O Presidente da República considera que “a sociedade portuguesa estabilizou” no que respeita ao quadro legal sobre o aborto, embora haja setores que se mantêm contra a despenalização da interrupção voluntária da gravidez.
Numa entrevista ao programa da rede de televisão brasileira Globo “Conversa com Bial”, transmitida na segunda-feira à noite, o jornalista e apresentador Pedro Bial pergunta-lhe se a atual lei, que permite a interrupção da gravidez por opção da mulher até às 10 semanas, está a funcionar e vai manter-se.
“Neste momento, a sociedade portuguesa estabilizou nessa matéria, havendo embora setores que continuam a defender o ‘não’. Mas digamos que não é um ponto que tenha estado agora polémico na agenda política nestes últimos quase quatro anos”, responde Marcelo Rebelo de Sousa.
Antes, o chefe de Estado fala sobre a sua participação nas campanhas pelo “não” à despenalização do aborto, nos referendos de 1998 e de 2007, e sobre a mudança da legislação na sequência da vitória do “sim” na última consulta popular.
“Houve um referendo primeiro, houve um referendo dez anos depois. É facto que, por razões de princípio ético religioso, eu tive reservas e fui pelo ‘não’ em ambos os referendos. Num referendo com sucesso, noutro referendo sem sucesso”, refere.
No seu entender, a alteração legal após o referendo de 2007 constituiu “uma mutação significativa em termos de generalização” da interrupção voluntária da gravidez em Portugal, porque “havia uma lei já permitindo o aborto para algumas situações precisas, respeitantes a casos mais extremos de saúde da mãe ou da criança, do nascituro, ou então em caso de violação”.
Nesta entrevista, Marcelo Rebelo de Sousa comenta também a legalização da ‘cannabis’ para fins medicinais, dizendo que “em Portugal surgiram projetos nesse sentido, mas se entendeu, prudentemente, que era bom experimentar este passo que é um passo essencialmente de saúde pública, e não confundir com lazer”.
“E essa fronteira foi a fronteira que levou o parlamento a votar uma e a rejeitar a outra e a ir ensaiar uma. Foi esse o mérito, penso eu, da nossa política de droga, na toxicodependência, que é: fazer sempre por um processo experimental, gradual e com grande rigor científico e técnico. Isso deu certo”, defende.
Nesta conversa gravada há cerca de dois meses e meio, no Palácio de Belém, em Lisboa, o Presidente da República fala pausadamente, com um leve sotaque brasileiro, e recorda o seu breve encontro com o Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, em janeiro, em Brasília, à saída do qual “até disse que tinha sido um encontro entre irmãos”.
“Não imagina, a esquerda portuguesa me ia comendo vivo”, relata, explicando que utilizou essa expressão não por os dois pensarem o mesmo, mas porque brasileiros e portugueses são “povos irmãos”.
Marcelo Rebelo de Sousa escusa-se a falar sobre a política brasileira, mas perante uma comparação entre o seu estilo e o de líderes como Bolsonaro ou o Presidente norte-americano, Donald Trump, traça diferenças face aos “chamados populistas” que “querem mais rutura do que reforma”, definindo-se como “um reformista” que não quer destruir o sistema.
“Uma coisa é estar próximo do povo, mas estar mesmo – não é falar que se ama o povo, é ir passar a noite com sem-abrigo, é estar com o idoso, é estar com o pobre, não é falar no pobre”, acrescenta.
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