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Não mexe: BCE deverá manter juros com França debaixo de pressão

BCE deve manter taxas inalteradas, apesar de a segunda maior economia do euro estar sob pressão. Frankfurt vai atuar no mercado da dívida para ajudar a Gália? Para já, deverá evitar atuar, mas se pressão subir nos mercados poderá ter de agir.
epa12258710 European Central Bank (ECB) President Christine Lagarde addresses a press conference following the meeting of the ECB Governing Council in Frankfurt am Main, Germany, 24 July 2025. EPA/RONALD WITTEK
11 Setembro 2025, 07h00

O Banco Central Europeu (BCE) deverá deixar as taxas de juro inalteradas na reunião de hoje. A reunião tem lugar num momento em que a segunda maior economia da zona euro está debaixo de foco dos mercados devido à instabilidade política e à fraca perspetiva económica e financeira, com a dívida a escalar e o défice fora de controlo. Ao mesmo tempo, as tarifas de Donald Trump já fazem efeito na economia da zona euro e Bruxelas.

A larga maioria dos economistas inquiridos pela “Reuters” consideram que o BCE vai manter intactas as taxas pelo segundo encontro consecutivo. O BCE cortou a taxa de depósitos em 200 pontos base no espaço de 12 meses até à reunião de junho.

Quase 60% dos inquiridos consideram que o BCE vai manter as taxas inalteradas para o resto do ano. Uma ligeira maioria vê a taxa a ficar nos 2% ou mais alta até ao final de 2026.

A zona euro deverá crescer 1,2% este ano e 1,1% no próximo, podendo subir para os 1,4% em 2027.

A maior economia europeia contraiu 0,3% no segundo trimestre em consequência dos efeitos tarifários de Trump.

Por sua vez, Luke Bartholomew da Aberdeen Investments, considera que o mais certo é o BCE manter as taxas intactas, com os investidores a procurar os “sinais” para o caminho futuro e como é que Frankfurt pode vir a agir perante a situação política em França.

Sobre França, o analista aponta para o risco de haver um sell-off de obrigações gaulesas à boleia da incerteza política e orçamental. “Isto representaria um apertar material das condições financeiras da zona euro e provavelmente encorajaria mais cortes dos juros. Mas uma intervenção mais direta do BCE para apoiar a dívida francesa nos mercados é improvável de acontecer, dadas as restrições em vigor nas várias ferramentas de liquidez do BCE e o seu desejo de evitar envolver-se em questões políticas”.

Mas se a situação agudizar, a intransigência do BCE poderá tornar-se “insustentável, dada a importância sistémica de França. Por agora, ainda estamos longe”.

Já Mauro Valle da Generali Investments considera que, se França falhar em aprovar um Orçamento do Estado para 2026, “a pressão para Macron demitir-se vai aumentar, potencialmente levando a uma crise constitucional que pode expor as obrigações a maior volatilidade”.

Os spreads da dívida francesa podem manter-se nos 80 pontos base, mas em caso de corte no rating, a par de mais incerteza política, existe o risco de subirem para 100 pontos base, superando até os italianos.

Para Michael Krautzberger da Allianz GI, “com a inflação em torno do objetivo e o crescimento próximo da tendência, acreditamos que o BCE deverá reiterar que a sua postura monetária se mantém “adequada”. Isto implica um padrão elevado para qualquer alteração de direção na política monetária. No entanto, Lagarde pode reconhecer alguma resistência interna, como já refletiam as atas de Julho”-

Já a Ebury considera que o BCE deverá manter as taxas inalteradas, apontando que o crescimento da zona euro é mais resiliente do que o esperado e que a inflação deverá manter-se em torno dos 2%. Já as previsões de crescimento e inflação poderão vir a sofrer revisões em alta.

Meloni dá ‘canelada’ a Macron: juros franceses já superam os italianos

É uma das relações políticas mais complicadas da Europa atualmente e ganha agora mais achas para a fogueira. A tensão entre Emmanuel Macron e Giorgia Meloni tem tido vários episódios. Um dos mais recentes foi a troca de galhardetes entre Paris e Roma devido à política fiscal italiana para atrair fortunas estrangeiras num momento em que em França discute aumentar a carga fiscal.

A Assembleia Nacional chumbou a moção de confiança apresentada por François Bayrou e o presidente francês já anunciou o novo primeiro-ministro: Sebastien Lecornu, um aliado de longa data de Macron.

Agora, é o facto inédito de os juros da dívida francesa terem superado durante a sessão na terça-feira os juros italianos, a primeira vez que tal aconteceu. É certo que depois corrigiram, mas isto significa que os investidores acreditam que há um risco maior em comprar dívida francesa face à italiana, algo impensável há pouco tempo.

França está também a caminho do quinto primeiro-ministro em dois anos, algo que pode ser comparado à típica instabilidade governativa italiana, até há poucos anos.

Historicamente, as obrigações transalpinas têm recompensado melhor os investidores devido a maiores riscos económico-financeiros associados a Itália. No pico da crise das dívidas soberanas em 2012, os juros italianos estavam 4 pontos acima dos gauleses. Em 2022, o spread atinge dois pontos de diferença. Mas a estabilidade do Governo de Giorgia Meloni levou os mercados a apostarem mais em Itália, a par do esforço do país para consolidar a sua dívida.

O grande desafio de Emmanuel Macron agora é convencer as agências de rating que o novo primeiro-ministro vai conseguir dar a volta à instabilidade política e conseguir colocar o país no bom rumo financeiro e económico, com um novo orçamento do Estado para o próximo ano.

A primeira agência a pronunciar-se é a Fitch que divulga a sua nota na próxima sexta-feira, 12 de setembro. Atualmente, atribui AA- a França com uma perspetiva negativa. Em outubro e novembro seguem-se a Moody’s (Aa3) e a S&P Global (AA-), respetivamente. Já Itália está uns degraus abaixo: com BBB+ da S&P, Baa3 da Moody’s e BBB da Fitch.

“Os ‘spreads’ franceses são consistentes com uma descida do rating”, disse à “Bloomberg” Guillermo Felices da PGIM Fixed Income.

A mudança que teve lugar na terça-feira deveu-se a questões técnicas: a obrigação gaulesa que serve de benchmark passou a ter uma maturidade mais longa face à transalpina, mais uns meses, mas os analistas apontam que marca a continuação de uma tendência que arrancou há vários anos e acontece num momento de grande pressão para Emmanuel Macron.

“A expetativa é que o próximo PM seja para ficar. Para os investidores, a grande preocupação é que o eleitorado não vai formar uma maioria clara e não parece preocupado com a deterioração orçamental”, segundo Elliot Hentov da State Street Investment Management, citado pela “Bloomberg”.

Para Sam Hill do LLoyds, “as expetativas para um desfecho rápido dos problemas políticos e orçamentais em França deverão permanecer constrangidos”, afirmou, apontando que as obrigações gaulesas vão continuar sob pressão.

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