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Caso Influencer: porque é que o juiz deixou cair crimes por corrupção, mas manteve tráfico de influências?

O magistrado Nuno Dias Costa deixou cair suspeitas de corrupção e de prevaricação na investigação do caso Influencer, mas manteve as suspeitas de tráfico de influência e de oferta indevida de vantagem. Todos os arguidos saíram em liberdade. Autarca de Sines sem suspeitas pendentes.
António Cotrim/Lusa
14 Novembro 2023, 14h08

O juiz Nuno Dias Costa deixou cair os indícios de corrupção e de prevaricação na investigação do caso Influencer, que investiga o licenciamento do centro de dados de Sines, mas manteve as suspeitas de tráfico de influência e de oferta indevida de vantagem.

O magistrado 3 do Tribunal Central de Instrução Criminal  (conhecido por Ticão) deixou cair por terra várias das suspeitas dos procuradores do Ministério Público (MP) João Paulo Centeno, Hugo Neto e Ricardo Lamas.

Desta forma, Diogo Lacerda Machado e Vítor Escária são suspeitos de um crime de tráfico de influência, com Afonso Salema e Rui Oliveira Neves (Start Campus) a serem suspeitos de um crime de tráfico de influência, a própria sociedade Start Campus (pela prática de Afonso Salema e Rui Oliveira Neves) é suspeita de um crime de tráfico de influência e de um crime de oferta indevida de vantagem.

Em termos de medidas de coação, todos estes cinco arguidos ficam em liberdade, rejeitando a prisão preventiva pedida pelo MP. Diogo Lacerda Machado fica sujeito a uma apresentação periódica a cada 15 dias, uma caução de 150 mil euros e entrega de passaporte para não se ausentar para o estrangeiro; Vítor Escária fica obrigado a não se ausentar para o estrangeiro, devendo entregar o passaporte; a sociedade Start Campus fica obrigada a apresentar caução de 600 mil euros.

Já Nuno Mascarenhas, Afonso Salema e Rui Oliveira Neves continuam como arguidos, mas ficam a aguardar os “ulteriores trâmites processuais sujeitos a termo de identidade e residência. Restitua os arguidos à liberdade”, escreveu o juiz 3 do ‘Ticão’ no despacho. O autarca de Sines fica livre de qualquer indício, mas vai manter-se como arguido.

O Ministério Público já anunciou que vai recorrer da decisão do juiz Nuno Dias Costa.

Crime de tráfico de influência

O juiz aponta para a “factualidade fortemente indiciada (…) integra a prática pelos arguidos Diogo Lacerda Machado, Vítor Escária, Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, do crime de tráfico de influência”.

“A necessidade sentida pelos arguidos Afonso Salema e Rui Oliveira Neves de obterem uma Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) favorável tem de ser vista” à luz do decreto-lei nº151-B/2013 e do decreto-lei nº140/99 “foi à luz deste enquadramento legal e, nomeadamente, da necessidade de ser obtida AIA favorável (apresentar de o presidente do ICNF inicialmente entender que o parecer a apresentar por esta entidade deveria ser desfavorável), que, em reunião mantida em 22/11/2022 a pedido do arguido Diogo Lacerda Machado, o arguido Vítor Escária assegurou àquele e ao arguido Afonso Salema que a AIA teria decisão favorável, tendo este relatado tal situação ao arguido Rui Oliveira Neves”.

Assim, foi neste “contexto” que Afonso Salema e Rui Oliveira Neves “em co-autoria (ambos participaram no facto sob decisão conjunta (…) deram vantagem patrimonial” a Diogo Lacerda Machado “que agiu em co-autoria” com Vítor Escária “(também estes participaram no facto sob decisão conjunta)” para que junto de entidade pública (a Agência Portuguesa do Ambiente – APA) fosse obtida decisão ilícita favorável)”.

“Mostra-se, pois, fortemente indiciado que, com as respetivas condutas, os arguidos Diogo Lacerda Machado e Vítor Escária, por um lado, e os arguidos Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, por outro, preencheram os elementos, objetivo e subjetivo, do tipo de crime de tráfico de influência”.

Sobre as alegadas pressões que a secretária de Estado da Energia terá sofrido, o juiz considera que “carece de ser melhor apurada no decurso da investigação, não sendo ali descrito qualquer facto que preencha o elemento do tipo objetivo do crime de tráfico de influência com o fim de obter uma qualquer decisão ilícita favorável”.

Sobre a matéria relativa à câmara municipal de Sines, o magistrado conclui que “não consubstancia a prática do crime de tráfico de influência, pois a “influência” não foi exercida, nem estava destinada a sê-lo, sobre quem tinha competência para decidir (a vereadora Filipa Faria, em quem tal competência fora anteriormente delegada pelo arguido Nuno Mascarenhas).

Do crime de oferta indevida de vantagem

O magistrado concluiu que a “factualidade fortemente indiciada respeitante às refeições oferecidas, ao abrigo de uma resolução criminosa, pelos arguidos Afonso Salema e Rui Oliveira Neves aos arguidos João Galamba e Nuno Lacasta, bem com a Duarte Cordeiro, preenche o referido tipo de crime de oferta indevida de vantagem”.

“Assim, encontra-se fortemente indiciado que, com as respetivas condutas, os arguidos Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, atuando em co-autoria, preencheram os elementos, objetivo e subjetivo, do tipo de crime de oferta indevida de vantagem”.

Do crime de prevaricação

O juiz concluiu que “na promoção do Ministério Público não são descritos factos que integrem o tipo de crime de prevaricação”.

Em relação à questão do Simplex Industrial, “importa ter presente que não é alegado qualquer facto de onde se extraia que” João Galamba “atuou conluiado com os arguidos Rui Oliveira Neves e João Tiago Silveira no sentido de ser feito o que estes combinaram entre os dois”.

O juiz Nuno Dias Costa decidiu que “de resto, ainda que se entenda que tal combinação se destinava a permitir que a necessidade de licenciamento camarário fosse contornada, sempre se trataria de uma opção legislativa (questão diversa seria a de haver corrupção para ser produzida uma lei “à medida” da sociedade arguida, o que não foi alegado pelo Ministério Público”.

Do crime de corrupção

O magistrado Nuno Dias Costa concluiu que os “factos descritos na promoção do Ministério Público não preenchem, nem o tipo do crime de corrupção passiva (imputado ao arguido Nuno Mascarenhas), nem o tipo de crime de corrupção ativa (imputado aos arguidos Afonso Salema e Rui Oliveira Neves”.

“Na verdade, à luz da descrição factual a que o Ministério Público procede, fica desde logo por preencher o elemento do tipo objetivo do tipo de crime de corrupção para a prática de qualquer ato ou omissão”, pode-se ler no documento.

E continua: “Contudo, era a vereadora Filipa Faria quem tinha a competência (delegada pelo arguido Nuno Mascarenhas) para proferir decisão sobre o pedido de licenciamento em causa. Por seu turno, aquilo que o Ministério Público imputa ao arguido Nuno Mascarenhas (“prometeu que encurtaria os prazos todos a grande velocidade”), para além de conclusivo, nenhuma consequência permite retirar para efeitos de enquadramento jurídico-penal”.

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