[weglot_switcher]

PROTRAM versus Realidade

Todos os dias vemos casas construídas em lugares onde será difícil, mesmo para um leigo, imaginar que um sismo de magnitude seis na Escala de Richter não corresponda a tragédias familiares evitáveis. No PROTRAM não se encontra uma resposta cabal a esses riscos.
7 Novembro 2022, 07h15

PROTRAM é um diploma definido pelo POTRAM. Este último é um plano para o ordenamento do território (OT), e o primeiro é a concretização do mesmo num Programa Regional para o OT da Região Autónoma da Madeira.

O PROTRAM estabelece a estratégia regional de desenvolvimento territorial (DT) para o período 2022-2032. Temos, portanto, que realçar a distinção entre OT de DT.

OT consiste num planeamento integrado do espaço biofísico com o objetivo de alterar e utilizar o território, respeitando as suas aptidões e capacidades, bem como os equilíbrios dos ecossistemas e a prevenção de acidentes com origem na instabilidade geológica. DT é um conceito mais abrangente que visa aliar o crescimento económico com a sua sustentabilidade ambiental no que diz respeito ao uso do território. Esta distinção é importante porque permite entender que o OT é um processo anterior ao DT, ou, se preferir, está a montante deste. E é aqui que reside a minha primeira e mais fundamental crítica ao PROTRAM: este programa inverte a ordem de prioridades entre OT e DT, visando um DT que, num número considerável das medidas que concretizam a sua estratégia, e ainda mais nas medidas que estão ausentes do programa, não respeita de forma verdadeiramente sustentável a longo prazo nem os equilíbrios dos ecossistemas, nem a prevenção de acidentes com origem geológica. Por exemplo, entre as dezenas de menções aos Planos Diretores Municipais (PDM), nomeadamente no que concerne a revisões dos PDM, não se encontra algo que nos permita concluir que, finalmente, vai deixar de haver habitações a menos de 10 metros de cursos de água, ou a menos de cinco metros, ou por cima. Nada, zero. A única frase que faz lembrar ao longe algo parecido com isto é a seguinte:

«Transpor as Áreas Complementares da Estrutura Ecológica Regional para a escala municipal tendo como referências os principais cursos de água: deverão ser incluídas as linhas de água identificadas no Plano de Gestão da Região Hidrográfica da RAM (PGRH) como “zonas de proteção de habitats e espécies” e as linhas de água identificadas no Plano de Gestão de Riscos de Inundação da RAM como “cursos de água com risco hidrológico” e respetivas zonas de risco de inundação para um período de retorno de 100 anos». Esta frase é claramente insuficiente para se atingir o objetivo que, em minha opinião deveria ser a prioridade n.º 1, de deixar de haver habitações sobre e muito perto de cursos de água.

Apesar de documentos como o PGRH, o POTRAM e o PROTRAM existirem, e por isso eventualmente passarem a noção de que os planos para o OT estão prevenindo adequadamente repetições da catástrofe evitável nas proporções que tomou em 20 de fevereiro de 2010, aliás ainda hoje envolta em mistério sobre o número de mortos efetivamente verificado nessa desgraça, a realidade é que a resposta é dada em metros cúbicos de betão.

Todos os dias vemos casas construídas em lugares onde será difícil, mesmo para um leigo, imaginar que um sismo de magnitude seis na Escala de Richter não corresponda a tragédias familiares evitáveis. No PROTRAM não se encontra uma resposta cabal a esses riscos.

O PROTRAM deveria passar a chamar-se Plano de Uso do Território para o Crescimento Económico numa Visão de Curto Prazo. Bem sei que a RAM tem uma alta densidade populacional, desafios orográficos exigentes, e que a maior parte do território está impedido para construção, mas isso não impede a existência e implementação de uma visão de maior segurança e sustentabilidade a longo prazo.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.