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Faturação eletrónica: Quanto mais cedo melhor

“Fatura? Qual Fatura?” A pergunta, inspirada na rábula dos Gato Fedorento “Papel? Qual Papel?”, remete desde logo para a palavra burocracia, ultrapassada com as vantagens da faturação eletrónica: simplificação dos processos e poupança de tempo. Mas quais as principais tendências em Portugal? E as perspetivas de futuro?
11 Dezembro 2023, 18h39

Na Quinta da Pimenteira, em Lisboa, cerca de 250 pessoas participaram ao longo do dia 29 de novembro na reflexão sobre o “Futuro da Faturação Eletrónica no Setor Público em Portugal”, com a apresentação de casos de sucesso e vários painéis de discussão, dinamizados por líderes do setor público e privado. Em debate, estiveram temas como a democratização da faturação eletrónica, a visão de entidades públicas e das empresas de software, os desafios na contratação pública e a obrigatoriedade para as Pequenas e Médias Empresas (PME), os aspetos jurídicos e a responsabilidade ambiental.

Na sessão de boas-vindas, James Buckley, managing director da Sovos na Europa, explicou que a fornecedora de software fiscal tem operações em 15 países do mundo, com mais de 2800 profissionais, dos quais 700 na Europa. Portugal representa um “racional estratégico” para acrescentar escala à operação europeia, tendo como mais-valia profissionais com talento e bem formados academicamente. O evento na capital portuguesa permite dar um passo em frente no esclarecimento sobre faturação eletrónica.

Rui Fontoura, CEO da Sovos Saphety, em declarações ao JE LAB, faz o balanço da iniciativa: “São evidentes os benefícios para as entidades públicas que já adotaram a faturação eletrónica, mas existem algumas dúvidas sobre questões relacionadas com a implementação e legislação. A faturação eletrónica em Portugal será uma realidade, já o está a ser noutros países europeus, faz parte das diretivas europeias, não podemos escapar e, portanto, quanto mais cedo as empresas avançarem melhor. Estas foram as principais questões em cima da mesa ao longo do dia, depois tivemos outras apresentações também interessantes, nomeadamente a que referiu a pegada de carbono da própria fatura.”

Sofia Santos, da Systemic, é o rosto no evento do tema faturação eletrónica e sustentabilidade, alertando para o facto de “ser expetável que, a curto prazo, as empresas tenham de reportar as emissões de CO2 em toda a cadeia de valor”. A representante da consultora na área de gestão e financiamento sustentável refere também que, segundo as últimas conclusões dos Bancos Mundiais, “o aumento da temperatura faz diminuir o PIB” e se não travarmos esta situação em 2050 teremos um PIB negativo devido às alterações climáticas.

Bocage num evento de faturação eletrónica

O caminho para a faturação eletrónica e proteção do ambiente está ainda a ser trilhado em Portugal com alguma “resistência à mudança”, mas com a certeza de que tem mais vantagens do que desvantagens. No painel “A Democratização da Faturação Eletrónica”, Cláudia Raposo, Customer Network Operations da Sovos Saphety, evoca a imagem da estátua de Bocage em Setúbal para contar a história de que nas suas vestimentas o poeta usava sempre um pano ao ombro e quando lhe perguntavam o porquê, simplesmente respondia que “estava à espera da última moda”. O mesmo acontece com a faturação eletrónica e os sucessivos adiamentos. O prazo para o início da obrigatoriedade da faturação eletrónica no âmbito da execução dos contratos públicos para as micro, pequenas e médias empresas estava previsto para 1 de janeiro de 2024, mas segundo a proposta de alteração do Orçamento do Estado, as faturas emitidas em PDF podem ser “consideradas como faturas eletrónicas para todos os efeitos previstos na legislação fiscal” até dezembro do próximo ano.

É tempo de acelerar o processo, independentemente da lei, considera Cláudia Raposo, porque a implementação da faturação eletrónica pode ser simples e rápida, sobretudo para as micro e PME. As vantagens para quem recebe as faturas incluem a redução do tempo de processamento em 90% e do tempo dedicado a tarefas administrativas de 30 a 50%. Para quem envia repetem-se os benefícios da maior rapidez, eliminação dos erros manuais, dos extravios e menos custos (com papel, material de impressão e envio pelo correio), a que se podem acrescentar a possibilidade de monotorização em tempo real, contribuindo para uma maior rapidez dos pagamentos por parte do Estado, transparência e um maior compromisso ambiental. No final da intervenção, Cláudia Raposo lança a pergunta à plateia: “Vamos mesmo esperar pela última moda?”

Nuno Loureiro, do Centro Hospitalar de Lisboa Norte, considera que não devemos esperar nem pela última moda nem pela obrigatoriedade imposta pela legislação, porque a faturação eletrónica “é uma roda em andamento”. Também Valter Pinho, da Sovos Savethy, que traça as tendências nas administrações públicas pela Europa, citando o exemplo de Itália como um dos países mais avançados, está contra os adiamentos sucessivos da lei, que travam investimentos e atrasam os progressos da faturação eletrónica. “A digitalização é inevitável.”

