A detenção do presidente do Benfica Luís Filipe Vieira, no âmbito da operação “Cartão Vermelho”, onde estão a ser investigados factos suscetíveis de integrarem a prática, entre outros, de crimes de abuso de confiança, burla qualificada, falsificação, fraude fiscal e branqueamento, pode prejudicar a relação da marca com os patrocinadores que se associam ao clube para obter visibilidade e associação de conceitos.
Em entrevista ao JE, Daniel Sá, diretor-executivo do IPAM – Instituto Português de Administração de Marketing e especialista em marketing desportivo, deteta vários riscos para a marca, sobretudo numa altura em que a Benfica SAD lançou um empréstimo obrigacionista e em que prepara a época desportiva, a pouco menos de um mês de decidir o seu futuro na Liga dos Campeões, uma competição essencial para o equilíbrio das finanças do clube.
Os indícios que são associados ao presidente do Benfica só o prejudicam a si ou isto poderá alastrar no sentido de minar a confiança na marca e no clube?
Inclino-me para a segunda opção. Apesar de termos esta estrutura formal de SAD, na nossa cultura latina estas estruturas funcionam sobretudo numa lógica presidencialista. Independentemente de todos os profissionais de qualidade que compõem as SAD, esta cultura presidencialista latina faz com que muitas vezes se confunda o presidente com a marca. Quando essa longevidade é significativa, como é o caso, isto ainda é mais evidente. Acho que sim, existe um efeito de contágio possível de acontecer, que de certeza não agrada a patrocinadores e a empresas que são parceiras do Benfica.
Como é que uma marca se pode salvaguardar deste tipo de situações para que não fique associado a este tipo de situações?
Quando uma marca se associa a um clube procura duas coisas: uma é visibilidade (algo que o Benfica consegue dar tendo em conta a exposição mediática fortíssima, quer a nível nacional quer numa dimensão internacional, algo que as marcas medem e interessam-se por esse retorno de visibilidade) e a outra é a associação de conceitos (uma marca quando se junta ao Benfica fica associada a um clube centenário, com prestígio, com reputação, com sucesso e uma perspetiva de gestão profissional moderna e inovadora). Uma notícia destas abala o pilar reputação. As marcas, quer as grandes quer as centenas de parceiros que o Benfica tem, deverão estar no mínimo preocupadas porque ninguém quer ver as suas marcas misturadas com este Benfica. O que podem fazer? Depende da forma como isto vai ser resolvido. Provavelmente, vamos ter aqui meses ou anos para perceber o desfecho disto mas em paralelo, temos este julgamento da opinião pública que corre mais depressa do que o tempo da justiça.
E a detenção tem muita força?
Sem dúvida. Creio que as marcas estão a seguir com muita atenção tudo o que se está a passar e vão avaliar as consequências dependendo quer das decisões legais que sairão daqui, quer do impacto mediático que isto poderá ter. O Benfica tem mais de 100 anos e a sua reputação está acima de qualquer presidente. No entanto, isto pode chegar a um ponto em que a situação pode tornar-se insustentável e pode haver uma pressão não apenas dos patrocinadores mas dos vários stakeholders que estão à volta do Benfica, para que haja uma nova liderança para garantir a tal estabilidade e associação de conceitos que todos querem.
O processo do empréstimo obrigacionista lançado pela Benfica SAD no início desta semana também depende muito dessa salubridade da marca?
Exatamente! Está claramente ao mesmo nível da relação do clube com as marcas, com a diferença de que existem prazos estabelecidos… o risco acaba até por ser maior. Tem tudo a ver com confiança, com o valor das ações que entretanto caiu, depende muito da forma como vai ser gerido. Vale a pena recordar o exemplo do Sporting que há três anos atingiu o ponto mais baixo da sua história com o ataque a Alcochete e o final do reinado de Bruno de Carvalho… e três anos depois a marca está como está: uma liderança diferente, o sucesso desportivo apareceu, sucesso comercial e muitas novidades do ponto de vista da comunicação. Este é um bom exemplo. Seja qual for a liderança (e agora discute-se se devem haver eleições, se deve ser Rui Costa ou Domingos Soares de Oliveira a presidir), a mesma deve ser forte e deve ser capaz de devolver a credibilidade e a reputação à marca.
Esta detenção acontece numa altura sensível da época, o período onde se define o planeamento de uma época desportiva.
Esta é a pior altura para uma notícia deste género. Claramente, isto torna o Benfica numa instituição mais frágil, seja para vender, seja para comprar. Muito pela imagem e pelo estilo presidencialista que os clubes portugueses têm, é muito claro que um presidente afastado do processo torna as coisas mais frágeis. Certamente que o Benfica terá quadros competentes para assumir estes processos mas uma negociação é algo que exige argumentos de um lado e do outro e este é um argumento que coloca o Benfica em dificuldades. E não podemos esquecer que existem ainda outros fatores a dificultar: uma pandemia que devastou as finanças do futebol europeu e o insucesso desportivo nos últimos dois anos. Está aqui um caldo que não sendo dramático é no mínimo desafiante para a marca.
Taguspark
Ed. Tecnologia IV
Av. Prof. Dr. Cavaco Silva, 71
2740-257 Porto Salvo
online@medianove.com