O primeiro-ministro Luís Montenegro anunciou esta quarta-feira que o Governo vai apresentar uma moção de confiança na sequência da crise política desencadeada pela polémica relacionada com a empresa que criou e que agora passou totalmente para os filhos. O anúncio foi feito na intervenção inicial no debate da moção de censura do PCP. Para o responsável máximo da Aliança Democrática, o país precisa de uma “clarificação política” e é “este o momento”. “Mais vale dois meses de suspensão da estabilidade política” do que um ano de “degradação e paralisia”, disse.
“Não nos furtamos ao escrutínio em todos os domínios, levamos a transparência onde ninguém a tinha levado antes, aplicamos a nós próprios o que os responsáveis das oposições nunca aplicaram a eles mesmos. Não estamos disponíveis para aqui estar na atmosfera das intrigas permanentes que só têm um objetivo: a degradação da vida política e governativa”, afirmou o primeiro-ministro, dizendo que o país não “pode ficar prisioneiro do egoísmo e do taticismo” da oposição.
“Este Governo e este primeiro-ministro não são da escola da confusão e da politiquice, são da escola do reformismo e da estabilidade. Por isso, não ficando claro que o Parlamento dá todas as condições ao Governo, avançaremos para a última oportunidade de o fazer: a aprovação de um voto de confiança”, anunciou o primeiro-ministro. “Se o Parlamento não legitima o Governo, terá de ser o povo a dizer aos seus representantes o que quer para o seu futuro”.
Assinalando que a convocação de eleições antecipadas “não é desejável”, Montenegro disse que será um “mal necessário para evitar a degradação das instituições e a perda da estabilidade política por vontade de alguns agitadores” E “se os partidos da oposição não assumem a legitimidade política para governar, mais vale dois meses de suspensão da estabilidade política, do que um ano de degradação e paralisia”, argumentou Montenegro.
Para o primeiro-ministro, que responde pela segunda vez em menos de duas semanas a uma moção de censura no Parlamento, “não podem persistir dúvidas sobre se o Governo dispõe de condições para continuar a executar o seu programa”. “O país precisa de clarificação política e este é o momento”, acentuou agora, depois de ter deixado no ar a possibilidade de avançar com uma moção de confiança na declaração que fez ao país no último sábado, iniciativa que ‘esfriou’ depois de o PCP ter avançado com uma moção de censura na resposta ao repto de Montenegro.
Num ataque cerrado ao PS, partido que anunciou uma comissão parlamentar de inquérito, Montenegro atirou que “seria inaceitável, porque contrário ao interesse nacional, que um partido político reiteradamente inviabilizasse moções de censura e depois continuasse a alimentar um clima de suspeição” e que o fizesse “com a intenção declarada de desgastar o Governo e o primeiro-ministro”, obtendo com isso “dividendos pessoais”.
Continuando o ataque aos socialistas, que acusa de não quererem ir a eleições agora, Montenegro declarou que os portugueses “não querem jogos de bastidores, truques de retórica e processos de degradação sujos e lentos”. “Tenho noção que as pessoas em casa estão incrédulas, mas pela minha parte quero assegurar-lhes que estamos sempre focados nas suas vidas e no seu futuro”, frisou, acrescentando que, no momento da clarificação, “cada um assumirá a sua responsabilidade”.
Uma semana e meia depois da censura chumbada do Chega, o Parlamento debateu esta quarta-feira uma moção de censura ao Governo apresentada pelo PCP, iniciativa que tem apenas os votos a favor dos comunistas e do Bloco de Esquerda e a abstenção do PS. Paulo Raimundo, secretário-geral do PCP, abriu o debate defendendo que é preciso “travar o caminho de desastre” das políticas do Governo e “credibilizar a política nacional”.
Para os comunistas, os casos que envolvem o Executivo e o primeiro-ministro “não são obra do acaso”. “Que o Governo está ao serviço dos interesses económicos, já o sabíamos”, apontou, falando na “mistura de interesses políticos e pessoais”. Mas nada do que o primeiro-ministro possa dizer agora sobre a polémica em que está envolvido, entende o PCP, “alterará os factos”: o Governo “não tem condições para se manter em funções”, porque a sua política “não só não resolve os problemas do país, como os agrava”.
De recordar que uma moção de confiança ao Governo será chumbada, uma vez que o PS deixou claro, durante o debate da moção de censura do Chega, o seu voto contra. E em caso de eleições, antecipou já Hugo Soares, líder da bancada parlamentar do PSD, Luís Montenegro apresentar-se-á a votos. Resta saber o que fará o Presidente da República perante o chumbo da confiança ao Governo: nomeará um novo primeiro-ministro ou dissolve o Parlamento e convoca eleições antecipadas, as terceiras em apenas três anos? Marcelo Rebelo de Sousa deverá pronunciar-se sobre a crise política depois do debate no Parlamento, pelas 18h30.
Esta crise política acontece numa altura em que as relações Belém e São Bento não se mostram particularmente saudáveis. Perante a polémica relacionada com a avença de 4.500 euros pagas pela Solverde à sua empresa familiar, Montenegro convocou um Conselho de Ministros extraordinários e agendou uma comunicação ao país para dar conta da avaliação “profunda” das suas condições políticas e pessoais. Mas só ligou ao chefe de Estado depois da declaração feita. Mas para Marcelo esse telefonema ocorreu já tarde. “Podia ouvir a minha opinião”, lamentaria depois Marcelo.
Os dois tiveram um encontro, na tarde de terça-feira, no Palácio de Belém.
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