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Marques Mendes sobre Novo Banco: “Se Centeno queria uma auditoria era no início não era no meio do processo”

No comentário de hoje, Marques Mendes disse que o Novo Banco era um buraco sem fundo, mas que “se calhar” não havia alternativa à venda ao Lone Star nestes moldes. Defendeu ainda que a lei não dá poderes à ASF para avaliar Tomás Correia e por fim disse que um Governo minoritário de Costa, se a economia continuar a piorar, só vai durar dois anos.
3 Março 2019, 22h21

“O Novo Banco é um buraco sem fundo e os portugueses têm todas as razões para se indignarem”, disse Luís Marques Mendes, no seu habitual comentário da SIC.

“Até pode ser tudo legal, mas é errado do ponto de vista moral”, afirmou o comentador.

Em primeiro lugar, este volume de prejuízos, que Marques Mendes apelidou de “buracão monumental” é ainda o legado do BES do tempo de Ricardo Salgado. “Cinco anos depois continua a dar prejuízos brutais”, disse, adiantando que “o Banco, sem o legado, até deu um pequeno lucro”, parafraseando António Ramalho na apresentação de resultados.

A segunda questão é por que é que o Fundo de Resolução continua a meter dinheiro no Banco, já depois de o Novo Banco ter sido vendido? “O problema foi criado há dois anos quando foi feito o contrato de compra e venda, que o Banco de Portugal negociou e Mário Centeno aprovou, altura em que foi criada uma almofada de 3,89 mil milhões de euros para compensar perdas em determinados créditos problemáticos herdados”, disse o comentador referindo-se ao  Mecanismo de Capital Contingente do Fundo de Resolução.

“E aqui é que está a enorme imoralidade. Pois com esta ‘almofada’ o dono do banco em vez de tentar cobrar aqueles créditos vai buscar o dinheiro fácil”, disse.

“Mário Centeno não falou a verdade às pessoas há dois anos”, acusou Marques Mendes. Mas, admitiu “não sei se havia alternativa”. Porque “só houve um interessado na compra. E quem negoceia só com um interessado não tem grande força negocial”, disse.

“Depois, a alternativa – a nacionalização – poderia ser igual ou pior. Basta ver o exemplo da nacionalização do BPN”, admitiu ainda.

Isto tudo para concluir que “ou se negociava o contrato de outra maneira ou se contava a verdade aos portugueses”.

“O Ministro das Finanças não falou verdade, criou a expectativa de que aquela almofada provavelmente não seria utilizada. Nunca o devia ter feito. Enganou os portugueses”, considerou.

“Auditoria é uma manobra política para desviar as atenções desta incomodidade”, disse Marques Mendes. “Se queria uma auditoria era no início não era no meio do processo”, atalhou o comentador.

O Ministro das Finanças mandou agora fazer uma auditoria à concessão dos créditos que estão sob o mecanismo de capital contingente.”Eu acho bem fazer a auditoria, acho sempre bem”, disse. “Agora é uma manobra política porque Mário Centeno já sabia que ia haver este buraco, pois já tinha posto uma verba no Orçamento de Estado de 850 milhões”, disse.

“Quando há dois anos fez o contrato de venda o Estado criou, e está em funcionamento, uma Comissão de Acompanhamento, composta por três pessoas, para acompanhar os ativos que estão sob alçada do Fundo de Resolução”, disse Marques Mendes que acha que a auditoria é para fazer a mesma coisa que faz a comissão de acompanhamento.

“Finalmente, uma pergunta: estão passados quase 5 anos depois da falência do BES. Um buracão monumental que ainda hoje estamos a pagar. A investigação criminal a Ricardo Salgado ainda não acabou. Será que tudo vai acabar na gaveta?”, questionou Marques Mendes.

Marques Mendes comentou ainda a entrevista do ex-banqueiro Ricardo Salgado à TSF e ao DN. “Para Ricardo Salgado a culpa é da Resolução pela criação dos lesados, é de Passos Coelho, do Banco de Portugal, nunca é dele, acho que lhe ficava bem a humildade de um pedido de desculpas”, disse.

Idoneidade de Tomás Correia, a ASF tem razão

“Há uma semana sublinhei que era grave que ninguém – Governo ou Regulador dos Seguros – decidisse sobre a idoneidade de Tomás Correia para presidir à Associação Mutualista Montepio Geral”, lembrou.

O Governo diz que a competência é do Regulador; o Regulador diz que a lei não lhe dá esse competência.

“Estive a aprofundar o assunto, ouvi os argumentos de ambas as partes, li a lei e cheguei a uma conclusão: o Regulador dos Seguros tem toda a razão. A lei atual não lhe dá o poder de decidir sobre a idoneidade de Tomás Correia”, referiu Marques Mendes.

Tudo porque foi criado um regime transitório para a supervisão, portanto só daqui a 12 anos é que o supervisor dos seguros terá o poder total.  Neste regime transitório foi dado à ASF o poder de “analisar o sistema de governação da Mutualista, a verdade é que é analisar não é decidir”. Se a ASF decidisse alguma coisa nestes termos era facilmente anulada em tribunal, explicou.

