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OPEP vacila na aplicação da sua própria estratégia

A produção de petróleo obedece a regras que os produtores conhecem e que os consumidores se limitam a ter de acompanhar. Mas a poderosa OPEP parece estar num momento de indefinição.
9 Maio 2024, 09h55

Desde 2022 que a produção de petróleo por parte dos países da OPEP está em baixa – na tentativa de manter os preços a um nível aceitável – isto é, não demasiadamente baixo – como resposta ao pós-pandemia e à crise na Ucrânia, entre outros fatores. Desde então, como avança uma reportagem do “El Economista”, vários países produtores estão a investir para aumentar a sua capacidade de produção. Isso significa que, embora o bombeamento de petróleo seja neste momento limitado, em alguma altura os preços terão de subir para financiar esses investimentos.

E parece ser aqui que o desregramento teve início. Países ‘filiados’ estão a romper os tetos impostos pela organização, regras de contenção estão a ser quebradas e há mesmo países que, como Angola, pura e simplesmente optaram por abandona a organização. No meio de tudo isso, o maior produtor de petróleo do mundo, os Estados Unidos (que não fazem parte da organização), corre por conta própria e faz tudo para descer os preços internacionais – num quadro em que a administração espera que o brent seja um fator de relançamento da economia e não o seu contrário agora que as taxas de juro se preparam para descer.

O nervosismo dentro do cartel (que não é alheio à divisão entre os mundos cristão e muçulmano) parece estar crescendo e ele será mais evidente quanto mais tempo estiver no ativo a política de cortes (ou de contenção na exploração). Perante estes cortes, países como o Iraque e os Emirados Árabes Unidos trabalham para aumentar a sua produção de petróleo. Partindo-se do princípio clássico de que se os cortes de produção fossem prolongados sine die, não faria sentido que os grandes produtores gastassem milhões para produzir mais petróleo, é provável que a ‘torneira’ esteja prestes a ser aberta.

O perigo subjacente, diz o “El Economista”, é uma repetição da guerra de preços que ocorreu em 2020, a última vez em que houve um sério desentendimento entre os principais membros da OPEP+ (Arábia Saudita e Rússia). Os dois países envolveram-se numa competição para ver quem poderia aumentar mais a oferta, mas, acima de tudo, para suportar melhor o colapso dos preços do petróleo bruto, que caíram abaixo de 20 dólares, no caso da referência europeia, o Brent. Quem perdeu foi a Rússia – mas era uma derrota anunciada: o preço da extração é ali muito superior ao da Arábia Saudita; segundo os técnicos, os russos não conseguem descer a extração para valores abaixo dos 60 dólares, coisa que os sauditas conseguem com alguma facilidade.

Por enquanto, o mercado mostra o seu nervosismo com as quedas de preços que ultrapassaram 6% na semana passada e continuam a tendência nos últimos dias. A OPEP também produziu mais petróleo em abril que aquilo que havia sido acordado. De acordo com uma pesquisa da Bloomberg, a produção de petróleo nos nove países sujeitos às metas da OPEP+ excedeu o nível acordado em quase meio milhão de barris por dia. Para piorar, “mais da metade do desvio deveu-se ao Iraque (um dos países que mais planeia aumentar a sua capacidade de produção), que bombeou um pouco mais em abril que no mês anterior, o que elevou seu desvio para 220 barris barris por dia”, disse o Commerzbank. Talvez valha a pena recordar que há uma guerra na Palestina e que os principais inimigos de Israel são os xiitas – sendo o Iraque, que é ‘rebocado’ pelo Irão, um dos países que fazem parte desse segmento minoritário entre os muçulmanos.

Os dados da Bloomberg sobre as exportações de petróleo iraquiano confirmam esse quadro: subiram para 3,41 milhões de barris por dia em abril, um aumento de 250 mil barris em relação a março. Agora, a OPEP espera que Bagdade mostre o seu compromisso e execute cortes de produção maiores que o prometido para compensar o excesso de produção no primeiro trimestre.

Para piorar a situação, na quarta-feira, Javad Owji, ministro do Petróleo do Irão, disse que o seu país aumentará a produção de petróleo bruto em 400 mil barris por dia, o que é um verdadeiro golpe para a OPEP. Embora Teerão não faça parte do pacto de cortes, um aumento tão grande na produção colocará ainda mais pressão em baixa sobre os preços. Mas esta posição tem outro problema: o Irão está sob sanções dos Estados Unidos – o que quer dizer que este aumento da produção a bons preços irá com certeza abastecer a Rússia e a China (que não querem saber para nada das sanções norte-americanas).

A dúvida é, portanto, se a OPEP consegue impor os cortes ou terá mesmo de deles abdicar e permitir que todos aumentem a produção. Para todos os efeitos, e mais uma vez, a ‘rebeldia’ dos membros da OPEP está a colocar em causa as opções estratégicas da própria organização.

Os últimos movimentos nos preços do barril confirmam que o mercado de petróleo está bem abastecido e que os fundamentos de oferta e procura não apontam para uma possível escassez de petróleo bruto no futuro. A primeira semana de maio terminou com a maior queda semanal nos preços do petróleo desde fevereiro, de quase 7%, e das máximas do ano até agora, o brent perdeu 8,3% em apenas um mês, passando de 92 para 83,5 dólares (esta quinta-feira).

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