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Plano anticorrupção avança com confisco de bens e regulação do lobbying

Pacote com 32 medidas anticorrupção foi aprovado pelo Governo nesta quinta-feira, 20 de junho. Aumento das penas e da prescrição, reclamados pela oposição, deverão ficaram pelo caminho, mas avança regulamentação do lobbying e penhora de bens sem condenação. Do plano fazem ainda parte o registo da pegada legislativa e o aumento da transparência no Portal BASE.
20 Junho 2024, 15h48

O pacote com 31 medidas anticorrupção aprovado pelo Governo nesta quinta-feira, 20 de junho, contempla um novo mecanismo de perda alargada de bens em caso de crimes económico-financeiros, o qual poderá ser aplicado em determinados casos em que não tenha ocorrido uma condenação, e dá corpo à regulamentação da atividade de lobbying e a medidas urgentes para reduzir os tempos médios de resolução na justiça administrativo-fiscal. No plano estão ainda previstas outras medidas como o agravamento da pena acessória de proibição do exercício de funções públicas ou políticas, criação de uma ‘lista negra’ de fornecedores do Estado que estejam impedidos de contratar com o Estado e a introdução de mecanismos de pegada legislativa que permita perceber que propostas concretas são apresentadas por entidades privadas.

De acordo com o documento, o novo plano prevê a regulamentação da atividade de representação de interesses legítimos (lobby). “Trata-se de medida prevista no Programa do Governo e que, para além de ter merecido consenso muito alargado no diálogo com os partidos com assento parlamentar, corresponde a recomendações de organismos internacionais como a OCDE e o GRECO e está em linha com o que sucede já hoje nas instituições da União Europeia (Parlamento Europeu, Conselho e Comissão Europeia)”, indica o documento.

Este mesmo registo deve incluir, de acordo com o Executivo, o registo de transparência, código de conduta do registo de transparência e uma agenda pública.

Veja aqui as medidas aprovadas pelo Governo

Está ainda previsto o registo da “pegada” legislativa como forma de robustecimento do escrutínio sobre as decisões do Governo, enquanto órgão de condução da política geral do país e órgão superior da administração pública, medida que colheu elevado consenso. “Trata-se de assegurar o registo das interações com entidades externas e das consultas realizadas ao longo do processo legislativo, bem como a acessibilidade dessa informação”. E ainda a implementação do plano de prevenção de riscos dos Órgãos do Estado, conforme está previsto no Código de Conduta do atual Governo.

O pacote de medidas contra a corrupção foi aprovado hoje pelo Governo, após a 3 de junho, a ministra da Justiça ter apresentou a agenda anticorrupção ao Conselho de Ministros e a recolha de contributos de várias entidades do sector como da Procuradoria-Geral da República, o Conselho Superior da Magistratura, o Mecanismo Nacional Anticorrupção e ainda a Associação Sindical dos Juízes Portugueses.

Mecanismo de perda de bens

O plano anticorrupção prevê ainda a criação de um novo mecanismo de perda alargada de bens, salientando o documento que “as várias tentativas de criminalização da detenção de património sem justificação conhecida, prescindindo da prova de um crime subjacente, frustraram-se por inconstitucionalidade”.

Tais dificuldades, segundo o Executivo, foram em boa parte superadas mediante a previsão do crime de ocultação intencional de património, punido com pena de prisão de um a cinco anos a conduta, quando praticado por titular de cargo político ou alto cargo público, por referência à declaração única de património, rendimentos e interesses que se está obrigado a apresentar.

Por outro lado, lê-se no documento, o ordenamento jurídico português já contém instrumentos avançados conducentes à perda das vantagens do crime. “Sobretudo, a perda alargada de bens, prevista na Lei n.º  5/2002, de 11 de janeiro, que estabelece medidas de combate à criminalidade organizada e económico-financeira”, acrescenta o Executivo, dando conta de que “pretende-se aprofundar este mecanismo”. Isto, diz, em linha com a Diretiva (UE) 2024/1260, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de abril de 2024, assegurando que a perda possa ser declarada relativamente a bens identificados em espécie, por um lado, e que em determinadas condições se possa dispensar o pressuposto de uma condenação por um crime do catálogo, por outro.