Nos poderes que tem a ASF, neste período transitório, não está o poder de decidir sobre a idoneidade de administradores. “Até admito que o Governo tenha tido a intenção, mas o que está escrito não corresponde ao espírito do Governo”, disse.

“O que pode ser feito é facílimo”, disse o comentador que é advogado de profissão.

“Tenho o Ministro na conta de uma pessoa séria, bem intencionada e de boa-fé”, disse o comentador que deixou a seguir uma sugestão ao Ministro Vieira da Silva: “fazer uma pequeníssima alteração ao Código das Associação Mutualistas conferindo expressamente o poder de avaliar a idoneidade dos gestores ao Regulador dos Seguros. É uma pequena alteração ao decreto lei do Governo. São, na prática, duas linhas de texto”, disse adiantando que “se não se fizer, então há gato escondido com o rabo de fora”.

Sobre as negociações com os professores disse que “não vão dar em nada”. “O Governo não quer dar nada mais do que deu no Decreto Lei vetado. Os sindicatos não querem baixar dos nove anos que reclamam”, portanto não vai dar em nada.  “São ambos inflexíveis”.

Marques Mendes disse ainda que repor o tempo de carreira na totalidade aos professores é um privilégio que nenhum grupo em Portugal teve. “Vejamos: milhares de pensionistas tiveram cortes nas suas reformas e não foram compensados pelo tempo dos cortes; milhares de pessoas desempregados passaram anos de sacrifício, sem emprego, não foram compensados por esse período difícil; milhares de jovens tiveram que emigrar e não tiveram qualquer compensação, ou seja, se lhes fosse reconhecido todo o tempo em que a carreira esteve congelada, os professores teriam um privilégio que nenhum grupo profissional teve, por isso, deveriam ser mais flexíveis na negociação”.

Sobre a contestação dos enfermeiros, e depois de o tribunal ter dado razão ao Governo na questão da requisição civil, o comentador diz que “pode haver um acordo ainda que minimalista, porque os sindicatos estão interessados e o Governo está interessado em ter paz no setor”.

O Governo está preocupado com as críticas e contestação no setor da saúde, disse ainda. “O Governo está tão preocupado com esse setor, que na semana a seguir à semana do Carnaval, vai fazer um roteiro sobre a saúde. Uma espécie de governação aberta pelo país dedicada exclusivamente à saúde para mostrar obra”, desvendou Marques Mendes.

A verdade é que hoje o setor está muito vulnerável. Este é um dos grandes calcanhares de Aquiles do Governo.

António Costa vai ao programa de Cristina Ferreira na SIC, na terça-feira, lembrou Marques Mendes.

Sobre a economia, Marques Mendes fala das nuvens no horizonte. Agora, já não são apenas previsões, mas sim resultados.

Os dados relativos ao crescimento económico de 2018, divulgados pelo INE, mostram que a economia cresceu 2,1%, abaixo dos 2,3% previstos pelo Governo e bem abaixo dos 2,8% de 2017. “Os vários motores do PIB estão a arrefecer”, disse o comentador.
O crescimento das exportações abrandou – de 7,8% em 2017 para 3,7% em 2018. O mesmo no investimento, que também abrandou – de 9,2% em 2017 para 5,6% em 2018. E a tendência deve manter-se. Só o consumo privado melhorou, mas pouco, de 2,3% para 2,5% em 2018.
Isto demonstra que a situação económica em Portugal está a arrefecer. E há vários riscos internacionais no horizonte.

Factores de risco: “A incerteza, os investidores não gostam de incerteza”, disse ainda. “Por exemplo o fracasso da Cimeira EUA/Coreia do Norte; o risco da instabilidade, de que o conflito militar entre a Índia e o Paquistão é um perigoso exemplo; o  risco das guerras comerciais, como conflito comercial entre os EUA e a China, embora eu ache que na próxima cimeira vai haver um acordo porque os EUA não podem arriscar a falhar duas cimeiras seguidas; e finalmente o risco do Brexit desordenado (embora a boa notícia é que pode haver um acordo sobre o Brexit, porque os deputados que querem um Brexit radical estão a aproximar-se de Theresa May porque têm medo de um adiamento, medo de um segundo referendo e que este altere a votação do primeiro)”.

Outro tema abordado, o Bloco de Esquerda fez este ano 20 anos “sem peso no mundo sindical e sem peso no mundo autárquico, tem apenas peso na comunicação social e teve o mérito de unir a extrema esquerda”, disse o comentador da SIC.

O Bloco quer ir para o Governo com o PS, mas, segundo Marques Mendes, “não vai conseguir esse objetivo, porque António Costa não tem grande simpatia pelo BE, e não o vai levar para o Governo a seguir 2019, mais depressa levaria o PCP”.

“Mesmo que o PS não tenha maioria absoluta, acho que vai formar um Governo minoritário, vai fazer acordos de geometria variável no Parlamento, e corre o risco de só durar dois anos, dependendo da evolução da economia”, concluiu.

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