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Por que ganhou Haddad em Berlim? Histórico alemão terá influenciado votação, admite investigador

Na capital alemã, o candidato da extrema-direita, Jair Bolsonaro (PSL) conquistou apenas 26,3% dos votos, contra os 73,3% obtidos por Fernando Haddad, do PT (esquerda), resultados que para o sociólogo brasileiro Luiz Ramalho podem estar relacionados com o passado histórico da Alemanha.
30 Outubro 2018, 16h01

A capital alemã, Berlim, foi a cidade europeia que registou o maior número de votos em Fernando Haddad, o candidato derrotado às presidenciais brasileiras, cenário que o sociólogo brasileiro Luiz Ramalho relaciona com o passado histórico da Alemanha.

Na capital alemã, o candidato da extrema-direita, Jair Bolsonaro (PSL), que venceu a eleição para Presidente, conquistou apenas 26,3% dos votos, contra os 73,3% obtidos por Fernando Haddad, do PT (esquerda), resultados que para o sociólogo brasileiro Luiz Ramalho podem estar relacionados com o passado histórico da Alemanha, que viveu uma ditadura fascista.

“É um ponto em que o Brasil falhou fortemente, trabalhar na memória da ditadura militar, cultivar a memória e a linguagem. Essa falta de memória facilitou o discurso de Jair Bolsonaro, que diz, por exemplo, que se devia ter matado mais. Faz parecer aos jovens que esse período foi uma época tranquila, segura da vida nacional”, admite o investigador ligado à organização não-govenamental “Brasilien Initiative Berlin”.

Os resultados das eleições brasileiras na capital alemã vão estar em debate, ao final do dia de hoje, no Instituto Ibero Americano de Berlim.

O candidato do Partido Social Liberal (PSL, extrema-direita) Jair Messias Bolsonaro, 63 anos, capitão do Exército reformado, foi eleito no domingo, na segunda volta das eleições presidenciais, o 38.º Presidente da República Federativa do Brasil, com 55,1% dos votos.

De acordo com os dados do Supremo Tribunal Eleitoral, Fernando Haddad, candidato do Partido dos Trabalhadores (PT, esquerda), conquistou 44,9% dos votos, com o escrutínio provisório (99,99% das urnas apuradas) a apontar para 21% de abstenção do total de eleitores inscritos (mais de 147,3 milhões).

“Quem está na Alemanha assiste a uma permanente discussão dos princípios democráticos, questionando a ditadura nazi. Penso que isso sensibilizou os brasileiros que vivem na Alemanha”, admite Luiz Ramalho.

Já a investigadora Claudia Zilla acredita que na Alemanha há uma “valorização mais profunda das questões democráticas”, o que pode ter influenciado a decisão nas urnas.

“Os que cá vivem não são tão afetados pela temática económica que se vive no Brasil. Por isso, há outros aspetos que se tornam relevantes na altura de votar, diferentes daqueles que pesariam se se estivesse no Brasil”, adianta a investigadora, especialista em política da América Latina.

“Os brasileiros e brasileiras que votaram aqui na Alemanha conhecem mais facilmente a ditadura do Brasil do que o Holocausto alemão. Por isso, acredito que tenha sido mais relevante a relativização que Bolsonaro faz da ditadura brasileira do que o passado nazi alemão. Mas é uma hipótese, teríamos que conduzir uma investigação empírica, com questões qualitativas, perguntando às pessoas o que as levou a tomar essa decisão”, explica a politóloga do Instituto Alemão para a Política Internacional e de Segurança.

Para Luiz Ramalho, o resultado eleitoral “não foi uma surpresa, mas está a criar uma expectativa muito negativa para a democracia no Brasil”

“O ex-deputado Jair Bolsonaro, durante toda a campanha e toda a sua carreira política, nunca negou a sua preferência pela ditadura militar, pelo armamento das pessoas. Sempre afirmou palavras discriminatórias contra negros, mulheres, homossexuais. Vamos ter um momento de rutura do sistema político brasileiro, muito difícil de avaliar atualmente, porque, a partir da democracia, escolheu-se um candidato não democrático”, assume o sociólogo, que saiu do Brasil, como exilado, em 1969.

Claudia Zilla acredita que estas presidenciais no Brasil foram “eleições de protesto contra a classe política, o sistema político, escolhendo alguém se que apresenta como rebelde, como diferente, como alguém que não pertence aos grupos criticados”.

Mas “mais do que dar uma lição aos políticos e à classe política”, a investigadora sublinha que os brasileiros “acabaram por se auto castigar, porque a escolha de Bolsonaro acarreta mais riscos do que se tivesse ganho Haddad”.

“Considero que o maior desafio do Brasil é, mais do que Bolsonaro, o 55% da população que o votou. Mais de metade do eleitorado ou apoia posições racistas, autoritárias e xenófobas, ou votou, independentemente de todas estas posições, como forma de protesto. E governar o país com este retrato é o grande desafio”, remata a politóloga.

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