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Gaza: ONG e jornalistas denunciam fome generalizada e pedem levantamento do bloqueio

Mais de cem pessoas já morreram à fome no enclave palestiniano, isto apesar das inúmeras carrinhas com ajuda humanitária retidas a escassos metros da fronteira pelo bloqueio israelita e egípcio. Trabalhadores humanitários e jornalistas cada vez mais ameaçados pela fome extrema.
Journalists and other mourners gather around the bodies of four Palestinian journalists and a media worker killed by an Israeli airstrike in Gaza’s Nuseirat refugee camp on December 26, 2024. (Photo: AP/Abdel Kareem Hana)
23 Julho 2025, 13h02

Mais de cem organizações não-governamentais (ONG), sobretudo relacionadas com a defesa dos direitos humanos e a entrega de ajuda humanitária, pedem aos governos de todo o mundo que tomem ação face à fome generalizada em Gaza às mãos do bloqueio israelita. Já mais de cem pessoas morreram por desnutrição no enclave destruído, a maioria delas crianças, isto numa altura em que a Agência France Presse (AFP) também urge uma intervenção para que os seus jornalistas não morram à fome.

A carta é assinada por 109 organizações, incluindo a Save The Children, Caritas Internacional, Amnistia Internacional ou a Médicos Sem Fronteiras, que pedem o levantamento do cerco israelita, que visa impedir a entrada de bens humanitários no enclave onde a maioria da população entra numa fase alarmante no processo de desnutrição. Estes bens, sobretudo comida, água potável e equipamento médico, estão a aguardar entrada na Faixa em armazéns a apenas algumas centenas de metros da fronteira.

“À medida que o cerco israelita mata Gaza à fome, os trabalhadores humanitários estão a juntar-se às linhas de comida, arriscando ser alvejados só para alimentar as suas famílias”, acusa a carta, lembrando as 875 pessoas mortas nos locais de distribuição de ajuda da polémica Fundação Humanitária de Gaza (GHF), controlada por Israel e pelos EUA.

Na mesma linha, as organizações rasgam este modelo “militar” de distribuição de ajuda, esclarecendo que “o sistema liderado pela ONU não falhou, está é a ser impedido de funcionar”.

“É altura de tomar ações decisivas: exigir um cessar-fogo imediato e permanente, levantar todas as restrições administrativas e burocráticas, abrir todas as fronteiras terrestres, assegurar o acesso a toda a gente em Gaza, rejeitar modelos militares de distribuição de ajuda, restaurar uma resposta humanitária regrada, liderada pela ONU e continuar a financiar organizações humanitárias imparciais e com princípios”, pedem os autores, urgindo os governos a “pararem de esperar por autorização para agir”.

O alerta surge numa altura em que há relatos de que a maioria da população de Gaza entrou na fase cinco do processo de fome generalizada, a última fase, onde parte dos danos físicos serão já irreversíveis. Nas últimas 24 horas, as autoridades de saúde locais reportaram dez mortos por fome, o que eleva o total de mortes por desnutrição para 111.

Ao mesmo tempo, o exército israelita emitiu novas ordens de evacuação, deixando apenas 12% do enclave disponível para a sua população – isto quando quase toda a infraestrutura foi danificada ou demolida. Além das mortes por fome, 31 palestinianos foram vítimas de ataques israelitas esta quarta-feira.

O pedido de intervenção por parte destas ONG surge no mesmo dia em que a AFP alertou para a morte iminente dos seus jornalistas na Faixa de Gaza em resultado da fome imposta pelo bloqueio israelita, fazendo saber que os irá tentar evacuar. A AFP é uma de apenas três agências internacionais com repórteres em Gaza, a par da Reuters e Associated Press, dado que Israel impede o acesso ao enclave por jornalistas internacionais, num bloqueio a meias com o Egito.

“Durante meses, assistimos impotentes às suas condições de vida deteriorarem-se”, lê-se num comunicado da AFP. “A situação deles é agora insustentável, apesar da sua coragem, profissionalismo e resistência exemplares.”

A Sociedade dos Jornalistas, principal sindicato associado à AFP, havia já alertado no dia anterior que a situação era intolerável, além de inédita.

“Já perdemos jornalistas em conflitos, outros ficaram feridos, outros foram detidos; mas nenhum de nós alguma vez se lembra de ver colegas morrer à fome”, afirmou a estrutura em comunicado. Desde o início da ofensiva israelita em Gaza, pelo menos 186 jornalistas foram mortos e 89 foram detidos, segundo os números do Comité para a Proteção dos Jornalistas, tornando este o conflito mais letal para a profissão desde a criação deste organismo nos anos 80.

Já esta quarta-feira, a Al Jazeera ecoou a mensagem, revelando que os seus jornalistas estão agora “numa luta pela sua sobrevivência”. Já antes, um dos pivôs mais conhecidos da estação na Faixa, Anas al-Sharif, havia confessado a sua exaustão nas redes sociais, dizendo estar a “resistir aos desmaios que me perseguem a todo o momento”.

A Al Jazeera está banida de reportar em Israel e na Cisjordânia em consequência de ordens judiciais do governo israelita e da Autoridade Palestiniana, que acusam a estação qatari de relações com o Hamas – acusações essas que a Al Jazeera rejeita veementemente.

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