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Impresa, Media Capital e RTP querem taxa sobre conteúdos utilizados pelas ‘Big Tech’ como Google e Facebook

No Congresso das Comunicações da APDC, Impresa, Media Capital e RTP pressionaram as ‘Big Tech’ a partilhar receitas com os media. Country manager da Google Portugal respondeu ao revelar que a multinacional já investiu oito milhões de euros em projetos de inovação dos media, em Portugal.
12 Maio 2021, 17h28

A Associação Portuguesa para o Desenvolvimento das Comunicações (APDC) juntou na 30ª edição do Congresso das Comunicações os principais administradores da Impresa, da Media Capital, da RTP e da Google Portugal para debater o ‘Estado da Nação dos Media’, esta quarta-feira. Neste debate os grupos de media reiteraram a defesa de uma taxa a cobrar a gigantes tecnológicos, como Google e Facebook, sobre conteúdos de media utilizados em plataformas digitais. Google garante que não “rouba” conteúdos e anunciou já ter investido oito milhões de euros em projetos de inovação dos media, em Portugal.

O presidente executivo do grupo Impresa, Francisco Pedro Balsemão, foi o mais vocal na defesa de se cobrar às Big Tech pelo aproveitamento de conteúdos profissionalmente produzidos pelos media. Para o gestor do grupo que controla o semanário “Expresso” e os canais da SIC, os media tradicionais têm um papel a cumprir, assim como os agregadores de notícias, redes sociais e outras plataforma digitais. Mas, aludindo para uma fuga das receitas publicitárias para as plataformas digitais, considera que há um desequilibro que está a contribuir para a “destruição” do modelo de negócio dos media tradicionais.

Questionado se acredita que irá ser definido um mecanismo para ser definido um preço a pagar por cada notícia veiculada, por exemplo, pelas redes sociais, o CEO da Impresa começou por afirmar: “Neste momento, o nosso modelo de negócio principal é a publicidade, com dois terços da nossa faturação a surgir via publicidade. O digital é uma grande tendência para os anunciantes [alocarem] algum do seu investimento – felizmente, em Portugal as televisões têm um enorme peso, mas o digital tem as suas mais-valias – e, neste momento, há dois players que são hegemónicos: a Google e a Facebook”.

Ora, para o Frnacisco Pedro Balsemão, o modelo de negócio “possível” para os media tradicionais “deixa de o ser a partir do momento em que há essa hegemonia”.

“Sabemos que há um domínio muito grande destes dois players naquilo que é a cadeia de valor na área da publicidade. Em ambos os eixos – a procura e a oferta – [essa domínio] foi sendo conquistado, de uma forma não tanto orgânica mas através de aquisições. Eles são gatekeepers, no sentido em que representam quase o acesso único às suas plataformas e com isso são árbitros e jogadores, ao mesmo tempo. Têm aqui um duplo papel: enquanto são árbitros das plataformas, também estão a concorrer contra os que usam as suas plataformas”, argumentou.

Qual é o problema? Segundo o gestor, as Big Tech têm “a capacidade de desenvolver algoritmos e outros mecanismos para se favorecerem a si mesmos”, face à concorrência dos media tradicionais, na monetização dos conteúdos produzidos por imprensa, televisão e rádio.

O gestor da Impresa disse, assim, que os conteúdos dos media têm “um custo em pessoas e em tecnologia”, pelo que defendeu a criação de uma taxa sobre as Big Tech. “Claro que nós queremos que isto [criação de uma taxa a pagar por redes sociais, agregadores de notícias e outras plataformas digitais] aconteça, que haja aqui um valor atribuído aos nossos conteúdos e que esse valor seja pago pelas grandes plataformas”.

“Consideramos isso justo porque trata-se de uma questão de direitos de autor”, acrescentou, apelando à necessidade de um reequilíbrio na cadeia de valor dos media.

A posição do CEO da dona da SIC foi apoiada pelo presidente executivo interino da Media Capital, Luís Cunha Velho, que também é o CEO da produtora Plural Entertainment.

“Há entre os media privados uma preocupação com os conteúdos e uma remuneração justa. Não somos contra as Big Tech, mas somos a favor que elas sejam olhadas com os conteúdos que utilizam e com o real valor que esses conteúdos têm e que, mais tarde,sejamos remunerados em relação a isso”, afirmou.

Segundo Cunha Velho, o mercado publicitário português “caiu cerca de 95 milhões de euros, ou seja, 15% com a questão da pandemia. ora, 15% é muito num mercado tão pequeno para canais que vivem exclusivamente da publicidade”. Ora, num contexto em que criar conteúdos e marcas fortes é “o foco principal”, assumindo que “isso custa dinheiro”, o gestor vincou que “é preciso encontrar modelos que trabalhem os algoritmos no sentido de não desviar conteúdos para outro tipo de sites ou devices”. que fogem ao que os media pretendem.

“Não somos contra as grandes plataformas, queremos é que efetivamente as grandes plataformas olhem para os conteúdos com aquele olhar que nós todos esperamos e que os mesmos sejam remunerados”, reiterou, antes de sublinhar que tem “algumas reservas” sobre se as Big Tech não contribuam para a “fuga de leitores e espetadores, através de algoritmos que os enviam” para plataformas não controladas.

