Até final de outubro as bolsas portuguesas e algumas das principais bolsas europeias podiam ser colocadas num comboio a circular a três velocidades. No grupo da frente surgem Espanha e Alemanha que viram o IBEX 35 e o DAX, respetivamente, a subirem 14,8% e 14,3%. A meio do pelotão ficou o Reino Unido com o FTSE 100 a valorizar 4,6%. Na carruagem mais traseira encontramos Portugal, que viu o PSI a subir 1,1% enquanto França tem o CAC 40 a quebrar 2,1%.
Os motivos para estas diferentes velocidades nas várias bolsas europeias são distintos, de acordo com os especialistas consultados pelo Jornal Económico. E aqui entram fatores como a macroeconomia, o evoluir ou não das condições políticas e sociais, fatores setoriais consoante a área de atividade a que as empresas cotadas nas bolsas pertençam, políticas monetárias, e a exposição que os índices possuem às economias locais.
O trader do Banco Best, Ângelo Custódio, considera que um dos fatores “verdadeiramente relevante” para a performance das várias bolsas europeias reside na exposição que estes têm à própria economia.
“Se na bolsa alemã apenas 18% das receitas das empresas do índice são geradas na Alemanha, acompanhada em parte pelo IBEX espanhol, mercados como o francês, ou mesmo o PSI nacional, geram uma boa parte das suas receitas na sua própria economia, limitando os seus ganhos e aumentando a exposição às debilidades internas, emagrecendo assim os resultados das empresas cotadas em bolsa”, explica o trader do Banco Best, ao Jornal Económico.
Ângelo Custódio sublinha que no final é a performance das empresas que “determina” a prestação dos índices das várias bolsas e que “resistirá melhor aquele que concentre uma maior exposição a sectores que diversifiquem geograficamente as suas fontes de rendimento e apostem na inovação”.
O analista da corretora XTB, Vítor Madeira, salienta, ao Jornal Económico, que o evoluir ou a quebra dos vários índices das bolsas (Espanha, Alemanha, Reino Unido, Portugal e França) “não incluem” os dividendos pagos levando a que as percentagens assumidas “não representem” a realidade dos rendimentos brutos obtidos pelos investidores, principalmente no caso do PSI, onde o rendimento dos dividendos “é bastante alto” na performance do índice em termos de retornos.
Já o head of trading do Banco Carregosa, João Queiroz, considera que o desempenho dos principais índices europeus até ao final de outubro de 2024 revela algumas “divergências significativas”, que podem ser explicadas por fatores macroeconómicos, setoriais e específicos dos mercados locais.
“As diferenças nos desempenhos destes índices refletem uma combinação de fatores setoriais, como a exposição ao sector financeiro e energético, e macroeconómicos, incluindo as políticas monetárias restritivas do Banco Central Europeu (BCE) e o impacto das condições globais de consumo”, acrescenta João Queiroz.
O trader do Banco Best refere que as economias dos vários países funcionam com diferentes “motores”, mesmo que estejam inseridos em uniões económicas. Ângelo Custódio aponta a diferença de performance existente entre o índice alemão que tem crescido este ano ao contrário do índice francês que apresenta quebras.
“Se o mercado alemão está concentrado em três setores (indústria, tecnologia e finanças) atualmente num momentum positivo, contribuindo decisivamente para a performance do índice, o CAC 40 (França) segue polarizado, prejudicado pela sua forte exposição ao sector dos bens de luxo, que tem vindo a perder terreno devido ao abrandamento do mercado chinês, reduzindo largamente as receitas de empresas ligadas ao “luxo” e invertendo a sua tendência de ganhos consistentes após a pandemia”, explica Ângelo Custódio.
“No caso dos países como a França e o Reino Unido, as condições macroeconómicas agravadas têm contribuído para um crescimento inferior das empresas, o que se tem refletido na cotação dos ativos. Além disso, estes países também tiveram complicações políticas e sociais que agravaram o funcionamento do orçamento fiscal e social, estando o mercado já a antecipar esses efeitos negativos”, diz o analista da XTB, Vítor Madeira, sobre o desempenho bolsista dos índices de França e do Reino Unido.
Referindo-se a França, o head of trading do Banco Carregosa, João Queiroz, sublinha que o índice bolsista francês teve um “crescimento marginal”, influenciado pela queda de grandes empresas como a LVMH e a L’Oréal, que sentiram o impacto de uma “desaceleração” na procura por bens de luxo, especialmente na China, um “mercado crucial” para essas marcas.
