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PRR: “Peca por falta de profundidade e ambição” para a Administração Pública, diz Fesap

O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) “tem de ser consequente nos salários, nas carreiras e no sistema de avaliação da Administração Pública”, defende a Federação de Sindicatos de Administração Pública na análise ao documento apresentado pelo governo, cuja consulta pública terminou a 1 de março, tendo recebido perto de dois mil comentários para mudar a bazuca europeia.
3 Março 2021, 18h00

A Federação de Sindicatos de Administração Pública (Fesap) defende que o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), apresentado em fevereiro pelo Governo, “peca por falta de profundidade e ambição” ao não apresentar uma política estratégica e plurianual para os recursos humanos da Administração Pública. A Fesap considera “um erro” enveredar por qualquer plano que não passe pelo investimento nas questões que considera “fundamentais” para os trabalhadores como salários, carreiras, sistema de avaliação e combate ao emprego precário.

“A Fesap valoriza o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), apresentado em fevereiro pelo Governo. Apesar de alguns princípios e objetivos estarem em linha com o que é defendido pela Federação, peca por falta de profundidade e ambição, não apresentando uma política estratégica e plurianual para os recursos humanos da Administração Pública no que diz respeito aos salários, às carreiras, ao sistema de avaliação e ao combate ao emprego precário”, avança a estrutura sindical liderada por José Abraão nesta quarta-feira, 3 de março.

Na análise ao documento, a Fesap realça que “é inegável” que a Administração Pública e os seus trabalhadores, mesmo com todos os constrangimentos existentes, têm demonstrado “grande capacidade” para responder ao desafio que a pandemia de SARS-CoV-2 representa para Portugal, sinalizando que “com toda a certeza, essa importância será mais uma vez sublinhada pelo papel que desempenharão na recuperação económica e social do país no período pós-pandémico, pelo que é um erro enveredar por qualquer plano que não passe pelo investimento naquelas questões fundamentais para os trabalhadores.

Segundo a federação sindical liderada por José Abraão, para que tal aconteça, é necessário que o Governo “passe das palavras aos atos ao invés de multiplicar os anúncios de medidas de grande relevo para a vida dos trabalhadores através da comunicação social”. Uma atuação, diz, que, gera “expetativas e instabilidade”, sugerindo que sejam convocadas as organizações sindicais para a mesa das negociações, “algo que, ao contrário do que foi referido recentemente numa entrevista, ainda não aconteceu”.

Não obstante considerar ”positiva a intenção” do Executivo em investir na transição digital e na qualificação dos trabalhadores, a Fesap acredita que isso, por si só, não é suficiente para aumentar a qualidade dos serviços prestados, bem como a motivação dos trabalhadores.

“Em concreto, o PRR continua a não eleger como prioridade o abandono de uma política de rendimentos assente nos baixos salários, nivelados por baixo, e que, paulatinamente destrói e empobrece a classe média em geral e, muito em particular, a maioria dos trabalhadores da Administração Pública, não se verificando assim, uma vontade clara do Governo em combater a pobreza e as desigualdades”, explica.

Neste contexto, a Fesap considera que “urge” iniciar-se a negociação, em sede própria, da revisão das carreiras (gerais e outras) e dos estatutos profissionais, avançando para a criação de carreiras “mais atrativas, pluricategoriais, com intervalos de progressão mais curtos, de topo alcançável (não sendo necessário viver até aos 120 anos para chegar ao topo da carreira, como acontece hoje em dia para muitos milhares de trabalhadores)”. A federação sindical defende que que a criação de carreiras deverá recuperar o conceito de profissão como “útil e necessário” para que possam ser consideradas as especificidades inerentes a cada função, sendo os casos mais evidentes os dos trabalhadores da saúde e da educação, setores para os quais a Fesap defende a criação das carreiras de técnico administrativo da saúde/educação e de técnico auxiliar de saúde/educação, mas também de outros setores de grande importância como é o caso, por exemplo, das autarquias.

Na análise ao PRR, a Fesap salienta ainda que, por outro lado, “é imperativo que um sistema de carreiras bem estruturado e atrativo esteja conjugado com um sistema de avaliação mais justo e equitativo, a implementar já em 2021, que não mantenha como principais características a existência de quotas e de constrangimentos orçamentais”. E aponta este passo como decisivo para “de uma vez por todas” investir na valorização do trabalho e dos trabalhadores da Administração Pública.

Para a Fesap, não basta alterar “a cosmética” da tabela remuneratória única (TRU) e das carreiras, criando posições remuneratórias intermédias. “As alterações a operar na TRU têm, antes de mais, de corrigir as injustiças existentes e avançar no sentido do afastamento entre o salário médio e o salário mínimo (e não o oposto, como tem vindo a acontecer consistentemente de há longos anos a esta parte), ao mesmo tempo que se adota um sistema de carreiras justo, conjugado com um sistema de avaliação que obedeça a critérios de transparência e objetividade, sem fatores economicistas a ditarem quantos trabalhadores podem ser excelentes”, conclui.

O PRR define três dimensões estruturantes de aposta: a da resiliência, da transição climática e da transição digital, às quais serão alocados 13,9 mil milhões de euros em subvenções a fundo perdido das verbas europeias pós-crise. Estão ainda previstos 2,7 mil milhões de euros em empréstimos, cerca de metade do que estava inicialmente previsto em outubro.

O ministro do Planeamento Nelson Souza disse no Parlamento, a semana passada, que pretende entregar em Bruxelas a versão final do PRR na primeira quinzena de março.

Em entrevista ao Jornal Económico, a 19 de fevereiro, a secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Ana Paula Zacarias, disse que acredita que será possível pôr no terreno até junho a “vitamina” contra a crise. “Esperamos que em junho a ‘vitamina’ possa estar em curso”, sinalizou a governante.

Na semana em que o Mecanismo de Recuperação e Resiliência entrou em vigor e em que o Governo colocou o Plano de Recuperação em consulta pública, a coordenadora operacional da presidência portuguesa afirmou, assim, ao JE estar confiante de que o dinheiro da bazuca europeia comece a chegar aos países ainda em junho.

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