Até à “silly season” viveu-se em Portugal um ciclo de estabilidade e crescimento económico, resultante de diversos fatores, sendo de destacar alguma reorganização do Estado, através da austeridade imposta pelo FMI – gerando poupanças – o investimento estrangeiro, bem como o crescimento significativo do turismo e das atividades conexas – injetando liquidez na economia e dinamizando o mercado de trabalho.
Neste quadro, tem sido possível aliviar a tensão social, desafogando progressivamente as pessoas, restituindo-lhes os cortes salariais e fomentando o consumo privado. Em termos políticos, a solução ficou conhecida por “Geringonça” e chamou a atenção de outros países europeus. No entanto, não seria justo ignorar contributos políticos anteriores, especialmente por terem tido a coragem de cortar onde, agora, é possível aliviar. Não obstante isso, na realidade, o mérito da recuperação de Portugal é, essencialmente, do povo português. Com efeito, uma vez mais na história, o povo manteve-se sereno perante a grave crise económica e financeira que assolou o país, sem evidenciar qualquer tipo de contestação social. Inclusive, não enjeitou emigrar e procurar noutros países, aquilo que Portugal, a espaços, não conseguiu dar.
Assim, podemos e devemos tirar ilações deste passado recente, designadamente: i) maior rigor, transparência e eficiência na utilização dos recursos financeiros, que não são ilimitados; ii) o trabalho dignifica, sendo necessário criar condições de o qualificar de acordo com as exigências contemporâneas. Na prática, e sem grandes surpresas, independentemente da era do conhecimento e inovação em que vivemos, a fórmula económica do sucesso continua a assentar no binómio investimento, potenciado pela poupança, e trabalho. Ou seja, devemos, por um lado, empreender continuamente, mesmo perante as maiores adversidades; e, por outro lado, poupar uma parte dos nossos rendimentos, para fazer face a riscos e incertezas futuras.
Desta forma, estranhamos o comportamento dos sindicatos que exigem constantemente mais da economia portuguesa, como se vivêssemos na Alemanha, cujo sistema tanto repugnam, apesar das evidências dos resultados do modelo de desenvolvimento social e económico que elevou o país a uma potência mundial. É um facto que em Portugal estamos a crescer, mas estamos, ainda, muito longe de resolver os nossos problemas estruturais, sob pena de em alguns anos mais repetirmos novo default num cenário mais adverso da conjuntura económica, nomeadamente do turismo, e mais desfavorável em face da previsível subida das taxas de juro.
As reivindicações, por mais e melhor qualidade de vida, devem ser entendidas como ambições naturais dos indivíduos, mas não podemos esquecer a realidade dos factos. Foi precisamente na Alemanha, em 1883, que surgiram as primeiras contestações sociais e que originaram os sistemas de previdência social que hoje temos em vigor um pouco por toda a Europa. Estávamos no início da revolução industrial, cuja mudança no estilo de vida das populações, maioritariamente rurais para a cidade e da transição de um tipo de trabalho agrícola, artesanal, para a indústria, originou a contestação social e o nascimento dos sindicatos. Na época, o Chanceler Alemão Otto Eduard Leopold von Bismarck (1815-1898), à direita, considerou que era necessário olhar para o social, ficando na história como um dos percursores da previdência social. De certa forma, com a Geringonça, mais à esquerda, foi o que se fez em Portugal. Ou seja, a partir do centro, deu-se um pouco mais à esquerda, especialmente para evitar as reivindicações ilusórias e a consequente contestação social. No entanto, face à orexia atual dos sindicatos, ainda sem o robustecimento necessário da economia portuguesa, corremos sérios riscos de resvalar para velhos problemas. O euro e a gestão comum da moeda por 19 países, não sustenta grandes ilusões.
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