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Marisa Matias sobre nova diretiva dos direitos de autor: “Não é o fim da Internet. É o fim da liberdade”

”Opus-me à votação do Artigo 13º em julho, e voltei a opôr-me em setembro”, declarou a eurodeputada do Bloco de Esquerda numa video-chamada durante um encontro, em Lisboa, sobre a Reforma Europeia do Direito de Autor e o Interesse Público.
5 Dezembro 2018, 10h53

A deputada do Bloco de Esquerda (BE) Marisa Matias considera que a nova diretiva europeia referente aos direitos de autor “é muito perigosa”, por criar problemas em vez de os resolver.

As declarações da deputada bloquista foram proferidas durante o encontro sobre a “Reforma Europeia do Direito de Autor e o Interesse Público”, que se realizou esta segunda feira, na Biblioteca Nacional de Portugal (BNP). O tema principal em debate neste encontro não fugiu muito àquilo que tem sido o tópico de discussão não só entre YouTubers, como também utilizadores da grande web nos últimos dias: os Artigos 11º e 13º.

Marisa Matias, a partir de uma vídeo-chamada, vincou a sua oposição às novas diretivas, explicando que os artigos 11º e 13º ”promovem a censura naquilo que consideramos ser um espaço de liberdade”. ”Como as plataformas e as redes sociais não querem ser responsabilizadas por deixar passar conteúdos protegidos, o que fazem é apertar cada vez mais a circulação livre, ao ponto de não incluir conteúdo de terceiros. É um ataque aquilo que são os direitos dos utilizadores. Somos todos vítimas”, disse.

O artigo 13º limita a possibilidade de se publicar conteúdos em plataformas como redes sociais porque as obriga a utilizar filtros de upload que consigam destrinçar entre conteúdos legais e não legais. Por exemplo, ao abrigo deste artigo, uma qualquer entidade pode proibir a utilização de uma imagem ou de um clip de vídeo para a criação de um ‘meme’ e as plataformas têm de impedir automaticamente a publicação desse conteúdo modificado.

”Quem defende esta legislação e artigo diz muitas vezes que os filtros sempre existiram (…). E até pode ser verdade, mas é preciso dizer que os filtros não eram legitimados como foram aprovados pelo Parlamento Europeu. É importante reter que, por lei, há proteção dos direitos de autor. A introdução deste artigo apenas legitimou a utilização de filtros de forma massiva”, explicou a deputada do BE.

No fundo, este artigo vem beneficiar criadores, autores, artistas criativos, cujo material é partilhado sem autorização. Com isto, há quem entenda que exista uma possível batalha entre navegadores e criadores de conteúdo já que estes não recebem créditos merecidos quando é feita a partilha não autorizada de material protegido. Aos olhos de Marisa Matias, esta proteção ”é frágil” e que na realidade esta nova diretiva só protege a industria.

”Opus-me à votação do Artigo 13º em julho, e voltei a opor-me em setembro.”, declarou a deputada ”Vou manter-me sempre contra esta legitimação porque a Comissão Europeia aproveitou esta oportunidade para legitimar a censura (…). Não é o fim da Internet. É o fim da liberdade sobre a capa de proteção dos direitos de autor”, assegurou, no mesmo vídeo.

A aderir à onda de críticas deste artigo, e também presente no auditório da BNP, veio o professor da Universidade Católica Tito Rendas, que após uma breve explicação da complexidade jurídica que integram em ambas as diretivas, afirmou-se totalmente contra este artigo, “na sua forma e substância”, que considerou “carecer da mais elementar clareza jurídica”.

A Associação Defesa dos Direitos Digitais – D3 também marcou presença e subscreveu aquilo que, até então, tinha sido discutido: ”A legislação dos direitos de autor tem impacto nas várias áreas. Por mais justificações de boas intenções que sejam feitas, os fins não justificam os meios”, explicou o dirigente da associação, Eduardo Santos.

Helena Martins do Conselho, do departamento de Políticas Públicas da Google Portugal, afirma que a gigante ”apoia os princípios do artigo 13º”, mas não o artigo na sua íntegra. ”Acreditamos que os direitos de autor precisam de ser protegidos e justamente remunerados. Queremos promover um ecossistema criativo mais seguro”. Referiu a existência da ferramenta implementada no YouTube chamada de  ”Content ID”, que protege os criadores de qualquer upload feito por terceiros com conteúdo com direitos de autor não autorizado. ”O Content ID não é um filtro, apenas ajuda os criadores a gerirem melhor o seu conteúdo através de uma biblioteca criada por eles próprios”, explicou.

No próximo dia 12 de dezembro, às 16.30 horas, está marcada uma manifestação contra o artigo 13.º, em Lisboa, na Praça da Figueira. De acordo com o comunicado enviado à agência Lusa pela organização, este é “um protesto contra uma artigo que vai contra os ideais de liberdade e de livre circulação da Internet, mas também da própria União Europeia”. “Os atuais mecanismos existentes nas plataformas como ‘YouTube’, ‘Facebook’, ‘Instagram’, etc., já protegem os direitos de autor, não sendo possível lucrar com conteúdo de outros”, afirma a organização.

Do debate em Bruxelas aos YouTubers

Esta reforma legislativa sobre os direitos de autor para o mercado único digital está a ser discutida desde 2016, mas foi em setembro deste ano que o Parlamento Europeu votou a favor da proposta, à qual 438 deputados deram luz verde. O texto final da nova diretiva será avaliado em janeiro de 2019, e poderá ainda sofrer alterações, o que não impediu que o pânico e a discussão aumentassem. A causa disso deve-se ao youtuber português Wuant, que publicou um vídeo onde afirmava que, caso esta lei seja aprovada, o seu canal na plataforma iria desaparecer.

A Comissão Europeia já respondeu ao vídeo, que entretanto se tornou viral, e assegurou a todos os YouTubers que nenhum canal nessa plataforma iria desaparecer. ”Caros YouTubers, os vossos vídeos não vão ser apagados e a vossa liberdade de expressão não vai ser limitada. O artigo 13º não se dirige a youtubers e não vai afetar os vossos canais,” explica a carta enviada pelos responsáveis de Bruxelas.

Apesar de ter sido assegurado que estes criadores de vídeos online iriam sair ilesos desta nova diretiva, o mesmo não se pode dizer dos utilizadores das grandes plataformas como Facebook, Instagram ou Twitter que se confrotam com os possíveis ‘filtros de upload’. Ou seja, filtros que restringim a partilha de conteúdos protegidos por direitos de autor.

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