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Novobanco propôs em 2023 alterar o CCA para permitir distribuição de dividendos, mas Fundo recusou

“A CCA foi o instrumento adequado e a prova está nos resultados finais, pois não houve perdas de depósitos, foi salvaguardada a estabilidade financeira, e temos mais um banco a financiar a economia. Só posso concluir que este mecanismo funcionou”, disse o presidente do Fundo de Resolução.
11 Fevereiro 2025, 19h05

Luís Máximo dos Santos, presidente do Fundo de Resolução, esteve a ser ouvido esta terça-feira no Parlamento sobre o fim do acordo de capitalização contingente celebrado no âmbito da venda do Novobanco, na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública, depois da aprovação de um requerimento apresentado pelo Partido Socialista (PS).

A audição ocorre após a assinatura, em dezembro de 2024, de um acordo entre o Fundo de Resolução e o Novobanco que permitiu antecipar o encerramento do Acordo de Capitalização Contingente (CCA), cujo final estava previsto para o termo de 2025.

“O CCA constituiu parte integrante e indissociável da operação de venda do Novobanco e “foi uma peça chave para a conclusão dessa venda”, que “era indispensável para que não houvesse uma nova resolução ou mesmo uma liquidação”, disse o presidente do Fundo de Resolução.

O CCA foi assim indispensável para a cessação do estatuto do Novobanco enquanto banco de transição.

Segundo o Fundo de Resolução, sem o Acordo de Capitalização Contingente, não teria sido possível concluir a venda do Novobanco, quer porque a existência do mecanismo de capitalização contingente era condição essencial da proposta apresentada pelo investidor selecionado, a Lone Star, quer porque, sem o esse mecanismo, o Banco Central Europeu e a Comissão Europeia não teriam autorizado a operação, dado que não estaria assegurada a adequada capitalização e a viabilidade do Novobanco.

O Fundo de Resolução considera mesmo que a celebração do Acordo de Capitalização Contingente foi mesmo indispensável para evitar a resolução ou a liquidação do Novobanco, em 2017 e, assim, para preservar a estabilidade financeira, proteger os depositantes e “assegurar a continuidades das funções críticas que o Novobanco desempenha, nomeadamente no financiamento à economia nacional”.

“A CCA foi o instrumento adequado e a prova está nos resultados finais, pois não houve perdas de depósitos, foi salvaguardada a estabilidade financeira, e temos mais um banco a financiar a economia. Só posso concluir que este mecanismo funcionou”, sublinhou o presidente do Fundo.

Antecipação do CCA foi tentada em 2023 mas com condições que o FdR não aceitou

O acordo celebrado entre o Fundo de Resolução, o Novobanco e a Nani Holdings, em 9 de dezembro de 2024, antecipou em cerca de um ano o fim do CCA.  “Antecipámos o fim do CCA mas apenas um ano”, disse Máximo dos Santos.

Recorde-se que de acordo com as condições estipuladas no CCA, o acordo deveria cessar em 31 de dezembro de 2025 (ou podia estender-se até 31 de dezembro 2026, em determinadas condições, que não eram muito prováveis).

Os dividendos que vão ser distribuídos após o acordo de antecipação do CCA somam 1,3 mil milhões de euros, brutos.

Luís Máximo dos Santos disse que não foi a distribuição de dividendos que motivou a antecipação do CCA. Pois já antes havia uma proposta para mudar o acordo no sentido de permitir a distribuição de dividendos e o Fundo de Resolução não aceitou.

Antes do processo que conduziu ao termo antecipado do CCA, no final de 2024, esse cenário já tinha sido equacionado, em reflexão interna e em contatos informais com o banco liderado por Mark Bourke, em mais do que uma ocasião, pelo menos desde 2021.

O deputado do CDS-PP, Paulo Núncio, revelou mesmo que em 2023, o Novobanco propôs que fosse alterado o Acordo Capitalização Contingente no sentido de permitir a distribuição de dividendos, mas o Fundo de Resolução recusou.