A mesma perspetiva tem Joana Godinho, responsável pelo Departamento de Contabilidade e Contas da Câmara Municipal de Cascais: “Se tivermos menos burocracia e tudo mais organizado ganhamos tempo. A desmaterialização foi ótima, em Cascais estamos no bom caminho da modernização, o grande problema são realmente os consecutivos adiamentos ao nível da legislação”, afirma ao JE LAB a responsável do Departamento de Contabilidade e Contas do município em que a faturação eletrónica já representa 70% das faturas.

A voz dos contabilistas certificados

Paula Franco, bastonária da Ordem dos Contabilistas Certificados, considera que a faturação eletrónica é positiva, mas lamenta algumas dificuldades de implementação, dando voz às preocupações dos contabilistas certificados, os grandes intermediários em muitos dos processos e também aqueles que identificam desafios e complexidades do sistema. “A faturação eletrónica resulta de uma diretiva europeia que vem impor regras para que as faturas eletrónicas garantam que os dados são inalterados, mas a própria diretiva tem muita complexidade em relação às questões tecnológicas”. É fundamental “simplificar e uniformizar”. No setor público, sublinha, “o Estado ou cada entidade pública tem exigências diferentes ao nível do descritivo das operações, o que leva a constrangimentos na integração e envio dos dados. Do ponto de vista da contabilidade pública a padronização dos dados do descritivo é um passo gigantesco para melhorar toda a informação”.

Faturação eletrónica do ponto de vista da lei

Para dar a conhecer os contornos jurídicos da faturação eletrónica, Bernardo Cid, advogado da PwC especialista em contratação pública, lembra que a diretiva europeia tem como objetivo contribuir para a desburocratização, mas também remover barreiras na prestação de serviços na União Europeia.  Tiago Abade, também advogado da PwC especialista em direito público, sublinha que existem elementos obrigatórios que devem constar nas faturas eletrónicas e que conduzem à necessidade de uma rigorosa verificação por parte das entidades privada e públicas. No caso de Portugal existem ainda “algumas inovações do legislador português face à diretiva europeia”, acrescenta.
Mas, em termos práticos, o que deve fazer um gestor público se receber uma fatura em desconformidade? “O mais sensato será seguir um mecanismo que está definido no Código dos Contratos Públicos quando uma obrigação no contrato não é cumprida de forma correta, notificamos para o cumprimento e só quando for emitida uma fatura conforme iremos proceder ao pagamento. Esta é uma conduta legal e em última instância aconselhável”, explica Bernardo Cid.

A visão das entidades públicas e os desafios para as PME

Na perspetiva de Tiago de Melo, vogal do Conselho Diretivo da eSPap, entidade responsável pela coordenação da Fatura Eletrónica na Administração Pública, admite que foi um desafio corresponder às normas europeias com regras muito exigentes. A pergunta que se impôs foi: Como vamos executar uma solução complexa da forma mais simples possível? Com esta questão em mente, os responsáveis desenharam a estratégia para uma plataforma digital de faturação eletrónica, que permitiu alterar a forma como os fornecedores do Estado emitem as suas faturas e como o Estado as recebe e trata, dando um passo em frente na digitalização da administração pública.

Para quem trabalha no terreno são os detalhes que fazem toda a diferença. Hernani Duarte, do Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental (CHLO), refere que basta um pequeno erro, por exemplo nos lotes ou prazos de validade, para existir um grande problema. Por isso, a fluidez e o rigor da informação facilitados pela faturação eletrónica tornam-se fundamentais para minimizar os erros. “A complexidade nos hospitais é grande, porque lidamos com vidas humanas, um erro num documento que atrasa dois ou três dias a entrega de um artigo pode colocar uma vida em risco”, garante o Diretor Logístico do CHLO, em declarações ao JE LAB.

Para João Paulo Anjos, chefe da Divisão de Gestão Financeira da Câmara Municipal de Anadia, a desmaterialização tem enormes vantagens, embora abolir o papel não tenha sido fácil, em especial para os “colaboradores com muitos anos de serviço”, mas com a estratégia de envolver, motivar e incluir todos como parte da mudança foi possível alcançar o sucesso. O dirigente afirma ainda estar preocupado com a questão da cibersegurança. A visão é partilhada por Marcelo Delgado, da Associação dos Trabalhadores da Administração Local: “Estamos convictos de que a faturação eletrónica é uma boa solução além da lei, mas estamos preocupados com a segurança das operações eletrónicas”.

