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PAN quer que nomeação do Governador do Banco de Portugal seja decidida pela Assembleia da República

O Grupo Parlamentar do PAN deu entrada no Parlamento com um projeto de lei em que propõe que sejam alteradas as regras de nomeação do Governador e dos demais membros do conselho de administração do Banco de Portugal. São seis alterações que pretendem pôr na agenda o tema da reforma da supervisão financeira que não chegou a ser aprovada na anterior legislatura.
5 Maio 2020, 21h12

O Grupo Parlamentar do PAN – Pessoas, Animais e Natureza deu entrada no Parlamento com um projeto de lei em que propõe que sejam alteradas as regras de nomeação do Governador do Banco de Portugal (BdP) e dos demais membros do conselho de administração. Isto “em nome de uma instituição que se quer verdadeiramente independente e credível, livre de pressões da banca comercial, de consultoras financeiras ou do poder político”, diz o partido liderado por André Silva.

Na prática, o PAN quer que o parecer da Assembleia da República (AR) sobre a proposta do Ministério das Finanças para o cargo de Governador, seja vinculativo. Desta forma o poder da nomeação da cúpula do banco central seria dos partidos com assento parlamentar.

O PAN promete que o seu projeto de lei respeita o quadro decorrente do direito da União Europeia, que rege os mandatos dos bancos centrais. O partido propõe uma alteração à Lei Orgânica do Banco de Portugal “no sentido de consagrar um novo modelo de nomeação do Governador de Portugal e dos demais membros do conselho de administração. Este novo modelo terá no reforço dos poderes da Assembleia da República e no reforço dos mecanismos de prevenção de conflitos de interesse os seus dois grandes eixos”, refere o partido no documento que leva à AR.

O que propõe o PAN? 

“Propomos que, relativamente à audição das pessoas propostas pelo Governo para os cargos de Governador e de Membro do Conselho de Administração, deixe de haver um mero relatório descritivo e passe a ser necessário um parecer da comissão de orçamento e finanças relativo à adequação do perfil do indivíduo às funções a desempenhar e que, numa lógica de aprofundamento da transparência, as conclusões desse parecer tenham de ser publicadas em Diário República conjuntamente com a resolução que procede à nomeação para os cargos em causa”, refere o partido.

Em segundo lugar, propõem que a Assembleia da República, para além de poder fazer uma audição ao candidato proposto pelo Governo, “possa também, facultativamente e se assim o decidir, realizar uma audição ao Ministro das Finanças para que proceda ao cabal esclarecimento de todas as questões existentes quanto aos nomes por si propostos ao Conselho de Ministros e quanto ao seu processo de escolha. Esta é uma alteração que assegura uma maior accountability do Governo junto da Assembleia da República e que, no essencial, colhe inspiração no modelo existente no Banco de Espanha”.

Em terceiro lugar, o PAN propõe que “os referidos pareceres tenham de ser aprovados por maioria qualificada equivalente a pelo menos dois terços dos deputados em efectividade de funções”, uma alteração que segundo o partido de André Silva “visa assegurar que esta [efectividade de funções], o Governador e os Membros do Conselho de Administração são figuras que reúnem o consenso não só dos partidos que formam a maioria parlamentar que sustenta o Governo, mas também dos partidos da oposição”.

Acrescenta o PAN que “garantir esta lógica de consenso alargado é algo bastante importante tendo em conta o papel crucial que o Governador e o conselho de administração do Banco de Portugal desempenha na supervisão do sistema bancário e, em especial, para se evitar que a figura do Governador seja lançada em querelas de natureza política que só o têm enfraquecido ao longo dos anos”.

Em quarto lugar, “propomos que o Governo tenha de respeitar o sentido do parecer da Assembleia da República na nomeação, dando assim um carácter vinculativo a este parecer”, acrescenta o PAN que invoca as recomendações do relatório do grupo de trabalho para a Reforma do Sistema de Supervisão Financeira, que, em 2017, defendeu a atribuição de um poder de oposição à Assembleia da República no âmbito do processo de nomeação do Governador do Banco de Portugal.

O PAN propõe ainda um quinto ponto: “que se passe a prever regras de incompatibilidades que impeçam a ocupação do cargo de Governador do Banco de Portugal por titulares de certos cargos políticos e por pessoas que nos últimos 5 anos tenham desempenhado certos cargos políticos com relevância junto do Banco de Portugal, funções no sector da banca comercial/dos regulados ou em empresas de consultoria ou auditoria que trabalhem ou tenham trabalhado com o Banco de Portugal”, porque “actualmente a Lei Orgânica do Banco de Portugal não prevê nenhuma norma deste tipo”.

