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Poiares Maduro: “Montenegro tem perfil para gerar convergências e criar uma maioria”

Num ano de três eleições em Portugal, de redefinição de equilíbrios na Europa e de conflitos e indefinição a nível mundial, é essencial esperar o inesperado, defende o antigo governante. Que acredita que a AD vai governar e alerta para os riscos do voluntarismo de Pedro Nuno Santos. Às portas de novo ano, Poiares Maduro traça o retrato do país e do mundo, fala sobre o futuro de Passos Coelho e António Costa e explica porque é fundamental fazer reformas.
30 Dezembro 2023, 11h46

Professor universitário, licenciado em Direito e doutorado pelo Instituto Universitário Europeu de Florença, onde obteve os prémios para melhor tese de Doutoramento e investigador do Departamento de Direito, foi ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional, com a tutela da Comunicação Social, do Desenvolvimento Regional e das Autarquias Locais, no governo de Pedro Passos Coelho. Miguel Poiares Maduro é vice-presidente da SEDES – Associação para o Desenvolvimento Económico e Social e dean da Católica Global School of Law.

Vamos começar por Portugal. Temos um ano a arrancar com três eleições em seis meses: as regionais nos Açores logo em fevereiro, legislativas em março e europeias em junho. Será o ano de todas as decisões ou da indecisão total?
Será seguramente um ano marcado por essas eleições, e não é claro – as sondagens indiciam isso – que dessas eleições, em particular das legislativas mas também nos Açores, saiam soluções estáveis e, portanto, que não venhamos a ter ainda mais eleições para além das três previstas. Mas eu não dramatizaria isso em excesso. Nós vivemos aqui obcecados com uma estabilidade política que confundimos muitas vezes com estabilidade parlamentar – que muitas vezes nem sequer corresponde a uma estabilidade política, porque não se traduz em estabilidade de políticas públicas. Importante é – e vemo-lo em muitos países europeus – o valor da estabilidade das políticas públicas, ou seja, ter princípios estruturantes que garantam alguma continuidade ao longo do tempo. Isso é muito importante para a ação dos atores económicos, para que as políticas públicas possam ter eficácia e possam ser avaliadas adequadamente e possam ser revistas se necessário. E isso não depende de estabilidade parlamentar, necessitaria de uma cultura política diferente.

Mas tendo em conta os últimos oito anos, em que não se construiu políticas públicas, não se desenhou projetos de médio prazo sequer, e com o peso que o Estado tem na economia, não é mais problemático para Portugal do que para países como Itália ou Bélgica?
Sim, precisamente porque nós, infelizmente, não temos uma cultura política que assegure essa estabilidade de políticas públicas através de uma administração independente e forte, que assegure a gestão da coisa pública com eficácia para além dos governos, independentemente dos governos, não asseguramos essa continuidade de políticas nos seus aspetos estruturais. Mas nos últimos oito anos não beneficiámos em termos de continuidade e de transformações da estabilidade que tivemos. Portanto, nem sempre a estabilidade parlamentar ou política assegura melhores condições de desenvolvimento do país. É sempre uma escolha que temos de fazer. E perante a deterioração a que estávamos a assistir nos princípios que regem a atividade governativa…

É melhor a alternativa.
É que não se trata apenas da existência de casos e do que esses casos revelam. É a deterioração do entendimento daquilo que devem ser os princípios fundamentais de ética e integridade no funcionamento da política do Estado, da atividade governativa. Perante isso e ao mesmo tempo a circunstância de termos um governo que apenas mantinha o statu quo, não acho que haja um custo muito significativo adicional em termos eleições. Pode ser que seja o início de uma clarificação política que, mesmo que não ocorra imediatamente nestas eleições, poderá ocorrer em eleições futuras e que, essa sim, traga uma estabilidade produtiva, não uma estabilidade inconsequente, como foi aquela que nós tivemos.

E não resultando daqui, como pouco provavelmente vai resultar, uma maioria estável, é possível que cheguemos a outubro e a queda do orçamento obrigue a novas eleições, com novos líderes políticos?
Eu não daria por garantido que não vamos ter uma solução estável resultante das próximas eleições… Já vimos, incluindo nas eleições mais recentes, que quanto mais a data se aproxima mais uma fatia muito significativa do eleitorado – temos hoje mais de 20% de indecisos, que são suficientes para garantir essa maioria estável de um lado ou doutro – acaba por concentrar o seu voto na solução que lhe parece mais moderada e mais suscetível de garantir uma governação com estabilidade. Pode ser que isso venha a acontecer e as sondagens não revelem ainda esse processo de transferência do voto ou de mobilização do voto que atualmente é indeciso para uma solução que ofereça mais estabilidade. E neste momento, aquilo que as sondagens também revelam é que é mais provável que essa solução possa vir do centro ou centro-direita.

A AD teve aí um papel determinante?
Pode ter um papel importante a sinalizar aos eleitores a oportunidade de uma solução mais estável. Se não acontecer, é porque os eleitores, na sua sabedoria coletiva, entenderam dessa forma e teremos de ver o que acontece. Mas penso que é mais provável que exista um governo de centro-direita – dependerá de o PS viabilizar, abstendo-se. E se PS ou Chega deitarem abaixo o governo, assumirão depois essas responsabilidades e veremos o que é que o eleitorado decide. Se isso acontecer – se o PSD com o CDS vencerem, sem maioria parlamentar, e o governo vier a cair por iniciativa do PS ou do Chega –, esse partido será provavelmente penalizado depois pelos eleitores. Portanto, a médio prazo teria uma solução mais estável.

O líder do PSD será uma pessoa capaz de capitalizar esse centro e trazer de novo essa confiança do eleitorado a uma nova AD, também com independentes e até aberto a um PS mais centro?
Montenegro – e estou à vontade para o dizer porque nem foi o candidato que apoiei – tem pontos fortes e pontos fracos. E uma boa liderança é aquela que sabe tirar partido dos seus pontos fortes e ir buscar quem pode suprir os fracos. Eu acho que um dos seus pontos fortes é a capacidade de agregar pessoas, de ouvir – tenho tido essa perceção de que é uma pessoa moderada, aberta, que procura ouvir pessoas muito diferentes. Aquilo que às vezes aparece como um handicap dele, as pessoas não terem uma noção muito clara de qual é exatamente a visão estratégica que ele tem para o país, é o outro lado da mesma moeda, que é a abertura que ele tem para ouvir pessoas, consultar e ir construindo as suas posições através dessa busca de diferentes competências e de trazer pessoas para o seio dos seus processos de liderança. Portanto Montenegro tem o perfil adequado para criar convergências e vir a criar uma maioria.

Leia o artigo na íntegra na edição do NOVO que está, este sábado, dia 30 de dezembro, nas bancas

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