora executiva da APCC, é a “redução de uma parte significativa do rendimento de quem trabalha no comércio”. Teria também impacto nas “opções dos trabalhadores em part-time, que têm flexibilidade horária e podem organizar os seus horários de acordo com as suas necessidades pessoais, financeiras e familiares”. Os estudantes seriam outros dos afetados, sobretudo dos que estudam fora de casa, para os quais o trabalho em part-time, no comércio, lhes permite “cobrir parte das suas despesas com os estudos”, sustenta a APCC.
A associação apresenta ainda mais motivos para que não se alterem os horários do comércio, como pede a iniciativa legislativa. Segundo a APCC, encerrar o comércio aos domingos iria pôr em causa “a liberdade de escolha das famílias”, tendo em conta que “os portugueses preferem fazer as suas compras ao fim de semana, que representam, atualmente, 39% da faturação nos centros comerciais”. O domingo, em particular, é o segundo melhor dia, somando cerca de 90 milhões de visitas anuais só nesse dia. Já o período pós-laboral equivale a 37% das vendas efetuadas ao longo de toda a semana.
Carla Pinto argumenta que “qualquer alteração representará, ainda, um risco acrescido para os setores da restauração, entretenimento e cultura, que assumem um peso cada vez mais relevante nas ofertas dos centros comerciais e as suas vendas não transitam para outros dias da semana ou outros horários”. A responsável diz mesmo que seria um “desastre autêntico” para a economia do país.
Se Portugal seguisse esse caminho, “estaríamos a favorecer e estimular as compras online através de plataformas internacionais, estando algumas delas na mira das entidades europeias, como são os casos da Shein e da Temu”.
Carla Pinto lembra que que nos países onde existem restrições horárias no comércio, “as compras online dispararam nas horas em que as lojas físicas estão encerradas, contribuindo para um aumento das importações e uma perda da receita fiscal – que poderá ter de ser compensada, de alguma forma, pelos contribuintes”.
Centros comerciais contribui com 5% do PIB
A diretora executiva da APCC realça também do comércio na economia do país, recordando que um estudo recente da Nova SBE indica que só o setor dos centros comerciais contribui com 5% do PIB nacional.
“Em 2024, os centros comerciais receberam mais de 600 milhões de visitas, gerando um valor superior a 14 mil milhões de euros da riqueza do país, o setor garante mais de 350 mil postos de trabalho, o que equivale a mais de 6,5% do emprego nacional, e gera 8% do total das receitas fiscais”, assinala, defendendo que no atual contexto económico e de incerteza, “o objetivo do país deve ser crescer e não reduzir a atividade económica por decreto”.
Paralelamente, a APCC afirma que mais de metade dos centros comerciais do país já encerram às 22 horas. “Os horários de funcionamento procuram dar resposta às necessidades de cada uma das comunidades onde os centros comerciais estão inseridos e atualmente estes espaços são muito mais do que meros locais de compras. São espaços multifuncionais que garantem uma oferta muito variada, que vai da saúde, à restauração e ao lazer, por exemplo, funcionando de acordo com um modelo de comércio integrado”, argumenta a responsável.
Carla Pinto termina reafirmando que “o descanso e as folgas são direitos fundamentais dos trabalhadores e estão amplamente regulados na legislação laboral portuguesa e nos Instrumentos de Regulação Coletiva de Trabalho”, pelo que “qualquer alteração fundamentada nos direitos dos trabalhadores é deitar por terra vinte anos de Concertação Social”.
O atual regime de funcionamento do comércio estipula que os estabelecimentos de venda ao público e de prestação de serviços, incluindo os localizados nos centros comerciais, podem estar abertos entre as 6 e às 24 horas todos os dias da semana.
A iniciativa legislativa de cidadãos, promovida pelo Sindicato dos Trabalhadores do Comércio e Escritórios de Portugal (CESP) que convocou uma greve para quinta-feira, considera que essa amplitude horária “tem implicado uma desregulação enorme dos horários de trabalho e a consequente desorganização da vida familiar dos trabalhadores deste setor”.
Defende, por isso, uma alteração ao Decreto Lei n.º 48/96, de 15 de maio, passando o horário de funcionamento do comércio a ser da 6h às 22 horas, de segunda a sábado, encerrando aos domingos e feriados.
O Bloco de Esquerda avançou na semana passada com uma proposta que determina o “encerramento das grandes superfícies comerciais aos domingos e feriados com a exceção dos cinemas e estabelecimentos de restauração”. No mesmo sentido, e nas vésperas da discussão da iniciativa legislativa, o PCP apresentou um projeto propondo o encerramento do comércio geral ao domingo e feriados e reduzir o funcionamento até às 22 horas nos dia úteis, prevendo exceções como a restauração, serviços culturais e as farmácias. Nenhuma das iniciativas terá, no Parlamento, pernas para andar.
Tagus Park – Edifício Tecnologia 4.1
Avenida Professor Doutor Cavaco Silva, nº 71 a 74
2740-122 – Porto Salvo, Portugal
online@medianove.com