Portugal não tem capacidade industrial para fornecer os componentes necessários à grande empreitada da energia eólica offshore. Esta é a conclusão de um estudo do INEGI – Instituto de Ciência e Inovação em Engenharia Mecânica e Engenharia Industrial, do Porto.
Entre os componentes necessários (numa estimativa conservadora) para construir 10 gigas, encontram-se: 700 torres, 700 fundações flutuantes, 700 nacelles (carcaça do aerogerador), 2.100 aerogeradores, 5.000 km de cabo de amarração, 2.000 km de cabos de eletricidade. Em termos de materiais, vai ser necessárias: 3,5 milhões de toneladas de aço, 80 mil toneladas de cobre, mais de 2.500 toneladas de minerais terras-raras, segundo o estudo que foi apresentado durante a conferência da Associação Portuguesa de Energias Renováveis (APREN).
Os 10 gigawatts correspondem a quase 70% da capacidade instalada no Reino Unido ao longo de 18 anos (em tecnologia fixa no fundo do mar), e o equivalente à ambição da Dinamarca, país que já conta com 2,3 gigawatts instalados em eólicas offshore.
Só para construir dois gigawatts até 2030, as necessidades de Portugal correspondem a 100% da produção anual europeia em termos de cabos de eletricidade (dinâmicos) e de fundações flutuantes; a 20% de subestações offshore; a 5% da produção de carcaças, aerogeradores e cabos de eletricidade (cabos de exportação); a 1% das torres.
Analisando os portos nacionais, estes precisam de “intervenção significativa e consumidora de tempo para tornarem-se em portos de assemblagem, e não deverão estar prontos a tempo da instalação dos primeiros 2 gigawatts”.
Para Gisela Santos, diretora do INEGI, “para Portugal aumentar a sua cadeia de abastecimento e receber grandes investimentos, é preciso mais visibilidade sobre o pipeline de projetos, para os investidores terem mais garantias e investirem na capacidade da nossa cadeia de abastecimento”, afirmou, durante a apresentação, defendendo também um “plano de investimento detalhado nos portos nacionais”.
Durante a conferência da APREN, Javier Villalba da Corio, que pertence ao fundo australiano Macquarie Asset Management, deixou uma recomendação à indústria nacional, defendendo que devem focar-se na produção de apenas alguns componentes e não em todos. Este foco, acredita, vai permitir à indústria portuguesa especializar-se para fornecer a empreitada nacional offshore e depois começar a exportar para outros mercados.
“Evitem tentar fazer todos os produtos e foquem-se. Façam uma coisa bem feita. De forma competitiva”, afirmou o gestor espanhol durante um debate na APREN.
“Esta é uma grande oportunidade para a cadeia de abastecimento portuguesa, Primeiro, para servir o mercado em Portugal, depois para exportar. Vão haver leilões em Portugal, Espanha, França, EUA e Reino Unido”, acrescentou Javier Villalba.
Também Alvaro de Miguel, dos alemães da RWE, defendeu que o país tem aqui uma “grande oportunidade” para desenvolver a cadeia de abastecimento do sector para a tornar competitiva para depois “exportar para outros mercados”. Uma das vantagens que a indústria nacional pode vir a ter é de apostar cedo nas componentes para a energia eólica offshore flutuante.
Problemas identificados
Olhando para o estudo, entre os principais problemas, o estudo do INEGI identifica a “falta de uma indústria madura e significante de produção de componentes”.
Falhas na “infraestruturas portuárias, em termos de terrenos disponíveis, e acessibilidade marítima”.
Em relação às embarcações necessárias, existem falta de “navios disponíveis para as diferentes fases de projetos eólicos offshore, e a falta de uma indústria madura e significante de navios” especializados.
Em termos de materiais, a falta de materiais críticos como aço, cobre e minerais terra rara assim como a “falta de uma indústria de transformação”, também é apontado como um problema.
Por outro lado, há oportunidades para explorar, destaca o INEGI
“Forte conhecimento, experiência e indústria estabelecida em Portugal para a produção de sistemas de amarração, cabos elétricos e material metalomecânico e capacidades técnicas elétricas para a produção de torres, embora com significativas falhas ao nível de capacidade”, começa por destacar.
Depois, a possibilidade de tirar partido da indústria metalomecânica e eletromecânica para desenvolver produtos de segunda ordem.
A falta de uma indústria pode ser uma oportunidade para novos atores investirem no país.
Por último, a recuperação de materiais, componentes e subcomponentes em equipamento em fim de vida pode ser útil para reduzir a importação e a dependência de certos materiais.
Para o curto prazo, estas são as recomendações deixadas pelo INEGI:
– Acelerar processos de licenciamento criando uma “one-stop shop”, um balcão único de licenciamento para centralizar as questões relacionadas com a geotermia, ambientais e outros
– Os leilões devem ser cuidadosos ao exigirem a contribuição da incorporação da indústria nacional
-Criar políticas para o treino, atração e manutenção de uma força de trabalho qualificada.
– As centrais offshore localizadas na costa norte devem ter preferência, pois para o curto prazo a cooperação com os portos espanhóis no norte será uma “opção realística”
– Foco no desenvolvimento industrial de “componentes específicos com potencial de mercado, como flutuadores, cabos elétricos, torres e sistemas de amarração”
– Desenvolvimento de um cluster metalomecânico e elétrico para a produção de subcomponentes complexos de segunda ordem
– “Garantir acordos para o fornecimento de componentes, materiais e embarcações no mercado global e em particular, sinergias e cooperação a nível ibérico”
Uso de portos espanhóis, para já
O estudo recomenda assim que as áreas preferenciais para a primeira fase sejam Viana do Castelo Norte/Sul e Leixões, dada a proximidade com os portos galegos de Ferrol e da Corunha.
Olhando para a lista de possíveis fornecedores no curto prazo, Portugal pode fornecer cabos de amarração, Espanha pode fornecer os portos, mas também torres e fundações flutuantes, com os restantes componentes e materiais a terem de ser importados do resto da União Europeia, Reino Unido, China, Japão, Coreia do Sul e resto do mundo.
O INEGI recomenda que a indústria nacional foque a sua produção em certos componentes com mercado potencial, como flutuadores, cabos elétricos, torres e sistemas de amarração. E defende a colaboração entre diferentes indústrias e apoio logístico à volta de dois portos nacionais de assemblagem (um no norte e outro no sul).
Para o médio prazo, o INEGI recomenda que tenha então lugar o leilão para as áreas mais a sul: Figueira da Foz, Ericeira e Sines. Os dois portos a usarem seriam Setúbal e Sines.
Nesta altura, Portugal poderia já estar pronto para fornecer cabos elétricos, torres, fundações flutuantes e cabos de amarração, com a necessidade de importar componentes e produtos de outros países.
Oportunidades para a indústria nacional
Para concluir, Gisela Santos do INEGI recomendou que seja realizado uma análise para escolher os melhores portos nacionais para apoiar a empreitada offshore.
Depois, identificou várias oportunidades para a indústria nacional:
– Potencializar a indústria de sistemas de amarração, cabos elétricos e produção de torres
– Desenvolvimento de um cluster metalomecânico e eletromecânico para desenvolver subcomponentes complexos de segunda ordem
– Oportunidade de desenvolver uma indústria de flutuadores, pois ainda está subdesenvolvida globalmente
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