Por fim propõe, em sexto e último lugar, que o limiar mínimo de representação equilibrada de géneros seja aumentado dos actuais 33% para os 40%. “Esta alteração não só é coerente com o que se dispõe actualmente na Lei n.º 26/2019, de 28 de Março, relativamente aos cargos dirigentes na Administração Pública, como assegura que no plano do Banco de Portugal existe o acolhimento da Recomendação (2003), de 12 de março de 2003, do Comité de Ministros do Conselho da Europa determina que a representação de cada um dos géneros em qualquer órgão de decisão da vida política ou pública não deve ser inferior a 40%”, conclui o PAN.

“Com o presente Projecto de Lei o PAN procura retomar a discussão em torno da questão da nomeação do Governador do Banco de Portugal e dos restantes membros do Conselho de Administração [que fez parte da Reforma da Supervisão Financeira proposta pela anterior legislatura], tentando criar condições para garantir um Banco de Portugal forte, independente e credível, livre de pressões dos regulados ou do Governo”, diz o PAN.

O partido justifica que “a nacionalização do BPN e as resoluções do BES e do Banif para além de terem significado enormíssimos gastos para o erário público, deixaram a nu a fragilidade dos mecanismos de supervisão do sistema bancário nacional. Durante os últimos anos alguns passos foram dados no sentido de assegurar uma reforma destes mecanismos de supervisão e de alguns aspectos com eles conexos, contudo, hoje, muito ainda está por fazer”.

Recorde-se que na proposta de reforma da supervisão financeira de Mário Centeno, que acabou por não avançar na anterior legislatura, estava previsto mudar o mandato do Governador do BdP (atualmente tem a duração de cinco anos, podendo ser renovável) para mandato único de sete anos e ainda que os deputados da Assembleia da República pudessem passar a dar início, através de uma recomendação, a um eventual processo de exoneração do Governador.

A reforma da supervisão, para além de querer introduzir um conjunto de alterações ao Sistema Nacional de Supervisão Financeira, propunha em simultâneo um conjunto de novas regras quanto à nomeação e exoneração do Governador e demais membros Conselho de Administração do Banco de Portugal. Mas, a falta de tempo para discussão e para consensualizar soluções fez com que a iniciativa não fosse sequer discutida na especialidade, acabando por caducar com o início da XIV Legislatura.

O PAN invoca no preâmbulo do seu projeto de lei que “na anterior Legislatura, um dos vértices da discussão sobre a supervisão do sistema bancário nacional foi a questão da idoneidade do actual Governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, e da sua eventual exoneração”. Mas diz que “do ponto de vista do PAN, tão importantes como a alteração das regras sobre exoneração, são as regras de nomeação do Governador de Portugal, uma vez que é nesta fase que se assegura a plena idoneidade da personalidade escolhida e se evita a necessidade de se discutirem futuras exonerações”.

O partido reconhece que o enquadramento resultante do Direito da União Europeia (e a interpretação que lhe é dada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia e pelo Banco Central Europeu) traz um conjunto de regras altamente restritivas sobre a destituição dos Governadores dos Bancos Centrais dos Estados-membros.

A lei europeia diz que “um governador só pode ser demitido das suas funções se deixar de preencher os requisitos necessários ao exercício das mesmas ou se tiver cometido falta grave”.

“De resto, no ano passado o Tribunal de Justiça da União Europeia já se pronunciou relativamente a uma decisão que proibiu o Governador do Banco Central da Letónia de exercer as suas funções de governador, afirmando que o art. 14.º/2 do Protocolo n.º4 relativo aos estatutos do sistema europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu serve “para garantir a independência funcional dos governadores dos bancos centrais nacionais” e que “se se pudesse decidir sem justificação demitir os governadores dos bancos centrais nacionais das suas funções, a sua independência ficaria seriamente comprometida e, consequentemente, a do próprio Conselho do BCE”, lembra o PAN.

Atualmente, a designação do Governador do Banco de Portugal é feita por resolução do Conselho de Ministros, sob proposta do Ministro das Finanças e após audição por parte da comissão competente da Assembleia da República, que deverá elaborar um relatório descritivo da audição. Relatório esse que não é vinculativo e por isso não muda a decisão do Governo. Relativamente aos restantes membros do Conselho de Administração o modelo existente é semelhante, sendo a única diferença o facto de serem nomeados sob proposta do Governador do Banco de Portugal.

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