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Lesados do BES vão exigir indemnização a Salgado e ex-gestores

Pedido cível por danos morais tem na mira 1,8 mil milhões de euros de bens arrestados a Ricardo Salgado e ex-gestores. Ação dá entrada após acusação.
17 Abril 2020, 11h45

Os lesados do BES/GES que investiram em papel comercial, obrigações e até em ações estão a preparar um pedido de indemnização milionária contra o ex-presidente do banco, Ricardo Salgado, e todos os ex-administradores arguidos no processo-crime do Universo Espírito Santo, cuja acusação deverá ser deduzida até junho. Pedido cível por danos morais tem na mira os bens arrestados pela Justiça ao ex-presidente do banco e antigos gestores do grupo num total de 1,8 mil milhões de euros entre numerário e aplicações financeiras, imóveis, veículos automóveis, o recheio de casas e obras de arte, que ficaram à guarda do processo para garantir futuras indemnizações.

“Em geral, todos os lesados estão receptivos a participar neste processo, cuja indemnização por danos morais será certamente superior ao valor das perdas que não foram pagas. O valor será provavelmente astronómico, pois trata-se de um leque alargado de lesados que vão participar neste processo-crime, abrangendo investimentos em papel comercial, obrigações e ações”, revelou ao Jornal Económico o presidente AMELP (Associação Movimento Emigrantes Lesados Portugueses) que tem 700 associados.

Luís Marques dá conta de que “este processo é alargado a outras associações de lesados do BES/GES” como, exemplifica, as que representam os lesados das sucursais exteriores do BES na Venezuela e África do Sul (ALEV) e os lesados do Banque Privée, representados pela ABESD. Deverão inda aderir os lesados do papel comercial do BES/GES, nomeadamente parte dos 2.000 que aderiram ao fundo de recuperação de créditos que permitirá recuperarem entre 50% e 75% do dinheiro aplicado em dívida das empresas insolventes do grupo, num montante total de 286 milhões de euros face às perdas de 490 milhões (com juros).

Luís Marques avança ainda que neste sábado, 18 de abril, vai realiza-se uma reunião por videoconferência onde “este será um dos temas a discutir”, acrescentando que vão ser realizadas reuniões periódicas para “evoluir até à acusação” do processo Universo Espírito Santo, que deverá ser deduzida até junho contra Salgado e outros ex-administradores do GES. Os lesados terão, então, o prazo de 20 dias, após a acusação, para exigirem tal indemnização no âmbito do chamado caso BES, que investiga as acções que levaram à falência do banco, no verão de 2014.

Também Sara Freitas, presidente da ALEV que reúne 394 lesados, revela estar “optimista” com a ação judicial que dará entrada nos tribunais, defendendo que “os lesados têm direitos sobre os bens arrestados”. “A intenção é que todos adiram a este processo. Fomos prejudicados e, além de termos perdido as nossas poupanças, a nossa situação na Venezuela é muito grave”.

Direito criminal é irrenunciável
O presidente da AMELP explica que o direito a avançar com pedido de indemnização por danos morais – no decorrer de um processo-crime tem várias vantagens. Desde logo, explica, “estes direitos são da própria pessoa e são irrenunciáveis”. Mais: a indemnização por danos morais acresce a qualquer indemnização que venham a conseguir judicialmente ou através da comissão liquidatária do BES. Outra vantagem é a possibilidade de ser pedida por pessoa e não por conta, pois “não são as contas que têm danos morais. São as pessoas”. Logo, por exemplo, para uma conta com quatro titulares, haverá quatro pedidos de indemnização, o que elevará o valor global a reclamar que poderá individualmente ascender a 50 mil euros, acima da média de 20 mil euros de indemnizações pagas nos tribunais portugueses.

Académicos avaliam dano moral
Desde 2015 que os lesados pensavam “atacar” os bens arrestados pela Justiça. Mas só agora com a acusação do MP, os lesados podem tornar-se “demandantes cíveis”, estando já organizados e com uma equipa jurídica a trabalhar na fundamentação do pedido. Um dos trabalhos em curso é relativo à prova de cada um dos lesados – sustentada em danos não patrimoniais. A equipa jurídica esta a trabalhar com uma entidade terceira (equipa académica) naquilo a que chamam “mensurabilidade do dano não patrimonial, caso acaso, de forma concreta, nas fraudes impostas aos clientes do BES”.

Uma tentativa de medir o dano relativamente a cada pessoa para auxiliar o Juiz no cálculo da indemnização a reclamar no âmbito do mega processo que conta com 41 arguidos (33 cidadãos nacionais e estrangeiros e oito pessoas coletivas) e que deverá ultrapassar as 4.083 páginas da acusação da Operação Marquês.

Milhões de euros arrestados
Ricardo Salgado é a face central deste processo que investiga da prática de vários crimes: burla qualificada, falsificação de documento, falsidade informática, fraude fiscal, infidelidade, abuso de confiança, branqueamento e corrupção no sector privado. Amílcar Morais Pires, ex-braço direito do antigo presidente executivo do BES e José Manuel Espírito Santo, ex-administrador do BES, são outros arguidos.

Trata-se de um processo-crime com vários apensos, à ordem do qual foram arrestados 1,8 mil milhões de euros para que servisse de garantia de ressarcimento aos eventuais lesados do processo sobre a falência do GES e a queda do BES. A justiça arrestou mais de 500 bens de Ricardo Salgado e família Espírito Santo como casas de luxo, a capela junto à casa do ex-banqueiro e a Herdade da Comporta. O arresto estendeu-se a propriedades do GES e de alguns dos seus administradores, num total de 477 imóveis, 11 automóveis, o recheio de seis casas, incluindo 143 obras de arte.

Artigo publicado na edição nº2037, de 17 de abril, do Jornal Económico

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