Em representação da RTP falou Hugo Andrade, administrador da estação pública desde 2018 – inicialmente estava prevista a participação do novo presidente da RTP, Nicolau Santos.

O administrador da RTP preferiu focar  a questão na forma como um ecossistema de media equilibrado pode fortalecer o jornalismo e a atividade dos jornalistas. “Penso que esse é um tema que transcende em muito o mercado português. É um tema verdadeiramente mundial. Toda a área do entretenimento, mas principalmente do jornalismo carece de modelos novos”, começou por afirmar.

“Não podemos nunca esquecer  que a qualidade do jornalismo é um dos principais garantes da democracia. Os países ocidentais têm de reconhecer esse facto. Há vários mercados que têm intervenção por parte do Estado, através de regulação ou leis. [Em Portugal] a defesa da qualidade do jornalismo devia estar nas prioridades desses governos”, prosseguiu.

Para Hugo Figueiredo o modelo de negócio dos media tradicionais assenta num tipo de gestão que funcionou “nos últimos 50 ou 60 anos até determinado momentos” e que a agora está “a esgotar-se”.

“Devolver à sociedade a capacidade de manter o jornalismo independente, isso é muito relevante”, realçou. Por isso, defendeu: “Todas as medidas que contribuam para que a qualidade do jornalismo serão sempre medidas bem-vindas”.

 

Google investe oito milhões de euros em projetos de media em Portugal

No mesmo painel de debate estava o country manager da Google Portugal, Bernardo Correia, que procurou construir ideias pré-feitas sobre o que faz uma empresa como a Google aos conteúdos dos media. O gestor rejeitou a ideia de que a Google rouba conteúdos e os monetiza à conta dos media tradicionais, defendendo uma posição de parceria entre os media tradicionais, o jornalismo e a Google.  Nesse sentido, Bernardo Correia anunciou que a Google Portugal já investiu oito milhões de euros em projetos de inovação em media.

Primeira desconstrução, a ideia que a Google “rouba” conteúdos ou que faz dinheiro com o conteúdo dos outros. Embora nenhum dos gestores dos media tenha acusado a Google de roubar conteúdos, mas sim de os desviar para outros canais, Bernardo Correia explicou o lado da multinacional de origem norte-americana: “A Google não rouba conteúdos a ninguém. A Google cria links para os conteúdos dos outros e envia o tráfego para esses sites”.

Só na Europa, a Google redireciona oito biliões de cliques por mês para sites de notícias, segundo o gestor da Google Portugal. “Ou seja, as pessoas não leem notícias no nosso site”, explicou, relembrando que o agregador de notícias da Google, o Google News, foi criado pouco depois do 11 de Setembro de 2001. “As pessoas procuravam ‘Torres Gémeas’ e iam parar ao Wikipedia e nós quisemos criar links de notícias para as pessoas as lerem [informação fidedigna] nos sítios mais relevantes”, contou.

O country manager da Google Portugal, Bernardo Correia, acredita que esse volume de cliques gerado pela Big Tech é importante para os media, sendo que “o valor do tráfego [gerado] é enorme para a indústria do media”.

“Mas não ficamos por aí”, garantiu. O gestor, que realçou que não há “obrigatoriedade” de um media estar indexado aos motores de busca da Google, embora acredita que essa ligação seja importante pelo “valor económico” que representa para os media, esclareceu que a Google não usa os conteúdos”

“Nós pomos links para o conteúdo e para a pessoas lerem esse conteúdo e fazemo-lo em massa […] Mas não fazemos dinheiro com as notícias. O conteúdo noticioso é algo que nós promovemos em termos de inovação e utilização, porque achamos relevante para o utilizador. Aliás o Google News não tem anúncios. A maior parte do conteúdo onde fazemos dinheiro é, por exemplo, se alguém estiver pesquisar por uma ‘nova televisão’. Não é com o conteúdo noticioso que vem a maior parte das nossas receitas”, explicou.

“Não existe aquele pote de ouro ao final do arco-íris que muitas vezes a indústria acha que existe. O valor económico que existe é simbiótico: linkamos para as empresas de media, elas absorvem esse tráfego e transformam-no em dinheiro através de publicidade”, adiantou.

Esse trabalho, revelou, já permitiu à Google investir oito milhões de euros em inovação dos media portugueses. “Por exemplo, no estúdio de rádio Observador, que não existia antes do financiamento do Google News Iniative, e o estúdio de vídeo do Jornal de Notícias, que foi aberto no Porto”, disse. Essa verba também permitiu promover projetos de combate às notícias falsas (Fake News).

Desta forma, Bernardo Correia garantiu que “também não é verdade que a Google não pague por notícias”. “A nossa partilha de receitas publicitárias, através de um software de gestão publicitária para os publishers, gerou cerca de 14 biliões de dólares a nível global, ao qual Portugal terá a sua quota”, afirmou.

“Acho que há vários mitos nesta conversa”, concluiu Bernardo Correio, garantindo que o Google continuará a procurar parcerias com os media.

Atualmente, a União Europeia está a preparar legislação comunitária para fixar um valor a cobrar pelos media às Big tech pelo uso de conteúdos nas suas plataformas. Em Portugal, o Governo também está a trabalhar nesse sentido, pretendendo aplicar novas regras ainda este ano, relembraram ainda Francisco Pedro Balsemão e Luís Cunha Velho.

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