“O aumento das taxas de juro e a incerteza económica global também afetaram os mais lentos ritmos de crescimento do consumo e da despesa, o que impactou empresas de bens de consumo e industriais. O sector financeiro e bancário teve algum desempenho positivo, mas não foi suficiente para compensar as perdas em outros sectores”, acrescenta o head of trading do Banco Carregosa.
Já no que diz respeito ao FTSE 100 do Reino Unido este acaba por ser sustentado por empresas de recursos naturais e instituições financeiras como a Barclays e a NatWest, disse João Queiroz.
“A exposição do índice a commodities ajudou a mitigar o impacto das taxas de juro mais elevadas, uma vez que o sector de energia beneficiou da volatilidade nos preços do crude e gás. No entanto, o índice também foi prejudicado por sectores mais vulneráveis às condições económicas globais, como o consumo discricionário e a tecnologia”, referiu João Queiroz.
Relativamente à Alemanha, Vítor Madeira sublinha que se trata de um caso “curioso”. O analista da XTB refere que apesar da economia se ter mostrado “mais fraca” em comparação com o passado o índice bolsista tem conseguido subir.
Esta subida é justificada pelo analista da XTB devido aos seguintes fatores: “O mercado mostra as expectativas futuras positivas em relação ao crescimento das receitas e lucros das empresas; As grandes empresas do DAX não foram tão afetadas como o resto da economia, o que tem segurado níveis de crescimento mínimos na maior parte delas; O índice alemão tem alta correlação com os principais índices norte-americanos, assim pode haver alguma valorização fruto da grande performance americana”, justifica Vítor Madeira.
Relativamente ao índice espanhol IBEX 35, Vítor Madeira salienta que “não se encontra” uma “relação direta” entre os dados macroeconómicos e a sua performance.
“Ainda assim, um pouco como na Alemanha, as grandes empresas espanholas conseguiram manter a sua performance, mesmo numa situação de abrandamento económico. Destaque para os bancos espanhóis e para a Inditex“, salienta o analista da XTB.
“O IBEX foi impulsionado pelo sector bancário, com empresas como o Banco de Sabadell e o CaixaBank a beneficiarem das políticas monetárias menos restritivas e estabilização da margens financeiras, que contribuíram para as suas margens de lucro. Além disso, a exposição do IBEX ao sector de turismo e hospitalidade proporcionou um bom desempenho, à medida que a recuperação do turismo beneficiou empresas como a International Airlines Group (IAG)”, explica o head of trading do Banco Carregosa, João Queiroz.
No caso do DAX (Alemanha) a Siemens Energy liderou com um crescimento de 212,75%, refletindo uma “forte procura” por tecnologia de energia e infraestrutura sustentável, sectores que “ganharam relevância com o aumento das preocupações ambientais e a transição energética” na Europa.
Relativamente aos resultados apresentados pelo índice português PSI, João Queiroz diz que este foi impulsionado principalmente pelo sector bancário, com o Banco Comercial Português (BCP) a liderar com uma valorização expressiva de 77,61%.
“No entanto, o desempenho geral do índice foi limitado por quedas acentuadas em empresas de peso como a EDP Renováveis e a Mota Engil, ambas afetadas por pressões no sector energético, pela volatilidade no sector de infraestruturas e os elevados juros de médio e longo-prazo. Além disso, a lenta diminuição dos juros pelo Banco Central Europeu (BCE) face ao ritmo de crescimento observado, impactou negativamente o sector imobiliário e de “serviços públicos” (ou utilities), que possuem um peso relevante no índice”, explica João Queiroz.
João Queiroz adianta também, agora referindo-se ao desempenho dos diferentes índices bolsistas europeus, que estes acabaram por ter “desempenhos variados” influenciados por fatores macroeconómicos e setoriais.
“As subidas das yields inerentes às dívidas soberanas terá tido impacto em índices como o PSI (Portugal) e o CAC 40 (França), onde sectores sensíveis ao custo de financiamento, como utilities e imobiliário, apresentaram algum peso”, explica João Queiroz.
Em outubro, refere João Queiroz, o cenário de estagnação económica global e as preocupações geopolíticas também “afetaram mais intensamente” índices com maior peso em utilities (no PSI (Portugal) com ambas as EDP’s a continuarem a “subdesempenhar” perante as elevadas yields dos Estados Unidos) e energia, como o PSI e o CAC (França), enquanto o IBEX (Espanha) e o DAX (Alemanha) “foram menos afetados”.
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