Está ainda previsto regular o enquadramento processual dos mecanismos de perda de bens, considerando aqui o Executivo que “importa clarificar como se articulam os diferentes instrumentos que, no plano cautelar e preventivo, têm vindo a ser utilizados para garantir a execução de uma eventual decisão final de perda: a apreensão, o arresto preventivo e a modalidade especial de arresto no âmbito da perda alargada”.

Outra das medidas passa ainda promover a regulamentação adequada de todos os mecanismos processuais que se relacionem com a realidade das criptomoedas.

Aumento da transparência do Portal BASE e celeridade processual

A agenda anticorrupção pretende ainda ”incrementar as potencialidades do Portal BASE para assegurar no âmbito da contratação pública que os cidadãos e as empresas têm direito a informação correta, objetiva e atempada”. Segundo o Executivo, o objetivo é assegurar o cumprimento efetivo das normas de publicação, melhorar as funcionalidades de pesquisa de informação e disponibilizar informação mais alargada.

Outra medida passa por generalizar a venda judicial em leilão eletrónico em benefício da transparência, no âmbito da venda em processo executivo ou de insolvência.

Ao nível da celeridade processual, o Governo pretende um “processo penal menos exposto a expedientes dilatórios”, propondo para o efeito o reforço dos poderes de condução e apreciação do juiz, dando-lhe um maior poder de apreciação de requerimentos e de gestão do processo, conforme as necessidades de cada causa.

E outras medidas como reduzir a amplitude e função da fase processual da instrução, nomeadamente no plano da produção de prova e do controlo incidente sobre a matéria de facto, limitando a utilização de expedientes dilatórios. Assim como, introduzir outras alterações no Código de Processo Penal, nomeadamente em matéria de recursos, “identificando práticas processuais inúteis e redundantes; especificamente em matéria de recursos, apurando em que domínios se mostra ainda viável dotar o recurso de efeito meramente devolutivo ou diferir a sua subida para o momento do recurso da decisão que tiver posto termo à causa; ponderando uma revisão do modelo de acesso ao Tribunal Constitucional”.

Para garantir maior celeridade processual, o Executivo sinaliza ainda aposta em meios digitais para os inquéritos, nomeadamente em ferramentas tecnológicas que agilizem o tratamento da prova; e o investimento no capital humano dos tribunais, assegurando, por exemplo, a formação especializada permanente de magistrados, funcionários judiciais e órgãos de polícia criminal, em particular em aspetos substantivos e processuais genericamente relacionados com a criminalidade económico-financeira. 

Pacote de 30 medidas conta com contributos dos últimos dois meses

Ao longo dos últimos dois meses o Ministério da Justiça recolheu contributos de cerca de 30 entidades de diversa natureza e selecionou as medidas com maior probabilidade de gerarem consenso.

“O Governo pretendeu desenhar uma agenda que seja eficaz, exequível e realista – e para isso, é preciso saber construir consensos”, justificou a ministra da Justiça.

Segundo a governante, algumas medidas que “possam criar mais resistência”, não foram incluídas nesta agenda, mas, os partidos mantêm a prerrogativa da iniciativa legislativa para apresentarem propostas de legislação, se assim o entenderem.

“Mas se conseguirmos concretizar – e acredito que sim – as medidas sobre as quais se gerou um consenso alargado, já estaremos a fazer muito pelo combate à corrupção em Portugal”, acrescentou Rita Alarcão Júdice, adiantando ainda que o pacote anticorrupção prevê “mais de 30 medidas” e que está assente em “três eixos – prevenção, educação e repressão”.

A 3 de abril, no seu primeiro Conselho de Ministros, o Governo liderado por Luís Montenegro decidiu como primeira medida mandatar a ministra da Justiça para falar com todos os partidos com assento parlamentar, agentes do setor da justiça e sociedade civil com vista à elaboração de um pacote de medidas contra a corrupção, num prazo de 60 dias.

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