A presidente do Tribunal de Contas (TdC) defendeu esta quarta-feira, no Parlamento, que a auditoria feita aos relatórios da sustentabilidade financeira da Segurança Social, que apontou para um défice no sistema, foi um trabalho “sério, responsável e independente” e que o resultado dessa análise, embora faça várias recomendações, não contém qualquer afirmação “sobre eventuais opções políticas”. “Tão pouco há nele um juízo implícito desse cariz”, disse Juíza Conselheira Filipa Urbano Calvão durante a intervenção inicial numa audição pedida pela Iniciativa Liberal.
Apesar de o trabalho feito pelo TdC ter relançado o tema da sustentabilidade do sistema, a que se seguiu inclusive a criação de um grupo de trabalho da parte do Governo, a responsável esclareceu que o objeto da auditoria incidiu unicamente sobre os relatórios que acompanham as propostas de Orçamento do Estado (de 2018 e 2024), e não sobre a sustentabilidade da Segurança Social em si, e que o tribunal “apenas quis contribuir para a melhoria da informação apresentada” porque, tal como está, “não é suficientemente transparente” e “não traz elementos suficientemente densificados”.
“Para que não sobrem dúvidas: o tribunal não auditou, por isso não se pronunciou sobre a sustentabilidade da Segurança Social. O tribunal limitou-se a verificar e a apreciar se a informação contida naquele relatório é suficiente e se a metodologia que lhe serviu de suporte é, à luz das boas práticas atuariais, adequada à sua finalidade, que é dotar os órgãos políticos da informação necessária”, defendeu Filipa Urbano Calvão, explicando também que a auditoria se realizou por ser entendimento, não só do TdC como da generalidade das instituições superiores de auditoria do mundo, sobretudo da Europa, que “é prioritário nos dias que correm analisar o impacto da evolução demográfica em especial do envelhecimento da população nas finanças públicas na perspectiva da sua sustentabilidade”.
No âmbito dessa auditoria, o TdC identificou “aspetos na metodologia e no conteúdo que devem ser melhorados”, apontou a Juíza Conselheira, recordando as recomendações que são conhecidas. Entre elas a recomendação de que o Estado “disponha de uma análise atuarial global do impacto sobre as finanças públicas dos vários sistemas públicos de Segurança Social”. O que o TdC entende, acrescentou, é que “deve haver uma análise completa sobre a sustentabilidade dos sistemas públicos de proteção social que seja transparente e, assim, garanta a confiança das pessoas e a sustentabilidade contra diferentes riscos, entre eles o envelhecimento da população”.
Ou seja, para que essa análise seja completa, o TdC defende que deve ser incluída nela o sistema previdencial e o sistema convergente gerido pela Caixa Geral de Aposentações, tema, aliás, que tem divivido opiniões. E sobre este último sistema, Filipa Urbano Calvão mencionou ser preocupação do tribunal a “reduzida transparência”, pois não havia, à data da aprovação do relatório do TdC, “projeções a longo prazo atualizadas relativamente à sustentabilidade desse regime”.
Questionada precisamente sobre a junção das contas da CGA na avaliação global da sustentabilidade da Segurança Social, que os partidos à esquerda consideram ser errada por estarem em causa sistemas diferentes com abrangências e financiamentos distintos, Filipa Urbano Calvão disse que, para TdC, se afigura como “evidente” que assim seja. “Quando lemos a lei, na verdade, o que está em causa num relatório sobre sustentabilidade da Segurança Social não pode deixar de ser o conjunto das componentes desse sistema e não apenas o regime previdencial”, afirmou, defendendo existirem “vasos comunicantes evidentes” entre os vários componentes do sistema. De resto, argumentou também, esta visão não é nova até na informação que o próprio Governo envia à Comissão Europeia.
“Compreendo que é mais ‘limpo’ analisar o sistema previdencial e analisar à parte o regime da proteção social convergente, mas na verdade estamos a falar de um peso para o Estado, é um peso que o Estado tem de assumir, assumiu esse compromisso histórico. A nossa preocupação é que o Estado não perca de vista que assumiu esse compromisso, portanto, que acautele para futuro o comprimento desse compromisso com uma visão global hoje do que isso significa em termos de peso de esforço financeiro num futuro”, sustentou Filipa Urbano Calvão.
Soluções? “O TdC não tem de opinar sobre isso”
Sobre como deve ser colmatado o défice de 228 mil milhões até 2060 apontado pela auditoria, como perguntou o deputado da Iniciativa Liberal Carlos Guimarães Pinto, a presidente reafirmou que o “TdC não faz recomendações sobre qual a melhor forma de encarar a sustentabilidade da Segurança Social”. “O TdC não tem de opinar sobre isso, nem deve opinar”, acrescentou.
Quanto à participação de Jorge Bravo na auditoria levada a cabo pelo TdC, o deputado do PS, Miguel Cabrita, assinalou que o economista “trabalha há vários anos com bancos e seguradoras” e “tem uma perspetiva muito específica” sobre o tema que “não encontra respaldo” na generalidade da comunidade científica. A deputada do Bloco de Esquerda, Isabel Pires, sublinhou, na mesma linha, que Jorge Bravo é consultor de fundos de pensões privados e quis saber qual a sua influência no relatório do TdC.
Na resposta, Filipa Urbano Calvão defendeu que a contratação do perito que viria depois a ser escolhido pelo Governo para coordenar o grupo de trabalho “foi completamente transparente”. Uma contratação que resultou da necessidade de capacitar os recursos humanos do TdC “por não ter, na altura, trabalhadores capacitados para este efeito”, justificou, assegurando que foi o Instituto dos Atuários Portugueses a indicar o nome do economista, num processo que decorreu no início de 2023.
A presidente do tribunal garantiu ainda que Jorge Bravo “não teve qualquer interferência” direta na análise e redação do TdC, limitou-se a ajudar os técnicos na interpretação de algumas normas atuariais, na verificação de alguns cálculos. Não foi um apoio de consultoria, não teve essa importância na elaboração do relatório”.
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