O Jornal Económico sabe que em agosto de 2023, o Novobanco propôs ao Fundo de Resolução que fosse acordada uma alteração ao CCA, de modo a permitir ao banco distribuir dividendos (uma vez que o Acordo impedia, durante toda a sua vigência, o Novobanco de distribuir dividendos ou reservas). Nessa altura, o Novobanco defendia que seria do interesse de todas as partes que o banco pudesse distribuir dividendos antecipadamente e não propunha o termo do contrato nem oferecia qualquer outra contrapartida para que fosse aceite aquela alteração contratual.

Aquela hipótese foi afastada pelo Fundo de Resolução, tendo sido definida a posição de que só poderia haver distribuição de dividendos com o termo do Acordo de Capitalização Contingente e que a antecipação desse termo teria de implicar cedências da parte do Novobanco nos litígios que iniciou contra o Fundo.

Máximo dos Santos disse que pôr fim ao CCA teve como objetivo maximizar os ganhos, e o fim do acordo permitiu erradicar qualquer pagamento adicional ao Novobanco e permitiu uma redução em cerca de 73 milhões do valor reclamado na segunda arbitragem. Portanto os dividendos que o FdR vai receber somam aos termos do acordo.

Até 2024 nunca foi iniciado um processo formal de negociação pois o posicionamento do Novobanco e da Nani Holdings, até 2024, esteve sempre assente em condições que não se mostravam aceitáveis e que, na prática, implicavam o pagamento, pelo Fundo de Resolução, de praticamente todos os montantes que o Novobanco vinha reclamando e cujo pagamento foi recusado pelo Fundo de Resolução.

O Fundo de Resolução recusou, portanto, a proposta do Novobanco para lhe ser autorizada a distribuição de dividendos, sem que existisse a desistência do banco das pretensões que mantinha quanto ao recebimento daquelas verbas.

Recorde-se que, desde 2021, foram iniciados três processos arbitrais entre o Fundo de Resolução e o Novobanco, junto do Tribunal Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional todos eles motivados pela recusa do Fundo de Resolução em pagar ao banco determinados montantes que o banco solicitava ao abrigo do mecanismo de capitalização contingente, mas que o Fundo de Resolução não considerava devidos.

Todos os processos foram desencadeados na sequência da recusa, por parte do Fundo de Resolução, de pedidos de pagamento apresentados pelo Novobanco, ao abrigo do CCA.

“Na primeira arbitragem os 169 milhões de euros não tivemos de os pagar e na segunda os 147 milhões relativas à venda da sucursal de Espanha também não, embora noutros pontos o Tribunal tenha acolhido os argumentos do Novobanco. Na terceira arbitragem o banco desistiu nos termos do acordo de antecipação do CCA”, disse Máximo dos Santos que sublinhou que o Fundo de Resolução atuou na defesa do interesse público.

O valor das transferências para o Novobanco realizadas pelo Fundo de Resolução foi inferior em cerca de 936 milhões de euros ao montante total das perdas cobertas pelo mecanismo; e foi inferior em 485 milhões de euros ao montante total dos valores reclamados pelo Novobanco e ao valor máximo contratual. O presidente do FdR explicou que “da maneira que o CCA estava concebido, os incentivos estavam alinhados para que o teto fosse alcançado, mas a verdade é que não foi”.

Antecipação do CCA com desistências dos processos arbitrais pendentes

Foi em março de 2024 que o Novobanco apresentou ao Fundo de Resolução uma proposta formal com vista ao termo antecipado do CCA, contemplando, em termos gerais, o fim do mecanismo de capitalização contingente, a desistência de um dos processos arbitrais que ainda estava, àquele momento, em curso e o acatamento das decisão que viesse a ser proferida na segunda arbitragem, cuja decisão final se aguardava naquele momento.

O Fundo de Resolução, nos meses que se seguiram, e por reconhecer que – desde que acompanhado de importantes cedências da parte do Novobanco nas pretensões que ainda mantinha quanto ao recebimento de verbas do Fundo de Resolução – o termo antecipado do Acordo de Capitalização Contingente era do interesse e podia trazer benefícios a todas as partes, iniciou uma negociação com o Novobanco sobre os concretos termos do acordo de antecipação do CCA que viria a ser celebrado no final de 2024, no sentido de se salvaguardar, na máxima extensão possível, o interesse público.

Os termos acordados pelas autoridades portuguesas para a celebração do acordo que terminou, antecipadamente, a vigência do CCA, segundo o FdR apresentam vários benefícios e vantagens e satisfazem todas as principais condições e objetivos que foram definidos no início das negociações.

