Até às eleições presidenciais de 2026, ainda muita água passará debaixo da ponte – à cabeça, as autárquicas deste ano – , mas a possibilidade de o líder do Chega vir a disputar na corrida a Belém uma segunda volta com o almirante Gouveia e Melo é um cenário que se começa a desenhar, admitem politólogos ouvidos pelo Jornal Económico (JE).
Seria um “bónus adicional” para André Ventura nesta segunda tentativa de suceder a Marcelo Rebelo de Sousa e “um abalo muito forte para o sistema partidário de Portugal”, assinala André Azevedo Alves, professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa. Não é o desfecho mais certo, acautela o politólogo, mas é uma hipótese que ganha força tendo em conta, por um lado, a fragmentação à esquerda (no PS há pelo dois nomes a demonstrar querer avançar – António Vitorino e António José Seguro), por outro, os “sinais de fraqueza” de Marques Mendes, nome que não deixou nem o próprio eleitorado do PSD “particularmente entusiasmado”.
Conseguindo a proeza de passar à segunda volta, Ventura será depois “esmagado” por Gouveia e Melo, não tem dúvidas André Azevedo Alves, mas só o facto de lá chegar seria “um marco importante” e uma derrota “humilhante” para PS e PSD.
O politólogo entende que Ventura volta a ser candidato cinco anos depois de ter ficado em terceiro lugar com 496.773 mil votos, atrás de Ana Gomes, para aproveitar todo o palco mediático que o momento proporciona. Além disso, Gouveia e Melo – que ainda não se apresentou oficialmente mas que as sondagens dão como favorito – foi-se demarcando de um eventual apoio de Ventura. Fazê-lo soaria a “desespero”.
Riccardo Marchi, historiador e especialista em movimentos de extrema-direita, concorda: “Era quase obrigatório André Ventura candidatar-se novamente”, afirma, notando que isso reflete o facto de “o Chega não ter conseguido ancorar-se e ter uma figura com capital político tão alto”.
Ao mesmo tempo, Ventura enfrenta dificuldades em cooptar alguém que aceite ser apoiado pelo seu partido . “Era já difícil antes dos escândalos [o caso das malas e o dirigente acusado de prostituição de menores]. Agora, ainda mais. Ninguém se quer aproximar do Chega”.
Aliás, para Marchi, o facto de a cerimónia oficial de apresentação da candidatura ter sido adiada para maio, quando estava prevista para esta sexta-feira, sugere que o partido quer deixar “acalmar as polémicas” e encontrar um momento “mais oportuno” para “gastar este cartucho”. Apesar disso, o politólogo constata que, tal como noutros países, os escândalos podem enfraquecer o partido, mas não a imagem do líder. E a de Ventura permanece “intocada”.
Em 2021, lembra Marchi, “a personagem ainda não estava construída a 360 graus”, agora “está quase a 100%” e Ventura pode ter “o golpe de sorte” que teve Jean-Marie Le Pen em 2002 quando o líder nacionalista conseguiu disputar uma segunda volta em França, contra Jacques Chirac.
“Ventura pensa legitimamente” num cenário idêntico cá. Apesar de vir depois a ser “fuzilado com uma rejeição superior a 80%”, como o próprio sabe, atingir esse patamar dar-lhe-ia projeção internacional como “protagonista desta onda de direita radical no Ocidente todo”.
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