O impacto da Covid-19 na Península Ibérica já se faz sentir. Portugal, que registou os primeiros casos a 2 de março, soma já mais de seis mil infetados e 14o mortes, enquanto que em Espanha os danos já ultrapassam a realidade do país de origem deste vírus, a China. O país vizinho regista 85 mil infetados e quase 7 mil mortos, fazendo hoje dois meses desde de que foi confirmado o primeiro caso de infeção pelo novo coronavírus.
Apesar de ambos os países estarem apenas separados por uma fronteira terrestre de mais de 1200 quilómetros, que agora apenas se encontra parcialmente aberta, as consequências parecem ser diferentes. Para já. O Governo português estima que essa realidade possa vir a mudar em maio, altura em que entraremos no pico do pandemia.
A este fenómeno, o “France Inter” chama de “O mistério português“.
“Enquanto que Espanha está severamente confinada e o governo espanhol acaba de decretar a cessação de toda atividade económica não essencial”, lê-se no artigo, “os portugueses estão confinados, os espaços públicos estão fechados, não há sanções, nem certificados de deslocações”, comparou o jornalista Anthony Bellanger.
Os motivos
O jornalista reuniu, por isso, um conjunto de razões que justificam o porquê de Portugal não estar a rumar na mesma direção de Espanha. “Pode-se, portanto, pensar que Portugal está a ir na direção de uma catástrofe. Nada poderia estar mais errado. Enquanto a Espanha tem 6.733 vítimas mortais do coronavírus, Portugal tem apenas 119, ou seja, na proporção das suas respectivas populações, 11 vezes menos”.
A primeira e segunda explicação é a geografia. Olhando para o quadro europeu, Portugal é o único país que tem apenas um vizinho: Espanha. Logo, a medida antecipada de encerrar as fronteiras entre ambos, deixando apenas nove portas abertas para a entrada e saída de bens essenciais, mostrou-se “eficaz” na conteção do vírus. Depois, a localização no extremo oeste da Europa, que por vezes tem os seus benefícios, permitiu Portugal “ver o futuro”.
A terceira debruça-se sobre o facto da economia portuguesa depender muito do turismo. Apesar de ter consequências negativas para o futuro do país, este fator tornou-se numa razão para evitar a chegada em massa de casos importados, como se verificou na maioria dos países.
“Portugal não teve que enfrentar uma onda de casos importados, apenas teve que gerir um pequeno stock de visitantes, um tanto solitários, a meio do inverno”, escreve Bellanger.
As lições
À medida que o vírus se alastrava pelo mundo, muitas foram as medidas tomadas pelos diferentes governos (encerramento de fronteiras, quarentena obrigatória, emissão de estímulos económicos, etc) como forma de evitar a propagação descontrolada e, por sua vez, evitar o colapso do sistema nacional de saúde.
Como em Portugal, só se registaram os primeiros casos confirmados há quatro semanas, o governo teve tempo para ver e aprender com os outros, e antecipar-se nas medidas de contingência, argumenta o jornalista.
“Portugal isolou-se ao mesmo tempo que nós [franceses], a 13 de março, enquanto que os vários casos no seu território ainda podiam ser contados com os dedos das duas mãos”, explicou. “Mas acima de tudo, António Costa tem razão: os portugueses são autodisciplinados”.
O jornalista conta como muito portugueses optaram por deixar a cidade e ir para o campo para se isolarem, como deixaram de ir a bares e restaurantes e retiraram os filhos das escolas mesmo antes do surto assumir as proporções que tem hoje.
“Como resultado, muitas escolas foram fechadas antes mesmo do decreto do governo. O mesmo vale para certos negócios, especialmente nos centros das principais cidades do país. Este anteciparam a ordem de encerramento devido à falta de clientes”, explica.
Seremos, por isso, um exemplo no combate à pandemia comparativamente a Espanha? Anthony Bellanger considera que sim. Porém, existem, também, motivos estruturais para esta alegada vantagem, nomeadamente as quatro eleições que Espanha enfrentou nos últimos anos, a crise institucional na Catalunha e o facto de Portugal ter emergido ” da austeridade muito antes e com sucesso”. “Menos austeridade, menos cortes na saúde pública, um país mais bem preparado”, explica o jornalista.
Por fim, Bellanger refere a “generosidade” portuguesa face aos imigrantes que se encontram auto e temporariamente legalizados: “Generosidade, mas também uma medida de saúde pública”, continua. “Ao regularizar todos, o governo dá acesso a toda a população residente em Portugal ao sistema de saúde gratuito e universal: todos protegem todos da Covid-19.
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