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Quebra nos mercados deve-se mais a um abrandar do “carry trade” do que receios sobre a economia dos EUA

“Não se pode reduzir o maior carry trade que o mundo alguma vez já viu sem rachar umas quantas cabeças”, afirmou à Reuters Kit Juckes, o chefe de estratégia de divisas da Societe Generale.
6 Agosto 2024, 07h30

Analistas ouvidos pela Reuters dizem que a quebra generalizada nos mercados desta segunda-feira se deve mais a uma descida gradual do carry trade – uma estratégia que consiste no endividamento em ienes a taxa de juro baixa para investir – do que a uma mudança abrupta no outlook da economia americana. 

Os mesmos analistas afirmam que os dados do emprego nos Estados Unidos divulgados na sexta-feira, mais fracos do que o esperado, foram o gatilho para o sell-off nos mercados, que se agravou esta segunda-feira com o índice Nikkei a sofrer o maior tombo desde a Segunda-feira Negra de 1987. Ou seja, o relatório sobre o emprego não foi mau o suficiente para causar movimentos tão violentos no mercado. 

Paulo Rosa, economista sénior do Banco Carregosa, explicou o movimento ao Jornal Económico: “um dos maiores financiadores mundiais dos últimos anos, o Japão, devido às suas baixas taxas de juro e desvalorização da moeda, começa gradualmente a deixar de o ser, à medida que o BoJ [Banco do Japão] começa a subir as taxas de juro para travar a inflação. O carry trade perde cada vez mais interesse, com a subida dos juros no Japão e valorização da moeda nipónica, uma considerável fonte de financiamento começa que gradualmente a secar, diminuindo a liquidez global”. 

O analista exemplificou ainda a estratégia de carry-trade. “Tome-se como exemplo um empréstimo no montante de 140 ienes japoneses à taxa de 1 USD=140 JPY. Investindo esse dólar (1 USD) no Nasdaq por exemplo e ganhar 20%, ou seja, 1,2 USD e o iene desvalorizou para 150 JPY=1 USD, então pago o empréstimo de 140 JPY com apenas 0,933333 USD, um ganho total de quase 30%, com taxas de juro de quase zero”. Como agora as taxas de juro estão mais elevadas e verifica-se uma apreciação do iene, essas duas circunstâncias comprometem essa estratégia de financiamento.

Isto porque o iene japonês valorizou-se mais de 11% face ao dólar desde há um mês, quando atingiu o valor mais baixo desde há 38 anos.

A Reuters cita, sem nomear, um investidor baseado na Ásia que referiu que alguns dos maiores hedge funds que negoceiam títulos com base em algoritmos começaram a vender ações após a surpreendente mexida nas taxas de juro por parte do Banco do Japão, na semana passada.  

Os analistas suspeitam que o excesso de investidores a disputar ações das techs norte-americanas, financiados por carry trade, explica o porquê de estes títulos estarem a ser o mais afetados.

Os carry trades, impulsionados por anos de política monetária ultra-permissiva por parte do Japão, deram origem a um boom de empréstimos de ienes para financiar compra e venda de títulos noutras paragens, indicou o ING.

“É uma redução do carry financiado em ienes e uma redução [da negociação] dos títulos japoneses”, considerou à Reuters Tim Graf, chefe de estratégia macro para a Europa na State Street Global Markets. “As nossas métricas mostram que os investidores estão overweight em títulos japoneses. Estavam underweight no yen. Já não estão underweight no iene”, completou.

“Não se pode reduzir o maior carry trade que o mundo alguma vez já viu sem rachar umas quantas cabeças”, completou Kit Juckes, o chefe de estratégia de divisas da Societe Generale.

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