O acordo permitiu que o cumprimento do acórdão proferido na segunda arbitragem entre o Fundo de Resolução e o Novobanco, da qual resultou uma obrigação de pagamento pelo Fundo de Resolução que o banco reclamava ser de 190 milhões de euros, fosse assegurado sem qualquer transferência de verbas para o banco e com a aceitação, da parte do Novobanco, de uma redução em cerca de 73 milhões do valor reclamado.

O cumprimento daquela obrigação foi realizado mediante compensação com o valor a receber pelo Fundo de Resolução relativo a uma alteração contratual promovida pelo Banco de Portugal e pelo Fundo de Resolução, em 2021, relacionada com a recuperação a obter de um crédito junto de um credor específico do Novobanco (que o Fundo de Resolução estima em 128 milhões de
euros e que o Novobanco considera ser de 117 milhões de euros) a desistência, pelo banco, do valor restante. Esse credor sabe-se ser o Banco Económico, ex-BES Angola.

O acordo estabeleceu a desistência, pelo Novobanco, da terceira arbitragem iniciada contra o Fundo de Resolução, na qual o banco reclamava ainda o pagamento de cerca de 198 milhões de euros, mais juros de mora que poderiam ultrapassar os 45 milhões de euros.

Também extinguiu as responsabilidades contingentes associadas a “Business Warranties” assumidas no acordo de venda do Novobanco, nomeadamente os pedidos indemnizatórios apresentados preliminarmente pela Nani Holdings, que ascendiam a cerca de 60 milhões de euros.

O fim do CCA extinguiu todos os diferendos pendentes entre o Fundo de Resolução e o Novobanco e estabeleceu o compromisso das partes de não apresentarem pedidos de anulação do acórdão proferido segunda arbitragem e de não iniciarem novos litígios com base em factos que já fossem do seu conhecimento.

Os litígios pendentes diziam respeito, essencialmente, a processos nos quais o Novobanco pedia ainda a condenação do Fundo de Resolução ao pagamento de determinadas verbas cujo pagamento havia sido recusado pelo Fundo.

Permitiu que o Fundo de Resolução e o Estado recebam, mais cedo do que o previsto – e previsivelmente já em 2025 – dividendos pelas suas participações no Novobanco (que, em termos agregados, correspondem a 25%).

Além de tudo o mais, o acordo fez, naturalmente, cessar, em definitivo, qualquer risco para o Fundo de Resolução decorrente das contas do Novobanco relativas a 2024 e a 2025, extinguindo a responsabilidade contingente, ao abrigo do CCA.

Embora este risco fosse reduzido, atendendo ao nível de capitalização do banco, ficou definitivamente afastada qualquer exposição do Fundo de Resolução a cenários extremos.

O termo antecipado permitiu assim que se fizessem, logo no final de 2024, as contas finais relativas ao Acordo de Capitalização Contingente, as quais mostram que os pagamentos líquidos realizados pelo Fundo de Resolução ao abrigo do mecanismo acabaram por ser inferiores ao limite contratual inicialmente estabelecido, em 485 milhões de euros (12,5% abaixo daquele limite).

Luís Máximo dos Santos confirmou que o Conselho de Administração do Banco de Portugal aprovou integralmente a antecipação do CCA e revelou que o processo de negociação foi articulado com o Ministério das Finanças e com o BdP.

Histórico da venda do Novobanco à Lone Star

No contexto do processo de venda do Novobanco, conduzido pelo Banco de Portugal, na qualidade de autoridade de resolução, no âmbito da resolução do Banco Espírito Santo, foram celebrados pelo Fundo de Resolução, por determinação do Banco de Portugal, três contratos:
Um contrato de compra e subscrição de ações do Novobanco, celebrado entre o FdR e a Nani Holdings SGPS a 31 de março de 2017 (Share Purchase and Subscription Agreement – SPA); um Acordo Parassocial, celebrado entre o Fundo de Resolução e a Nani Holdings SGPS, também em 31 de março de 2017 (Shareholders Agreement); e um Acordo de Capitalização Contingente, celebrado entre o Fundo de Resolução e o banco a 18 de outubro de 2017 (Contingent Capital Agreement – CCA).

 

 

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