Na linha dos seus antecessores, José Moreira, presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup) tem como prioridades a dignificação do ensino superior, o combate à precariedade de docentes e investigadores, por melhores salários e revisão dos estatutos das carreiras. O sindicato independente que representa os docentes do ensino superior e investigadores científicos reuniu, recentemente, com a ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Elvira Fortunato, e o secretário de Estado, Pedro Nuno Teixeira, que lhe apresentaram as propostas para o novo Estatuto de Carreira de Investigação Científica e para o novo Regime do Pessoal Docente e de Investigação dos Estabelecimentos de Ensino Superior Privados que constam da pasta de transição do MCTES para o próximo Governo.
Ao Jornal Económico, José Moreira faz o ponto da situação do processo de revisão em marcha naqueles estatutos, revela o que é inegociável para o SNESup – “não aceitaremos um regime de avaliação do desempenho desalinhado dos restantes trabalhadores das administrações públicas” – e formula votos: “esperamos que a próxima equipa governamental esteja aberta à negociação e não só à audição, de modo que seja possível construir consensos com docentes e investigadores e a sociedade civil a que estamos todos empenhados em servir”.
Comecemos pelo Estatuto de Carreira de Investigação Científica. A proposta tal como está, é o que esperavam? Em que aspetos não se reveem?
Não é o estatuto que esperávamos, nem é o estatuto que o sistema nacional de ciência e tecnologia necessita! Falha em quatro aspetos fundamentais.
Comecemos pelo primeiro.
O âmbito de aplicação: embora se aplique às instituições de direito público, e às de direito privado maioritariamente detidas por instituições de direito público, não se aplica às instituições de regime fundacional, deixando assim de fora um enorme número de investigadoras e investigadores.
Quem?
Deixa de fora todos os contratados a termo certo ou incerto, que continuariam a reger-se pelo DL57/2016 e pela lei 57 de 2017, não acabando a figura iníqua do Investigador Júnior.
E outros aspetos?
O estatuto introduz na componente de avaliação do desempenho uma normativa contrária à dos restantes trabalhadores das administrações públicas, a progressão horizontal só poder resultar da obtenção de classificação máxima por um período de seis anos consecutivos. Prevê a perda do regime normal destes trabalhadores, que é a dedicação exclusiva, em situações que não dependem da vontade do trabalhador, mas de imposição automática.
Com o fim imprevisto e extemporâneo do Governo, o documento não chegou a entrar na fase de negociação com os sindicatos. Vão propor melhorias? Quais? Algum desses aspetos é inegociável?
Além de pequenas alterações de redação que passam pelo aperfeiçoamento e clarificação da mesma, o SNESup não aceitará um estatuto que seja de aplicação universal a todas as instituições e profissionais que desenvolvem trabalho de investigação em instituições cujo financiamento seja maioritariamente público. Também não aceitaremos um regime de avaliação do desempenho desalinhado dos restantes trabalhadores das administrações públicas. Esperamos que um novo Governo abra um verdadeiro processo negocial com o envolvimento das associações sindicais que representam os investigadores. Na elaboração do documento que iria ser posto à discussão, nenhuma associação sindical foi ouvida e tal teria sido benéfico para a construção do documento de partida.
Como avalia o documento que vai transitar para o novo Governo sobre o Regime do Pessoal Docente e de Investigação dos Estabelecimentos de Ensino Superior Privados? Que propostas vão apresentar ao próximo Governo quando este (re)lançar o processo negocial?
O Regime do Pessoal Docente e de Investigação dos Estabelecimentos de Ensino Superior Privados está em falta desde 1989, e esta omissão é causa de uma completa desregulação no sector com evidentes prejuízos na qualidade do ensino e investigação e sobretudo na dignidade dos seus docentes e investigadores. A redação proposta vem, curiosamente, indicar que a lei deve ser cumprida, isto é, que a docência e investigação devem ser exercidas ao abrigo do Código do Trabalho. Embora paradoxal esta é a nossa reivindicação central e parece ter sido contemplada no normativo proposto.
Existem, no entanto, normas que têm de ser discutidas em sede de negociação, nomeadamente, a duração do período de trabalho, e sua distribuição pelas diversas vertentes que têm de ser balizadas no documento final. Importa ainda rever as normas referentes aos contratos a termo, bem como a regulação da figura do assistente.
Além dos dois Estatutos em transição para o próximo Governo, que outros dossiês estão em aberto no Ensino Superior e na Investigação?
Outros dossiês em aberto são a revisão dos Estatutos das Carreiras Docentes tanto do Ensino Politécnico como do Universitário, assim como o Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES).
No Ensino Superior e Ciência terão ainda de ser abertas negociações referentes aos salários, avaliação do desempenho, e a regulação efetiva da figura do docente convidado. Central é ainda a abertura de um novo programa de regularização dos vínculos precários para os Investigadores e Docentes, de modo a corrigir os erros do famigerado PREVPAP, que foi um enorme falhanço no Ensino Superior e na Ciência.
Como antevê o ano de 2024 no sector?
O ano no sector do Ensino Superior e Ciência será seguramente conturbado devido às transformações políticas e sociais que atravessamos. Esperamos que o Governo a sair das próximas eleições tenha um programa claro para o ensino superior e para a ciência e que seja capaz de construir soluções com a participação dos profissionais destas áreas.
O que espera que mude no próximo ano além da equipa ministerial?
Esperamos que a próxima equipa governamental esteja aberta à negociação e não só à audição, de modo que seja possível construir consensos com docentes e investigadores e a sociedade civil a que estamos todos empenhados em servir.
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