Confesso que quando vi por aí escrito que o Ricardo tinha um prédio à venda, de imediato pensei que talvez me tivesse enganado a seu respeito. Confirmei isso mesmo, quando, um pouco mais tarde, constatei de que prédio se falava por aí. De facto, esse meu erro tinha sido tremendo, tremendamente grande, tal como o imóvel do Ricardo.

Mas como dizia, enganei-me: afinal, o Ricardo não era o indivíduo contestatário que convictamente se opunha à “gigantesca operação de especulação imobiliária”, ele estava só a brincar, enquanto, às escondidas, comprou, requalificou e colocou no mercado, um imóvel com um preço capaz de gerar uma mais-valia de 4 milhões de euros. Infelizmente, para o Ricardo, rebentou a bolha, não aquela que ele condenava e antecipava com a sua palavra, mas aquela em que ele jogava à carta fechada.

Mas isto não tem nada que ver com o belíssimo prédio do Ricardo, ao qual já foi feita publicidade suficiente e que, se tudo correr bem, será vendido em pouco tempo. Isto tem sim que ver com o Ricardo, com o seu carácter, com o que diz e com que faz.

O Ricardo pode até ter renunciado ao cargo de vereador na Câmara Municipal de Lisboa, pode até ter renunciado ao seu cargo na comissão coordenadora da concelhia de Lisboa do Bloco de Esquerda, mas tudo isto não é suficiente, porque a coerência exige-lhe um pouco mais, exige que entregue o seu cartão de militante. Isto, porque se há coisa que os partidos de esquerda odeiam mais do que os senhores de direita que fazem especulação imobiliária, são, certamente, os senhores de esquerda contra a especulação imobiliária que fazem especulação imobiliária, ou será que não?

Portugal assiste, mais uma vez, a uma saída táctica de cena, Ricardo renuncia aos seus mandatos alegando um “enorme constrangimento”, o que dá a sensação que foi ele que se livrou de nós, e não nós que nos livrámos dele. Enfim, eu não tenho nada contra o Ricardo, mas tenho muito contra o seu comportamento e se é para isto, de facto, é indiferente quem se livra de quem.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.