Tânia Branco, da Eletricidade dos Açores, explica que no início o desconhecimento era grande e resistiram à mudança, mas depois fizeram “tábua rasa dos preconceitos” e centraram-se nas vantagens tornando a faturação eletrónica um instrumento de gestão indispensável. Sara Silva, da agência de viagens Alive Travel, considera que um dos grandes desafios das PME está relacionado com os detalhes que ainda é necessário afinar. “Teoricamente a faturação eletrónica é ótima, emitimos 500 faturas por ano para o Estado, mas basta faltar um número de compromisso para atrasar o pagamento”, sublinha. Para ultrapassar os obstáculos, a comunicação entre as partes é a chave. “A informação é também essencial e por isso são tão importantes eventos como o que este organizado pela Sovos Saphety.”

Ana Luísa Costa, da Coperol, especializada em peças e equipamentos para veículos pesados, considera que “as PME têm ainda um caminho a fazer”, pelo que a partilha de experiências é fundamental, assim como ter um bom parceiro tecnológico que torne todo o processo de faturação eletrónica mais fácil. Nuno Brandão, da Datajuris, salienta que percorremos um “caminho a várias velocidades na aplicação da faturação eletrónica” e concorda que deverá existir um trabalho de valorização das soluções no mercado e informação sobre as várias possibilidades de software disponíveis.

Apostar no DNA da simplificação

Para os especialistas das empresas de software a faturação eletrónica não pode ser vista de forma isolada, é necessário integrar todos os processos e a multiplicidade de sistemas, no sentido da digitalização das várias áreas da empresa. Jorge Macara, da tecnológica Vortal, sublinha que as plataformas eletrónicas existem para “facilitar a vida às pessoas”. “É muito importante apostar no DNA da simplificação, com criatividade e inovação” para derrubar as barreiras que mais frequentemente são apontadas no contacto com os fornecedores: os custos de implementação, a resistência à mudança e os adiamentos permanentes da obrigatoriedade legislativa.

É também no sentido de resolver e melhorar os pequenos detalhes que trabalham as empresas de software, com o objetivo de desmistificar a complexidade. O objetivo é exatamente o contrário da rábula dos Gato Fedorento “Papel? Qual Papel?”, lembrada por Pedro Prates, da Fresoft. “Não vamos querer perguntar: A fatura? Qual fatura?” O objetivo é desburocratizar e tirar partido das vantagens da faturação eletrónica. Para que possa chegar a bom porto é necessário apostar em mais formação e informação. E também uma otimização dos processos e mudança de mentalidades, “não faz qualquer sentido imprimir para carimbar, para voltar a digitalizar, para voltar a colocar na plataforma e seguir para validação”, descreveram vários intervenientes no debate.

Joaquim Pereira, da SAP Portugal, considera igualmente que no âmbito da “desmaterialização para as organizações inteligentes” existe a missão de “simplificar e contribuir para a sustentabilidade, tornando o trabalho repetitivo em autónomo”. José Moreira, da Medidata, refere que a falta de uniformização é um dos desafios para uma mais eficaz integração de documentos na gestão financeira eletrónica. Também os documentos com falta de informação ou com dados errados são um problema, porque o sistema não os consegue registar ou integrar convenientemente.

Hugo Pinto, ST+I, uma software house que trabalha na área da gestão hospitalar e circuito do medicamento, em Portugal, Espanha e nos Países do Golfo, lembra que esta área trabalha com informação critica o que exige ainda mais eficácia na minimização dos erros. Num mundo ideal, “o processo logístico completo deve ser eletrónico, sem quaisquer inserções manuais”. Para José Saraiva, da AIRC, um dos aspetos que se coloca com a questão da automatização das tarefas é a necessidade de reorganização dos recursos humanos e transferência dos colaboradores para funções em que possam ser úteis e produtivos.

Porquê “adiar o inadiável”?

Jorge Teixeira, Diretor Product Development da Sovos Saphety, considera que o problema da faturação eletrónica é o mesmo do ginásio, estamos sempre a arranjar “desculpas e boas desculpas”, para escaparmos. No entanto, não vale a pena “adiar o inadiável” e o PEPPOL (Pan-European Public Procurement Online) pode mesmo acabar com todas as reticências. Esta infraestrutura facilita a comunicação eletrónica, promovendo a eficiência e interoperabilidade permitindo a troca de documentos comerciais, incluindo faturas, em vários formatos eletrónicos, através de uma rede internacional altamente segura.

No encerramento, a vice-presidente Teresa Girbal, eSPap considerou a iniciativa muito relevante para a discussão do futuro da faturação eletrónica no setor: “A conferência deste ano permitiu discutir sistemas da inovação, digitalização, massificação das soluções da fatura eletrónica, mas também novas abordagens, novas tendências e novos modelos de negócio, são temas de grande atualidade, onde as oportunidades de melhoria podem representar benefícios muito significativos para as empresas, para os cidadãos e para o Estado”.

 

 

Este conteúdo patrocinado foi produzido com a colaboração com Sovos e Saphety  .

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