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Rui Moreira adjudica meio milhão a firma de ex-sócio

Sociedade de advogados Telles de Abreu soma quase 500 mil euros em ajustes diretos da autarquia portuense desde 2017. Vários dos seus sócios integram movimento de Rui Moreira e foram eleitos para a Assembleia Municipal.
28 Julho 2019, 10h00

Nos últimos dois anos, a Câmara Municipal do Porto (CMP) celebrou contratos por ajuste direto com a sociedade de advogados Telles de Abreu e Associados, num valor de cerca de 218 mil euros. Englobando entidades na órbita da CMP – como a Porto Lazer e a Empresa Municipal de Ambiente do Porto -, o valor ascende a cerca de 472 mil euros.

No mesmo período, a Cuatrecasas obteve 148 mil euros em ajustes diretos da CMP, mais cerca de 50 mil euros de outras entidades na sua órbita da CMP, num valor global de 198 mil euros. A José Pedro Aguiar-Branco & Associados teve um ajuste direto de 74 mil euros e a Miguel Veiga, Neiva Santos & Associados 74 mil euros da CMP e 125 mil de entidades associadas.

São abundantes as interligações diretas entre a Telles de Abreu e a associação cívica Porto, o Nosso Movimento (PNM), através da qual Rui Moreira foi eleito para a presidência da CMP em 2013 e 2017. Desde logo Pedro Almeida e Sousa, sócio da Telles de Abreu e, ao mesmo tempo, vogal da mesa da assembleia geral da PNM. Acresce o facto de a Telles de Abreu ter prestado serviços à PNM nas autárquicas de 2017, como por exemplo uma queixa à Comissão Nacional de Eleições, por si assinada e na qual é visível o logótipo da Telles de Abreu. E, pelo menos até 2013, Moreira foi sócio de Almeida e Sousa na Urban SGPS e na Moldavia – Empreendimentos Imobiliários.

André Noronha é outro sócio da Telles de Abreu e também líder da bancada da PNM na Assembleia Municipal do Porto (AMP). Por outro lado, o presidente da AMP, Miguel Pereira Leite, também da PNM (fundador e membro da direção da associação), é presidente do conselho de administração da Atlantic – Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário. Ora, o presidente da mesa da assembleia geral da Atlantic é Almeida e Sousa, que acumula as já referidas funções na PNM e na Telles de Abreu.

Até meados de 2016, Carlos Lucena, sócio-fundador da Telles de Abreu, foi vogal do conselho de administração da Atlantic. Outro dado a ter em conta é que a sede da PNM está instalada no edifício da Atlantic, junto à Praça de Liége, no Porto. E a Telles de Abreu é representante legal de vários promotores imobiliários na cidade, implicando processos de licenciamento no âmbito da CMP.

Questionado sobre as ligações entre a PNM e a Telles de Abreu, o presidente da CMP, Rui Moreira, respondeu: “A CMP contrata os serviços jurídicos que entende para não apenas elaborar procedimentos, regulamentos e cadernos de encargos mas também para defender a autarquia em sua defesa na crescente litigância que existe no nosso país. Essa escolha é feita pelos serviços jurídicos de acordo com a especialização e competências dos vários escritórios. No caso concreto, trata-se de um bem conhecido escritório da cidade e talvez mesmo o maior, pelo que não deveria admirar que a CMP o contratasse para bem se defender”.

Rui Moreira argumenta ainda que “tal como a filiação política ou mesmo o dirigismo político não pode ser alvo de qualquer impedimento cívico, a participação numa associação cívica ou numa campanha eleitoral de um movimento independente não pode ser alvo de censura ou discriminação. Compreendo, por isso, que lhe tenham contado uma qualquer história onde se invocam ligações, mas lamento que elas ou não existam, em alguns casos, ou quando existem sejam do foro privado e natural e se conformem naquilo que são os direitos individuais e constitucionais, não podendo nem devendo ser questionados”.

E conclui: “É este tipo de crítica e opinião, que parece perpassar na opinião expressa nas suas questões, que afasta da política e da atividade cívica os melhores, facto de que depois todos nos queixamos. Com todo o respeito pelo trabalho jornalístico e legítimo e inteira disponibilidade para o esclarecer, não posso pactuar com esse processo de permanente populismo e demagogia que pretende atingir quem, tendo a sua vida profissional de sucesso há muitos anos estabelecida, se vê subitamente atingido na sua honra por, em algum momento, emprestar conhecimento, tempo e empenho a causas cívicas ou públicas”.

Quanto à sede da PNM no edifício da Atlantic, Pereira Leite diz ser o proprietário. “Sou indiretamente o proprietário de tal edifício contíguo. Faço, com muito orgulho, parte da direção de uma associação cívica que aceitei que tenha como sede aquela morada. Não compreendo que o meu exercício de cidadania e participação cívica possa ser posto em causa. A associação é cívica e privada, não tem fins lucrativos e não dispõe de financiamento público. Tal como não dispõe a sociedade de que faço parte. As instalações de ambas são privadas e não beneficiam de qualquer financiamento público”, diz.

Artigo publicado na edição nº 1997, do dia 12 de julho, do Jornal Económico

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