É um desafio muito difícil. Mas está apostada em vencê-lo. Com a determinação de quem se habituou a ultrapassar obstáculos, Vera Esperança dos Santos Daves de Sousa, recém-empossada ministra das Finanças de Angola, quer recuperar o tempo perdido, recolocando o país na linha da frente do progresso.
Ao empossá-la no palácio presidencial, a 9 de outubro, João Lourenço não deixou lugar a dúvidas: “Queremos obra feita. Já fizemos muitos discursos e precisamos de fazer coisas em concreto.” Não podia ser mais claro o repto do Chefe do Estado à nova titular da pasta das Finanças, nascida há 35 anos em Luanda. A primeira mulher a assumir tão importante pelouro no país, independente há 44 anos.
É um domínio com poucos segredos para a jovem governante. Antes de ascender ao posto ministerial, já integrava o Executivo, como secretária de Estado das Finanças e Tesouro. Licenciada em Economia pela Universidade Católica de Angola, entre as funções públicas que desempenhou destacam-se a de administradora executiva da Comissão de Mercado de Capitais (2014-2016) e a presidência desta comissão (2016-2017, transitando daí para o Governo).
Quem já trabalhou consigo gaba-lhe a firmeza e a genuína vontade de servir o país, confrontado com graves problemas na área financeira. Sabe-se de antemão que não terá tarefa fácil: a economia angolana entrou em recessão desde a drástica queda das receitas do petróleo. Segundo as previsões do Fundo Monetário Internacional, o ano fechará com as contas a vermelho: 0,3% de crescimento negativo do Produto Interno Bruto.
Para 2020, é fundamental que a administração pública angolana nos seus diversos patamares – central, provincial e local – “sejam capazes de gerar um saldo positivo entre os recursos de que irão dispor e aqueles que estão autorizados a gastar”. Palavras da nova ministra na abertura da III Edição do Fórum do Mercado de Capitais, realizado no mês passado em Luanda.
Uma das metas ambicionadas é gerar um saldo fiscal positivo de 1,2% do PIB. Só assim, garante a governante angolana, haverá “margens sustentáveis para reduzir a dívida soberana, de forma gradual e paulatina”. E saldar o empréstimo contraído em 2018 junto do FMI ao abrigo de um programa de financiamento ampliado que implica obrigações para o Estado angolano.
O peso da dívida
O endividamento das contas públicas do país poderá ascender este ano a 95% do PIB e mais de metade do Orçamento do Estado angolano para 2020, no valor de cerca de 15 biliões de kwanzas (mais de 27 mil milhões de euros) destina-se a pagar a dívida. A inflação a rondar os 18% e o desemprego cifrado em 30% são outras más notícias para Vera Daves, que não demorou a transmitir mensagens positivas à população, aos empresários e aos mercados.
“É preciso garantir que no final do processo o país saia da letargia que tem impedido de resolver problemas como o emprego, a competitividade e a eficiência”, afirmou também a governante pouco depois de iniciar funções. Referia-se, em concreto, ao vasto programa de privatizações que promete transformar a face da economia nacional. Prevê-se a transferência de 195 empresas da órbita do Estado para a esfera privada, incluindo 32 de referência nacional. Intenção declarada: gerar receitas que permitam não apenas aliviar a dívida mas concretizar investimentos há muito adiados no capítulo das infraestruturas públicas, essenciais para a modernização do tecido produtivo.
Esta operação decorrerá através da Bolsa de Valores, estando já empossada uma comissão técnica que acompanhará este ambicioso programa. As privatizações incidirão sobretudo nas áreas da indústria, agricultura, minas, transportes, telecomunicações e turismo.
A posse privada dos meios de produção deixou de ser tabu em Luanda, capital de um país com 42% da população no limiar da pobreza. O currículo da ministra não deixa dúvidas quanto ao seu conhecimento da dinâmica empresarial e aos desafios da economia angolana no contexto da globalização.
Antes da sua etapa governativa, a primeira mulher a gerir as finanças do Estado angolano foi técnica superior na Sonangol e dirigiu o gabinete de produtos e pesquisa do Banco Privado Atlântico. Tornou-se presença assídua, enquanto comentadora, em órgãos de informação – incluindo a TPA, a Rádio Mais e a revista Rumo – e integrou o corpo docente da Universidade Católica, sua alma mater, ensinando Finanças Públicas e Integração Económica.
Vera Daves admite que o Estado “tem ainda um caderno muito pesado e muito complexo”. Precisa de atrair financiamento externo e gerar confiança nos investidores, o que só se consegue com o aprofundamento das reformas iniciadas por João Lourenço. E o cumprimento de compromissos firmados com o FMI. Um destes exige o fim dos subsídios estatais a combustíveis.
O presidente angolano não deixou lugar a dúvidas. Ao empossar a ministra, juntamente com a nova titular da pasta da Educação, Ana Tuavanje Elias, o Chefe do Estado transmitiu-lhes uma palavra de ordem: eficiência. Em busca de soluções “sem aguardar pelas famosas ordens superiores, salvo se as situações ultrapassarem a vossa competência”.
Vera Daves de Sousa enfrenta o teste mais complexo da sua carreira profissional e política. Vai querer superá-lo com a mesma nota elevada que a acompanhou no percurso académico. Fracasso, garante quem a conhece, não é palavra que conste do seu vocabulário.
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