Os europeus poupam elevadas quantias de dinheiro, mas estão a perder o valor da sua riqueza porque não têm oportunidades de investimento adequadas. De acordo com a Comissão Europeia, a conclusão da União dos Mercados de Capitais pode mudar esse estado de coisas. Uma reforma que carece de implementação harmonizada — garantindo que as regras são interpretadas de forma coerente em toda a União Europeia. É esse o seu maior desafio, nas mãos da comissária portuguesa Maria Luís Albuquerque. Entrevistada pelo jornal húngaro ‘Portfolio’, a ex-ministra das Finanças, a Comissária Europeia para os Serviços Financeiros e a União de Poupança e Investimento diz acreditar que o capital não tem nacionalidade e que, se a Europa criar um mercado de capitais mais eficiente, o dinheiro permanecerá na Europa e, em última análise, beneficiará os cidadãos. Os incentivos fiscais propostos destinam-se exclusivamente a pequenos investidores, enquanto as instituições financeiras serão impulsionadas pela concorrência no mercado.
Uma reforma pensada há muito, mas que demorou ‘eternidades’ a chegar à fase de concretização. Mas “desta vez estamos a aplicar uma abordagem muito mais abrangente, não estamos concentrados apenas nos mercados de capitais. O que queremos criar é um ecossistema financeiro completo que funcione para todos”, referiu. “O nosso objetivo é também concluir a União Bancária e criar mercados de capitais que ofereçam melhores oportunidades de investimento, tanto para os aforradores como para as empresas que procuram financiamento. A União dos Mercados de Capitais é parte integrante da União da Poupança e do Investimento. É por isso que estamos a trabalhar simultaneamente na conclusão da União Bancária, colocando simultaneamente os cidadãos europeus no centro da nossa estratégia”.
É dessa forma que, espera Maria Luís Albuquerque, o dinheiro europeu que está a ser investido nos Estados Unidos passará a ficar na Europa e a aí gerar riqueza: “se desenvolvermos os nossos mercados e os tornarmos maiores e mais atrativos, as pessoas estarão mais inclinadas a manter o seu dinheiro na Europa. Isso não só aumentaria a sua riqueza pessoal, como também contribuiria para o crescimento económico da Europa – criando melhores empregos e salários mais elevados”.
“Não estamos a tentar criar uma única autoridade de supervisão ou uma única bolsa de valores. Esse não é o objetivo. Mas no sistema atual, o nosso dinheiro é mantido em 27 bolsos diferentes e não podemos aproveitar os benefícios de reunir os nossos recursos. Precisamos de desmantelar as barreiras que impedem isso. Trata-se de integração”, adiantou a comissária. Luís Albuquerque chamou a atenção para o facto de “as diferenças na legislação em matéria de insolvência ou na tributação também complicam o quadro. Não estou a dizer que tudo deve ser harmonizado – mas um certo grau de convergência é necessário para realizar todo o potencial do mercado europeu. Um quadro jurídico único e opcional – que é o que o 28º regime – resolveria grande parte do problema”.
“Neste contexto, é importante reconhecer que os nossos concorrentes não são outros europeus – nem húngaros, portugueses ou alemães – mas países fora da UE, como os Estados Unidos e a China. A competição é global”, disse, sabendo que “o maior problema (das empresas) não é abrir o capital, mas sim o excesso de regulamentação, o que torna impossível obter um lucro decente na EU. Se quisermos competir com os EUA ou a China, precisamos de competir como europeus”, e não como 27 economias a evoluir em paralelo. Mas a comissária sabe que isso vai contra “a natureza humana”, que não gosta de perder o controlo que tem em mãos. De qualquer modo, “o que defendo não é a centralização. Francamente, não acho que isso funcionaria. A UE é demasiado diversificada, tal como os nossos mercados de capitais. O que eu quero é que a mesma pergunta receba a mesma resposta, não importa onde seja feita. Isso é o que quero dizer com supervisão única – não necessariamente um único supervisor. Essas são duas coisas diferentes. As regras deveriam ser as mesmas, mas, na prática, são interpretadas e aplicadas de forma diferente entre os Estados-membros. O nosso objetivo é que os procedimentos sejam os mesmos em Budapeste, Lisboa ou Vílnius. Quem faz a supervisão é secundário – o que importa é que o resultado seja consistente. Isso também cria confiança entre os supervisores”.
Mas, dada a complexidade do processo, Maria Luís Albuquerque não se compromete com datas: não é realista definir um prazo final. Estamos a falar de uma transformação enorme e complexa”. Mas é essencial: afinal, há 11 triliões de euros nos cofres da banca à espera do novo sistema. “Se pudéssemos mobilizar apenas uma pequena parte para os mercados de capitais, isso tornaria a economia europeia significativamente mais competitiva”.
Para a ex-ministra portuguesa, é preciso tornar a Europa atrativa em relação à concorrência, desde logo dos Estados Unidos: “se oferecermos vantagens fiscais para certos produtos de investimento, isso por si só pode torná-los mais atraentes. Isto faz parte da recomendação que faremos em relação às novas contas de poupança e investimento. As pessoas prestarão atenção se virem que vale a pena tentar”. “O objetivo não é dizer às pessoas o que fazer com seu dinheiro. O objetivo é garantir que eles tenham opções – oportunidades reais e incentivos significativos. Uma vez que os tenham, a escolha é delas”.
Numa entrevista assinada por Szabó Dániel, a comissária disse ainda que “estamos a trabalhar noutras iniciativas. Uma delas é a Estratégia de Investimento de Retalho, que está atualmente em negociações tripartidas a nível da UE. Faz parte de um pacote de reforma mais amplo, que visa ajudar as pessoas a sentirem-se mais confiantes e capacitadas para participar nos mercados de capitais. E se alguém ainda optar por manter todas as suas economias num depósito bancário – tudo bem também. É o dinheiro deles. A questão é: deixe-os escolher”.
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